UM ANO DE PANDEMIA

Recuperação do varejo e dos serviços em 2021 depende da vacinação

Economistas e representante do comércio dizem que os dois principais setores da economia brasileira dependem da volta da circulação de pessoas e aumento do consumo para recuperar as perdas de 2020 e as deste ano

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Edilson Vieira

Publicado em 13/03/2021 às 8:39
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Considerados a espinha dorsal da economia do País, os setores de comércio e serviços amargaram quedas históricas em 2020, por conta do caos promovido pela pandemia de covid-19. As medidas restritivas de circulação de pessoas, necessárias para evitar o aumento da contaminação, são apontadas como a principal causa para o baque. Maior setor da economia brasileira, responsável por mais de 70% da atividade econômica, e que empregava, antes da pandemia, 55 milhões de brasileiros, serviços fechou o ano passado com retração de 7,8%, segundo o IBGE.

Já no setor de varejo, o acumulado do ano passado registrou alta de 1,2% , a menor desde 2016. A queda de 6,1% , registrada em dezembro de 2020, em relação ao mês anterior, mostra que a pequena elevação apresentada no acumulado do ano, na verdade, revela que nem as vendas de Natal e de Ano Novo, tradicionalmente as melhores datas do ano para o comércio, foram suficientes para alavancar o crescimento.Mais de 75 mil lojas fecharam as portas no Brasil, no primeiro ano da pandemia de covid-19.

O ano de 2021 começou com expectativa pelos dois setores. Apesar do fim do auxílio emergencial, no final do ano passado, o volume de vendas do comércio varejista no país variou -0,2% em janeiro na comparação com dezembro de 2020, significando estabilidade. Já o setor de serviços cresceu 0,6% em janeiro deste ano, após ficar estável em dezembro. Foi o oitavo resultado não negativo consecutivo do setor. Mesmo assim, o volume de serviços ainda estava, no início deste ano, 13,8% abaixo do recorde histórico, registrado em novembro de 2014, e 3% abaixo de fevereiro de 2020, quando as medidas de isolamento social para controle da pandemia de covid-19 não haviam sido adotadas. Os dados são da Pesquisa Mensal de Serviços, divulgada pelo IBGE.

REVISÃO

Com a divulgação dos números de janeiro de 2021 pelo IBGE e a piora no quadro de casos de covid-19 no Brasil, além da retomada de medidas restritivas de circulação de pessoas e fechamento parcial do comércio na maioria dos estados, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revisou para baixo sua expectativa em relação ao volume de vendas no varejo em 2021. Passou de um crescimento de 3,5% para 3,1%.

O comércio tem as vendas digitais, o que compensa um pouco as perdas, mas o setor de serviços não tem essa saída. Não tem como cortar o cabelo online”,
Fábio Bentes, economista chefe da Confederação Nacional do Comércio

Fábio Bentes, economista chefe da CNC, explica a pequena queda na projeção inicial. Segundo ele, um crescimento projetado de 3,1% para o ano de 2021 parece otimista mas, na verdade, não é. “Se o varejo parasse onde estava em dezembro passado, tivesse crescimento zero até dezembro de 2021, o efeito estatístico representaria um crescimento entre 3,5% e 4% este ano.” O economista revela que a projeção se baseia na comparação com uma base muito baixa, registrada no primeiro semestre do ano passado. “Para a gente ter um crescimento real, um avanço de fato do setor, precisaríamos estar com uma ampliação nas vendas de 5% a 6% e não dá para bancar este cenário hoje”.

Bentes explica ainda que o estudo leva em conta os períodos de perda e, mais adiante, períodos de recuperação. “Em 2020, durante o momento mais duro do isolamento social, as vendas online cresceram, compensando um pouco as perdas. As classes média e média alta conseguem fazer essa migração, das vendas presenciais para o consumo digital, mais rapidamente. Embora a grande maioria da população não. Por isso, por mais que o comércio eletrônico ajude, precisamos de uma normalidade na circulação de consumidores. Se isto não acontecer, o varejo vai colher mais resultados negativos do que positivos ao longo do ano”, diz o economista.

No segmento de serviços a recuperação é mais difícil, explicou Bentes, por ser um segmento que depende muito do mercado interno e da venda presencial. “Parte da indústria pode exportar, aproveitar o real desvalorizado e vender pra fora; o comércio tem as vendas digitais, mas serviço não tem essas saídas. Não tem como cortar o cabelo online”, diz Bentes.

Para o economista da Confederação Nacional do Comércio, todas as medidas adotadas no ano passado foram corretas, como a prorrogação de pagamentos de impostos, a facilitação do acesso ao crédito para os empresários e a flexibilização da jornada de trabalho. Mas o que vai fazer diferença mesmo este ano será a vacinação. “É o que vai trazer a economia para algo perto da normalidade”, diz Flávio Bentes.

