SAÚDE SUPLEMENTAR

Mudança na "Lei dos Planos de Saúde" gera críticas de associação de defesa dos usuários

Nova lei sancionada pelo presidente Bolsonaro traz alguns benefícios mas afirma que cabe à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) definir os procedimentos que podem ser custeados pelos planos de saúde. Tema está sendo julgado pelo STJ.

Edilson Vieira
Cadastrado por
Edilson Vieira
Publicado em 07/03/2022 às 18:27
ACERVO JC
PRAZO Atualização do rol de procedimentos e eventos em saúde deverá ocorrer em até 180 dias, pela lei - FOTO: ACERVO JC
Leitura:

Uma manobra que pode beneficiar os planos de saúde e prejudicar os cerca de 50 milhões de usuários dos planos. É assim que foi vista pela Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistema de Saúde (Aduspes) a Lei nº 14.307/22, sancionada na última sexta-feira (4), pelo presidente Jair Bolsonaro.

A nova legislação estabelece mudanças à Lei 9.656/98, a chamada “Lei dos Planos de Saúde”. Apesar de trazer alguns progressos, como determinar que os planos de saúde são obrigados a bancar a quimioterapia oral de pacientes com câncer, também afirma que todo procedimento a ser coberto pela operadora deverá constar no rol (lista de procedimentos básicos) da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

A nova lei reforça (mesmo que de forma implícita), a taxatividade da lista. O tema está em análise pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que na última semana de fevereiro suspendeu o julgamento sobre o caráter do rol de procedimentos da ANS, se é taxativo (definitivo) ou exemplificativo (apenas como referência). A definição do STJ é importante porque vai orientar diversos tribunais do país sobre processos judiciais envolvendo planos de saúde e usuários que pedem na justiça a cobertura de terapias complementares como, por exemplo, de crianças autistas que precisam de uma assistência multidisciplinar não prevista no rol da ANS.

INTERPRETAÇÃO

Para a advogada Karla Guerra, coordenadora jurídica da Aduseps, a lei aprovada pelo Governo Federal pode influenciar a futura decisão do STJ, ou mesmo, tornar a discussão inócua já que o texto rejeita o aspecto da lista como simples referência. “A sensação é de preocupação e angústia, porque, como a gente já vem vivenciando, já havia entendimentos do Judiciário de que o rol de procedimentos é taxativo e isso limitava, sobremaneira, o acesso do paciente usuário de plano de saúde ao tratamento (não listado). Agora, essa nova Lei tornou ainda mais rígida essa análise”, avalia Karla Guerra.

Para a advogada, os maiores prejudicados com as mudanças serão os segurados com indicação médica de tratamentos ainda não inclusos na lista: “quem precisar, por exemplo, de uma medicação para uso fora da indicação da bula registrada na Anvisa, os chamados off-label, bem como quem necessita de tratamentos multidisciplinares especializados, como crianças com autismo, e pacientes crônicos que dependem do home-care (acompanhamento médico domiciliar) para viver, já que não existe a previsão dessa cobertura no rol da ANS como obrigatória”, cita Karla.

A advogada explica ainda que o entendimento do rol da ANS como meramente exemplificativo, acatado por alguns juízes, facilitava o direito do paciente à cobertura de tratamento não listado, quando esse ingressava com pedido na Justiça. “O juiz podia analisar a urgência, a necessidade e a viabilidade de conceder uma tutela favorável ao usuário. Com essa nova Lei, o magistrado vai ficar muito mais engessado e quem vai sair no prejuízo serão os usuários de planos de saúde”, alerta.

VANTAGENS

A lei aprovada estabelece alguns pontos positivos, segundo a Aduseps, como a inclusão de novos procedimentos, estabelecendo prazos para que a ANS conclua as análises para mudanças no rol de cobertura obrigatória: serão 180 dias, prorrogáveis por mais 90, para conclusão do processo administrativo. Normatiza ainda a inclusão de terapias contra o câncer,  incluindo medicamentos de uso domiciliar, de acordo com as novas regras.

Findados os prazos, caso a reguladora não tenha concluído o processo de análise, o procedimento passa a ser incluído, automaticamente, no rol de cobertura obrigatória dos planos, “até que haja decisão da ANS, garantida a continuidade da assistência iniciada mesmo se a decisão for desfavorável à inclusão”.

"A lei tem alguns avanços importantes mas da forma como foi aprovada no Congresso, e sancionada pelo Presidente, em tempo recorde, praticamente, não permitiu maiores análises. Do jeito que foi feito parece que a intenção foi influenciar, de alguma forma, o julgamento do STJ", acredita a advogada Karla Guerra. O Superior Tribunal de Justiça não tem ainda uma nova data para julgamento da ação que vai determinar se o rol de procedimentos da ANS é taxativo ou exemplificativo.

MINISTÉRIO  

O Ministério da Saúde divulgou que com a nova lei, a inclusão de novos procedimentos na saúde suplementar ficará mais rápida para os usuários de planos de saúde no país. Até agora, pela legislação vigente, não havia prazo determinado para que a análise para incorporações fosse realizada pela saúde suplementar. "A legislação cria um processo para novas tecnologias no âmbito da saúde suplementar, isso vai evitar que tenhamos uma incorporação prematura de determinadas tecnologias ou que isso se arraste por uma década", afirmou o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

O Ministério da Saúde reforçou que "ainda de acordo com o texto sancionado, o fornecimento de medicamentos contra o câncer de uso oral e domiciliar pelos planos de saúde será obrigatório, seguindo a prescrição médica e desde que estejam registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com uso terapêutico aprovado e observado o processo de incorporação da ANS".

Sobre a lista de procedimentos, o Ministério da Saúde divulgou que "a legislação prevê a criação da Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar. O objetivo da equipe técnica é apoiar e assessorar a ANS na tomada de decisão sobre novas tecnologias e medicamentos, inclusive transplantes e procedimentos de alta complexidade cuja composição e funcionamento serão definidos em regulamento. O processo administrativo a ser realizado pela ANS deverá ocorrer por meio de consulta pública no prazo de 20 dias e ainda prevê a realização de audiência pública no caso de matéria relevante ou quando houver recomendação preliminar de não incorporação".

Comentários

Últimas notícias