Perda do discurso social assusta Lula, PT, ministros do partido diante de um 2026 que é logo ali

O discurso da perda de identidade chega com base em análises e interpretações dos velhos formadores de opinião do PT nas universidades.

Publicado em 10/11/2024 às 0:05

Nas últimas duas semanas, uma pergunta assalta o presidente Lula, o seu entorno e formadores de opinião do Partido do Trabalhadores: com qual discurso o presidente e seu grupo político vão se apresentar em 2026 para a disputa de uma eventual campanha de reeleição se tiverem perdido o discurso de conquistas sociais que ele resgatou no seu terceiro mandato?

A questão se tornou presente diante de um conjunto de sugestões que os ministros Fernando Haddad, Simone Tebet e Esther Dweck apresentaram ao presidente como tentativa de solucionar a grave crise que se aproxima em 2025, quando o governo terá que cumprir as regras do programa gestão das contas públicas, o chamado Arcabouço Fiscal.

Após impeachment

Esse é um programa que ele mesmo apresentou e aprovou no Congresso, em 2023, como alternativa à lei do teto de gastos que Michel Temer aprovou em 2018 após o impeachment da então presidente Dilma Rousseff.

O presidente resiste. E só aceitou que o ministro da Fazendo fosse adiante em formular uma proposta porque entendeu que precisa tomar uma atitude diante de um conjunto de evidências que apontam para a manutenção de uma taxa básica de juros em alta e crescente.

Maior inflação

Também porque a taxa da inflação futura também vai nessa direção; do cenário de incertezas para a economia brasileira diante da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos e a desorganização das contas de seu governo que ele próprio estimulou como estratégia de devolução do pacote de benefícios sociais que os governo do PT aprovaram ao longo de 16 anos de gestão federal.

Lula não gosta da ideia e não quer assumir o papel de controlador das finanças públicas do governo e, muito menos, da possibilidade de terminar o terceiro mandato com a marca de ter cortado benefícios sociais de quem não tem como se sustentar.

Cenário de Tebet

Só que o cenário que Haddad, Tebet e Dweck mostraram não lhe permite mais contornar a situação. Se quiser abordar a questão de frente pensando num possível resultado das contas públicas que, segundo os ministros, poderão ser exatamente o eixo do discurso a ser apresentado em 2026.

Nas últimas semanas, o presidente até aceitou ouvir. Teve longas conversas com seu ministro da Fazenda que, aparentemente, o convenceu que a decisão de resgatar todos os programas que implantou ao longo de seu governo se tornaram caros demais e que - mesmo Haddad tendo aumentado a arrecadação - se tornaram insuficientes.

Ricardo Stuckert / PR;RICARDO STUCKERT
Lula resiste a cortar gastos sociais. - Ricardo Stuckert / PR;RICARDO STUCKERT

Receituário amargo

Mas o que assusta o presidente é o receituário prescrito. Ajuste rigoroso na gestão de todos os programas sociais, revisão de acesso e suspensão de novas categorias.
Eles querem até mesmo mudanças da Constituição de modo a desvincular os benefícios ao salário-mínimo e ao crescimento da arrecadação dos ministérios da Educação e Saúde. Mesmo que na outra direção, o governo aperte a revisão de todo um conjunto de desonerações às empresas, lhe perturbam.

Segunda opinião

Presidentes de democracias em situações como a vivida por Lula, normalmente pedem uma segunda e terceira opinião. É normal e a História registra que a saída encontrada veio do confronto dessas visões.
O que preocupa os analistas e congressistas que acompanham a questão é que o presidente não tem boas opções no seu entorno e, muito menos, no partido que criou e a quem deu os maiores e mais visíveis ministérios. Se ouvi-los, o projeto de Haddad, Tebet e Dweck já era.

A demora na possível decisão de Lula já permitiu que, mesmo sem pedir, a opinião deles já chegasse a partir das conversas dos ministros para mostrar as propostas. E todas em total resistência à ideia de cortes nas pastas, inclusive, quando se propõe ajustes operacionais, recomendação recebida com uma crítica às suas gestões.

Ainda que não tenham sido reveladas em seu inteiro teor, o conjunto de reações internas tem sido tão violento que o presidente concordou em que a equipe econômica forneça mais dados e mais opções ao primeiro diagnóstico. Até porque os ministros têm acesso direto ao presidente e não hesitaram em procurá-lo e deixar claro a insatisfação.

Perda de identidade

E para resistir, o discurso da perda de identidade já está chegando com base em análises e interpretações dos formadores de opinião do PT nas universidades e antigos auxiliares diretos de Lula noutros governos. Eles verbalizam a tese de que a atitude de cortar benefícios já consolidados é o fim da possibilidade de uma disputa com chances de vitória em 2026.

Gosta da ideia

Todos sabem que Lula é receptivo a esse discurso. Sabem que o presidente só aceitou abrir essa discussão porque percebeu que o seu terceiro governo ao final de dois anos não é, nem de longe, o dos anteriores e que o mundo que habita é inteiramente diferente do que liderou até 2010.

E, aparentemente, percebeu que precisa tomar uma atitude que jamais imaginou quando foi eleito em 2022 quando acreditou que o caixa do governo poderia bancar o conjunto de benefícios sociais que criou e que segundo sua interpretação foram suprimidos por Jair Bolsonaro a partir de uma visão equivocada.

Novas armadilhas

O presidente tinha, e ainda tem, certeza nessa avaliação e não percebeu as armadilhas criadas pelo seu antecessor e que potencializou quando (re)inaugurou os programas.

A ideia de agregar ganho ao salário-mínimo e ampliação das condições de acesso ao Bolsa Família, por exemplo, encontraram um INSS como mais 15 milhões de segurados aposentados que tinha em 2010. A base de remuneração do PBF saiu de R$2 bilhões, em 2018, para R$20 bilhões em outubro passado e de R$200, para R$700, 00 em média.

Mais benefícios

Além disso, o próprio envelhecimento da população contratou a explosão do déficit da Previdência, mesmo como a reforma de 2020 e que se mostrou insuficiente. O mesmo envelhecimento que leva mais gente que não contribuiu para o BPC a partir de 65 anos.
Mas tudo isso são apenas detalhes. No fundo, o que assusta o presidente é a possibilidade de mesmo fazendo os cortes, a economia das contas não ser percebida pelos seus eleitores ou ser rejeitada por eles.

O que fazer

O fato é que o quadro de 2025 deixou de ser uma opção. A crise contratada já não dá mais ao presidente opções de escolha.

O desafio de Lula é ceder aos seus conceitos de um político de 78 anos e decidir por uma solução que tente agradar a todos mesmo sabendo que pode no final desagradar a todos e chegar a 2026 inviabilizado como candidato à reeleição.


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Zahovaev K
O emprego na indústria não cai há um ano. - Zahovaev K

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