AUXÍLIO

O volume de vendas do comércio varejista em Pernambuco caiu 1,2% em janeiro deste ano, segundo a mais recente Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), divulgada pelo IBGE. Esse é o seguindo mês seguido de retração no setor, já que, em dezembro, o desempenho do varejo também foi negativo (-6,9%). Mesmo com o resultado desfavorável, o índice do varejo pernambucano no primeiro mês de 2021 superou em 2,6 pontos percentuais o nível pré-pandemia.

Para Fernanda Estelita, gerente de planejamento e gestão do IBGE em Pernambuco, o auxilio emergencial pago pelo governo federal, teve um papel importante na recuperação, mesmo que parcial, do setor do varejo no ano passado. “O auxílio colocou de volta ao mercado uma porção de consumidores que estavam excluídos do comércio”, diz Estelita. Já no setor de serviços, boa parte do segmento é formada por serviços prestados às famílias que, de forma geral, foi a parte que mais sofreu. Neste grupo estão o turismo, a hotelaria, eventos, bares e restaurantes que mesmo com a flexibilização que tivemos no final do ano, não conseguiram retomar o nível de atividade que tinham antes. “Quem coseguiu voltar, voltou com menos capacidade de receber as pessoas, voltou com muitas restrições que impactaram a não recuperação dos serviços”, explica a gerente do IBGE.

Fernanda Estelita avaliou que o auxílio foi importante mas quando ele foi reduzido à metade do valor, (de R$ 600 para R$ 300 a partir de setembro), já houve um impacto forte na queda do comércio e dos serviços. “Como o que está sendo previsto para este ano é um auxílio ainda menor, semelhante ao que houve no final de 2020 (em torno de R$ 250), deve sim haver alguma recuperação mas a gente estima que não será uma grande recuperação, até porque o publico alvo do auxílio será reduzido”, alertou Fernanda. Ela também acredita na vacinação para ajudar a recuperar o setor de serviços e o varejo. “A vacina pode fazer com que as pessoas voltem às ruas, possam trabalhar e consumir mas, como não temos perspectiva de quando a população será vacinada em massa, o que pode acontecer a curto prazo é que estas restrições atuais tenham um efeito de redução no numero de casos de covid-19 e parte da economia possa ser reaberta”, espera Estelita.

COMÉRCIO

Bernardo Peixoto, presidente da Fecomércio-PE, lembrou que alguns setores do varejo sofreram mais que outros. Livrarias e papelarias, por exemplo, recuaram 46% em 2020. Um segmento tradicional do comércio, o de tecidos, vestuário e calçados recuou 17%. “Isso se deu em virtude também da queda da renda média e da elevação do desemprego. O próprio comércio desempregou muita gente no ano passado. Foram fechadas em Pernambuco 31.752 empresas do comércio em 2020. E o que surgiu no lugar foram pequenos comércios comandados pelos microempreendedores individuais (os MEIs). Quando uma empresa fecha ela envolve muito mais gente do que quando abre. Fechando uma loja com 10 funcionários, dali vão surgir dois, três pequenos comércios sem funcionários”, afirmou Peixoto.

O presidente da Fecomércio-PE acredita que o varejo não teve um desempenho pior em 2020 por conta do auxílio emergencial e do Pronampe, programa de financiamento para micro e pequenos empresários. Com juros abaixo do mercado, o empréstimo era limitado a 30% do faturamento anual e exclusivamente para recuperação do capital de giro e pagamento de salários.

Se a vacinação continuar no ritmo que está, o comércio está fadado a fechar dezenas de milhares de empresas"
Bernardo Peixoto, presidente da Fecomércio-PE

Para 2021, Bernardo Peixoto não arrisca maiores previsões. “Este ano será uma icógnita. Vai depender exclusivamente da vacinação. Se for no ritmo que está, o comércio está fadado a fechar dezenas de milhares de empresas, porque levaremos dois ou três anos até vacinar a maior parte da população. A normalidade só vai voltar quando a população estiver 70% a 80% vacinada”.

Bernardo Peixoto defende ainda que a solução definitiva, além da vacina, seriam as reformas administrativa e tributária. “O governo está muito pesado. Veja, para esse novo ciclo do auxílio emergencial vai ser preciso sacrificar o aumento de salários dos funcionários públicos. O governo não tem dinheiro para investir. Sem investimentos, não tem obras, não tem empregos. Sem empregos não tem venda, consumo e produção industrial. É uma bola de neve ao contrário”, diz Peixoto.

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O comércio tem as vendas digitais, o que compensa um pouco as perdas, mas o setor de serviços não tem essa saída. Não tem como cortar o cabelo online”,

Fábio Bentes, economista chefe da Confederação Nacional do Comércio
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Se a vacinação continuar no ritmo que está, o comércio está fadado a fechar dezenas de milhares de empresas"

Bernardo Peixoto, presidente da Fecomércio-PE

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