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Divulgação de Instrução Normativa da Receita Federal detonou explosão de fake-news

A revelação de que instituições financeiras e operadoras de cartão de crédito devem reportar as operações em cada mês gerou a onda de desinformação.

Por Fernando Castilho Publicado em 15/01/2025 às 11:10 | Atualizado em 15/01/2025 às 20:14

Atualizada às 20h06

A divulgação, no início do ano, da validade de uma Instrução Normativa da Receita Federal sobre a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras por fintechs emitida em 18 de setembro de 2024 está na origem de uma onda de informações equivocadas e também de fake-news e que já fez com que milhões de pessoas deixem de receber pagamento com PIX temendo serem tributadas.

Aconteceu no último dia 3, quando inúmeros veículos de imprensa do País publicaram a informação, desde o início da tarde e de forma correta, esclarecendo que as operadoras de cartões de crédito e instituições de pagamento que movimentam recursos financeiros devem prestar informações à Receita Federal sobre operações financeiras de contribuintes.

Um desses veículos foi a própria Agência Brasil - instituição ligada à Secretaria de Comunicação do Governo Federal -, que, diga-se, tratou o assunto de forma correta.

O envio dos dados seria semestral. E a regra, prevista na Instrução Normativa 2.219, de 2024 do órgão federal, já estava valendo, quando veio a revogação na tarde desta quarta-feira.

A reportagem informou apenas que, em nota, a Receita Federal afirmou que as medidas têm o objetivo de melhorar o controle e a fiscalização das operações financeiras, por meio de uma maior coleta de dados.

“[As medidas] reforçam os compromissos internacionais do Brasil, contribuindo para o combate à evasão fiscal e promovendo a transparência nas operações financeiras globais”, reforçou a nota da Receita Federal.

Veja a instrução da RFB

Novas obrigações

A norma atualiza e amplia a obrigatoriedade de envio de informações à Receita Federal via e-Financeira, que é o sistema eletrônico da Receita Federal que faz parte do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped).

A mesma informação foi distribuída pela TV Brasil na edição da tarde do noticiário Repórter Brasil (https://youtu.be/lk5n6SLBDfs) com os mesmos dados. As informações da Agência também ficam disponível para uso gratuito, desde que referenciado, por veículos de imprensa de todo o País.

O problema é que a revelação de que instituições financeiras e operadoras de cartão de crédito devem reportar as operações sempre que o montante global movimentado ou o saldo, em cada mês, por tipo de operação financeira, for superior a R$ 5 mil para pessoas físicas e R$ 15 mil para pessoas jurídicas acabou sendo percebida pelas pessoas como uma nova forma de tributação de pessoas físicas e microempresas, o que não é verdade.

O problema é a chamada de que uma movimentação financeira superior a R$ 5 mil para pessoas físicas e R$ 15 mil para pessoas jurídicas era forte demais especialmente para os usuários de contas digitais, sobretudo para os usuários de fintechs era impactante demais. E isso assustou as pessoas.

Foco da RFB é nas fintechs

Na verdade, segundo a IN 2219/2024,  instituições como o Nubank, GuiaBolso, PicPay, Toro Investimentos, Creditas, Neon, QuintoAndar, Contabilizei, Conta Azul, Banco Original, PagSeguro, Banco Inter, Méliuz, Konkero, Melhor Câmbio, Mobills, Geru, Banco Pan, TradeMap, Magnetis, Acordo Certo, Meu acerto, entre outras que operam meios de pagamento não eram obrigadas a informar e agora são.

Isso não quer dizer que essa informação será usada como base tributável. Mas assim for percebida. Na verdade, o PIX realizado para essas instituições não era conhecido pela Receita Federal, e, como essa movimentação começou a crescer exponencialmente, a instrução se tornou necessária.

Atualmente, os bancos comerciais já fornecem essas informações ao Banco Central e à Receita Federal através de seus canais de comunicação para o processamento dos bilhões de operações, que os correntistas fazem diariamente. Mas, certamente, após dois anos de notícias em que o Governo Lula se notabilizou pelo aperto da fiscalização, criaram o ambiente ideal para a explosão da desinformação.

Esclarecimento da Receita Fedetal

Fiscalização já existe

Efetivamente, o que a Receita Federal fez em setembro foi avisar as fintechs que em janeiro elas estariam no bloco de instituições que passariam a ser monitoradas regularmente. P fato novo foi que os valores mínimos de obrigatoriedade foram atualizados. Até 2024, os valores mínimos obrigatórios eram menores (R$2 mil para pessoa física e R$6 mil para empresas).

A partir de 2025, é preciso que os montantes mensais alcancem um maior valor para caracterizar a obrigatoriedade de envio à Receita Federal, ou seja, R$5 mil para pessoas físicas e R$15 mil para empresas.

Mas não existe previsão constitucional para a taxação de movimentações financeiras. Também a Receita Federal não identifica o tipo de transação, seja por PIXEL ou outras modalidades, como Transferência Eletrônica Disponível (TED), Documento de Ordem de Crédito (DOC).

As instituições declarantes não identificam a modalidade de operação realizada. E para quem não sabe o sistema eletrônico atual, criado em 2015. Antes, as instituições prestavam informações por intermédio de outras declarações.

Outra coisa importante é que as pessoas físicas que já entregaram sua declaração anual do Imposto de Renda não terão qualquer mudança. Na verdade, nada muda para elas. Até porque as operações não são identificadas as datas, nem a modalidade, tampouco o motivo das transações individuais.

O problema é que mesmo a receita federal e o ministério da fazenda tendo se esforçado para explicar que não houve qualquer mudança para o contribuinte final, a onda de informações falta já se espalhou. E, naturalmente, se criou a indústria de golpes contra pessoas mal informadas.

Ironicamente, uma informação correta que constava também na distribuição de uma agência do governo sobre uma atualização de procedimentos burocráticos pode ter fortalecido um dos maiores problemas de comunicação do Governo Lula, que duas semanas depois não sabe como resolver.

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