Inação da embaixada do Brasil na Ucrânia constrange brasileiros por falta de atitudes solidárias
De acordo com os relatos de todos os que conseguiram sair, a última instituição onde encontraram apoio foi na embaixada brasileira em Kiev
Na última sexta-feira (25), o embaixador do Brasil na Ucrânia, Norton Rapesta, postou na internet a seguinte mensagem: "Depois de um dia longo e estressante, dei a mim mesmo uma dose de um bom uísque. Ajuda a relaxar. Boa noite." Logo depois, apagou o post.
A informação postada pelo blog do jornalista Lauro Jardim, no Globo, pode sugerir que o Brasil está atendendo muito bem a seus compatriotas que estão na Ucrânia e que Rapesta está se envolvendo e colocando os recursos que dispõe para ajudar os brasileiros a sair da zona de guerra. Pode ser.
Mas a julgar pelos relatos de todos os que conseguiram sair, a última instituição onde encontraram apoio foi na embaixada.
Talvez por isso soe estranho quando o presidente Jair Bolsonaro põe nas suas redes a mensagem de que “Um grupo de 39 pessoas (37 brasileiros e 2 uruguaios) que partiu de Kiev chegou à embaixada do Brasil na Romênia. Estão todos bem de saúde e em segurança”.
Os brasileiros não tiveram apoio da Embaixada e a chegada a Romênia se deve ao fato de a administração das ferrovias da Ucrânia não cobrar pelas passagens dos que conseguem chegar às estações.
O Brasil tem aproximadamente 500 brasileiros na Ucrânia. Nesse número não estão os ucranianos com famílias naquele país. Isso quer dizer que com uma ação mais próxima do embaixador apreciador do bom malte, seria possível acompanhá-los mais de perto. Mas não é isso que estamos ouvindo de quem tenta e de quem consegue sair.
Pela internet se soube, entre outras notícias, que jogadores brasileiros que atuam no futebol da Ucrânia enfrentaram grandes dificuldades para cruzar a fronteira e deixar o país.
Em meio à guerra com a Rússia, Guilherme Smith, Juninho Reis e Cristian Dal Bello conseguiram chegar com suas famílias nas proximidades da fronteira ucraniana com a Polônia e hospedados em um hotel, “aguardando orientações da embaixada brasileira” para uma nova tentativa de chegar ao país vizinho.
A quatro quilômetros da divisa, foram barrados e precisaram esperar em uma longa fila sob frio de cerca de 1ºC.
Juninho Reis é casado com a pernambucana de Salgueiro Vitória Magalhães e tem relatado as dificuldades para sair da Ucrânia. Por volta das 23h12 (horário de Brasília) deste sábado (26), ela publicou vídeos em sua conta oficial no Instagram sobre a situação.
O jogador atuou em 2018 no Salgueiro Atlético Clube. O casal tem o pequeno Benjamin. Eles estão num abrigo em Lviv, cidade do oeste ucraniano. Eles entraram em contato diversas vezes com a Embaixada Brasileira em Kiev, capital ucraniana, mas não tiveram êxito.
Outro pernambucano, Gabriel Melo, de 31 anos, que mora no Centro de Kiev, capital da Ucrânia, teve mais sorte.
Ele deixou a cidade após os ataques da Rússia, registrados desde quinta (24), pegou um trem para Ivano-Frankivs'k, no Oeste ucraniano. Ele disse que a viagem durou 13 horas. Neste sábado (26), o recifense disse que a meta era chegar até a fronteira com a Eslováquia.
Gabriel Melo contou que está com uma ucraniana. O recifense afirmou que um amigo dela vai levá-los para cruzar fronteira com a Eslováquia no domingo (27).
A fuga do grupo de brasileiros se deu graças ao apoio da embaixada de Portugal, que acolheu os brasileiros no ônibus até a estação ferroviária.
Há ainda um caso dramático. O jogador de futsal Jonatan Bruno Santiago, de 30 anos, revelou nas redes sociais o abandono do grupo brasileiro do clube de futebol Shakhtar Donets. Ele subiu para tomar um banho e foi esquecido pelo grupo na hora da saída.
Ao saber da informação, a ucraniana Lyarah Vojnovic, esposa do meio-campista Maycon do Shakhtar Donetsk, veio por meio das suas redes sociais rebater as declarações dos compatriotas deixados na Ucrânia.
Segundo ela, o grupo de brasileiros que deixou o país não se desfez de ninguém, e que a situação de fuga exigiu medidas mais sérias priorizando a retirada das crianças do grupo.
O que chama atenção é a repetição de depoimentos de falta de apoio da embaixada do Brasil na Ucrânia. Rigorosamente, nenhum dos brasileiros que conseguiu cruzar a fronteira relatou algum tipo de acompanhamento da embaixada.
A Embaixada do Brasil em Kiev, na Ucrânia, declarou, na tarde da sexta-feira (25), que um trem destinado a cidadãos brasileiros e latino-americanos, registrados junto à Embaixada, partirá hoje da capital com destino à cidade de Chernivtsi, no oeste do país.
Na verdade, o trem sai todos os dias e não havia nada de especial para brasileiros como sugere a comunicação, dando um sentido de tratamento diferenciado
Oficialmente, a Embaixada do Brasil em Kiev informa que permanece aberta e dedicada, com prioridade, desde o agravamento das tensões, à proteção dos cerca de 500 cidadãos brasileiros na Ucrânia.
Mas o contato somente é possível pelo site (kiev.itamaraty.gov.br), em sua página no Facebook (https://www.facebook.com/Brasil.Ukraine) e em grupo do aplicativo Telegram (https://t.me/s/embaixadabrasilkiev).
O governo brasileiro também tentou mostrar uma atenção especial ao informar que a Força Aérea Brasileira (FAB) informou que dois jatos Embraer KC-390 estão prontos para fazer uma missão de resgate dos brasileiros que estão fugindo da Ucrânia.
Tudo bem. Mas quem está reunindo brasileiros e como eles poderão chegar a um aeroporto previamente alocado? Publicada nas redes sociais da FAB, a notícia até agora não produziu nenhum efeito prático.