Uma cortina de fumaça disfarçada como polêmica "6x1"

Todo mundo virou especialista em jornada de trabalho e direito trabalhista assim que a polêmica da "escala 6x1" surgiu. E Lula está aproveitando.

Publicado em 13/11/2024 às 20:00
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A universidade mais prodigiosa que existe no Brasil é a polêmica. Em minutos, uma polêmica bem difundida nas redes sociais é capaz de graduar e pós-graduar, com honras, milhares de especialistas em qualquer coisa que nenhum deles fazia a menor ideia do que era minutos antes de ouvir sobre o assunto pela primeira vez. Agora mesmo, todo mundo virou especialista em jornada de trabalho e direito trabalhista assim que a polêmica da “escala 6x1” surgiu.

Nos EUA se discutiu muito nos últimos meses, durante a eleição americana, algo que é chamado de “cultura woke”. Em inglês, a palavra woke significa “acordado” ou “desperto”. Os wokes “despertam” sobre determinados assuntos e resolvem que daquilo depende a vida deles e a continuidade da espécie, praticamente. E quem não concordar com o pensamento deles é atacado nas redes e reduzido publicamente a pó, mesmo que o tema em questão não tenha sustentação na realidade ou seja apenas uma fuga e fácil dos problemas reais.

No caso da “escala 6x1”, quem falou contra a ideia de reduzir os dias de atividade na jornada de trabalho dos brasileiros já foi taxado até de “escravagista”.

Produtividade

Mas como toda polêmica desse tipo é cega surda e rasa, esta da escala de trabalho não poderia ser diferente.

Antes de ser contra ou a favor de uma mudança dessas, é preciso tentar entender como funciona o trabalho e como ele é parte essencial na engrenagem que sustenta a economia. Cada hora trabalhada por alguém insere um tijolinho na obra da economia brasileira que nos mantém longe de crises, alimentados, vestidos e com moradia.

Não é a quantidade de horas o centro da questão. A qualidade de aproveitamento dessa hora é o que vai dizer se é possível trabalhar mais ou menos para sustentar a obra inteira. E o Brasil não tem um bom resultado nessa produtividade.

Os mesmos 60 minutos

Hoje, em cada hora, o trabalhador brasileiro produz o equivalente a US$ 16,75 em riquezas, na média nacional. Nos EUA, cada trabalhador produz, nessa mesma hora, o montante de US$ 67,00. Na Noruega, uma hora de trabalho representa ganho de US$ 75,00.

Agora, com esse índice de produtividade tão abaixo de outros países, imagine se uma lei é aprovada obrigando todo mundo a trabalhar menos tempo durante a semana. Não se trata de achar certo ou errado, não se trata de uma discussão entre direita e esquerda. É uma discussão sobre a realidade e sobre matemática.

O que acontece com a obra final, a tal da economia brasileira, se menos tijolinhos ainda forem sendo colocados?

Gargalos

A culpa é dos trabalhadores brasileiros que não trabalham? Pelo contrário. Eles trabalham muito. O brasileiro tem jornadas exaustivas aqui e é conhecido, até em outros países, exatamente por estar sempre disposto a trabalhar.

Se trabalha tanto e não foge do serviço, porque produz tão pouco, então? Por causa de dois gargalos determinantes e trágicos: falta de formação técnica e ausência de infraestrutura.

Educação

O Brasil tem um problema sério com o direcionamento objetivo de suas mágoas. Havia uma mágoa com o acesso à educação e que ela era apenas para formar “filhos de rico”, atendendo à elite ao longo dos séculos.

Não é mentira, de forma alguma. É real que o acesso à educação dos mais pobres foi dificultado sempre e que os obstáculos para o desenvolvimento humano através da educação são imensos para quem não tem dinheiro. Mas no momento em que o dinheiro público pôde mudar esse panorama, a aposta dos governantes foi no ensino superior e não no ensino técnico.

O resultado é que temos eletricistas com pouca qualificação no mercado, enquanto advogados formados estão desempregados, fazendo bicos para pagar as contas.

Não se pode negar a importância do ensino acadêmico para a sociedade, mas será que não faltou mais dinheiro no ensino técnico para melhorar a produtividade?

Infraestrutura

O outro ponto é a infraestrutura. O trabalhador precisa que o resultado do seu trabalho chegue ao consumidor final para garantir sua produtividade. Se a logística não estiver bem sustentada, o custo da produção fica mais alto e o resultado final será menor.

A realidade hoje é que o brasileiro trabalha muito para produzir e o produto precisa enfrentar estradas ruins, ausência de ferrovias, portos com operação custosa, burocracia, altos impostos e, para completar, corrupção em vários níveis governamentais. Tudo isso vai comendo um pouco da produtividade do trabalhador brasileiro.

A escala 6x1 impõe, realmente, um grande sacrifício para os trabalhadores. Mas é um carnaval de demagogia não incluir nessa análise os motivos para que ela seja necessária em grande parte da economia brasileira. Mas alguém está vendo qualquer influenciador ou político da esquerda reclamando de todos esses problemas não resolvidos dessa e das outras gestões anteriores do PT?

Cortina de fumaça

Mas qual o motivo dessa discussão ter se tornado tão urgente, de repente, como se não fosse um problema estrutural que existe há décadas e décadas no país? Será coincidência a discussão surgir, dessa forma opressiva e cheia de atropelos, exatamente quando o governo Lula (PT) está sendo cobrado a reduzir seus gastos para tentar salvar a economia?

Será coincidência que o tema apareceu tentando ocupar os espaços que antes se destinavam a cobrar Lula e o PT sobre a responsabilidade no uso do dinheiro do contribuinte?

Em política, cortinas de fumaça são o método mais eficaz para desviar de assuntos difíceis de digerir. A melhor forma de fazer a população esquecer um tema polêmico é fabricar um outro tema polêmico com mais aderência. Mesmo que isso comprometa a saúde da economia brasileira? É. Para alguns, vale tudo.

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