Diferentemente de São Paulo, Rio de Janeiro e Paris, Recife não tem sofrido com os problemas provocados pelo uso errado do equipamento, mas estuda novas regras. Fotos: Renato Cerqueira/Estadão
Os patinetes elétricos, que explodiram como veículos de transporte de dois anos para cá no mundo, em São Paulo e no Rio de Janeiro, e chegaram ao Recife em fevereiro passado, seguem polêmicos. Têm tirado o sossego de gestores públicos, gerado indignação entre pedestres e brigas jurídicas com a administração pública. Em Paris, provocaram a morte de uma pessoa essa semana. Em São Paulo e no Rio de Janeiro têm acumulado acidentes. Por sorte, porque o número de equipamentos é pequeno, ou porque ainda é cedo e a explosão virá, o Recife não tem sofrido com problemas relacionados ao novo símbolo da micromobilidade urbana. Pequenos acidentes aconteceram, mas foram poucos. No caso da capital, o uso não está, pelo menos por enquanto, disseminado. Talvez o valor alto – R$ 3 para liberar e R$ 0,50 o minuto de utilização – afaste os usuários. Talvez a repercussão negativa que tomou conta do tema na mídia nacional e mundial seja mais uma razão.
Mesmo assim, a Prefeitura do Recife trabalha para ampliar as exigências e o controle de utilização na cidade. A ideia é limitar a velocidade a ser desenvolvida pelos equipamentos, que hoje chega a 25 km/h. Reduzí-la para 15 km/h ou 20 km/h. Também deverá proibir a circulação dos equipamentos nas calçadas da cidade. A regulamentação está sendo discutida pela Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano. Em abril, o município deu os primeiros passos para disciplinar a chegada das empresas de compartilhamento público de bicicletas e patinetes elétricos dockless (sem estação). Na portaria técnica 12.2019 estão previstas regras a serem obedecidas pelas empresas como forma de garantir um bom funcionamento e evitar a invasão do espaço do pedestre. Pelo menos por enquanto, a Yellow é a única empresa que se habilitou para operar na cidade.
“Estamos, sim, analisando novas regras para evitar que aconteça no Recife o que temos visto em outras cidades do Brasil e do mundo. Entendemos que o cidadão tem todo o direito de ter sua relação privada com os aplicativos privados. Mas a partir do momento em que o espaço público passa a ser usado, regras são necessárias. Já avançamos com a portaria que ordena a operação dos sistemas dockless e temos tido uma boa parceria com a empresa operadora. Mas estudamos novas regras”, garante o secretário de Mobilidade e Controle Urbano, João Braga.
Embora de forma geral as regras sejam boas para todos – porque exigem contrapartidas para a exploração do serviço, como paraciclos, e a expansão pela cidade, numa tentativa de reduzir o caráter elitista que o modelo ainda possui – a portaria avançou pouco na questão da garantia de segurança dos usuários. Diz apenas que as empresas devem orientar os clientes sobre a forma correta de utilizar os patinetes. Nada mais. Por isso e vendo o que acontece nas cidades, o município estuda ampliar as exigências.
Aprenda a utilizar, da forma correta, os patinetes e as bicicletas da Yellow
A Grow, holding responsável pelas marcas Yellow e Grin, elogiou a portaria da Prefeitura do Recife, garantiu que os seus produtos têm seguro para os usuários, e que 99,99% das viagens realizadas com os patinetes da marca não têm notificações de acidente. Disse estar ampliando cada vez mais as ações educativas e que, assim como está acontecendo em São Paulo, em breve o Recife receberá duplas de educadores para orientar os usuários, intensificando a comunicação e a divulgação das boas práticas no uso de patinetes. Destacou, ainda, que é necessário que as cidades ampliem as malhas cicláveis.
A POLÊMICA NO BRASIL E NO MUNDO
PARIS (FRANÇA)
A situação em Paris é a mais grave. Depois de dezenas de atropelamentos e acidentes com os patinetes elétricos, um jovem de 25 anos morreu ao colidir com um caminhão numa curva na última quarta-feira (10). A ausência de regras e o desrespeito por alguns usuários são tão grandes que fizeram um grupo de parisienses atropelados inaugurar a primeira associação que milita pelos direitos das vítimas envolvidas em acidentes com o aparelho. Regras estão sendo definidas para vigorar a partir de julho. Entre elas, a velocidade limitada a 20 km/h em ruas e a 8 km/h onde há pedestres, além de multas de US$ 153 para quem trafegar nas calçadas.
RIO DE JANEIRO
A última semana foi agitada no Rio de Janeiro em relação aos patinetes elétricos. Foram duas leis aprovadas pelos deputados. A situação é tão confusa que a Tembici e a Petrobrás, parceiras na operação dos equipamentos, suspenderam a operação na cidade temporariamente. Entre as regras aprovadas, a exigência de teste de condução ou CNH para os usuários, pagamento de depósito antecipado de 500 UFIR-RJ (R$ 1.700) ao condutor que não possuir seguro pessoal, além de não ser permitido usar os patinetes nas áreas de pedestres. Só estão autorizados nas ciclovias e ciclofaixas, com velocidade máxima de 20km/h. As empresas e os condutores que descumprirem a lei receberão uma advertência e multa no valor de 50 Ufirs (R$ 170).
SÃO PAULO Em São Paulo, o prefeito Bruno Covas (PSDB) declarou guerra à ausência de regras para o uso dos patinetes elétricos na cidade. Por meio de decreto, definiu inúmeras normas que já renderam brigas e decisões judiciais. Além de diversas apreensões de equipamentos. As principais são: os patinetes estão proibidos de circular em calçadas, só podem trafegar em ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas ou em ruas com limite de velocidade de até 40 km/h, e a velocidade máxima desenvolvida deve ser de 20 km/h. No decreto, a prefeitura exigia também que os usuários utilizassem capacetes, mas a determinação foi suspensa pela Justiça. Há, ainda, um posicionamento do Procon-SP para que a velocidade dos equipamentos seja reduzida para 12 km/h. Além disso, a prefeitura cobrou R$ 819,81 por patinete apreendido e R$ 20 mil, por empresa, por descumprimento do decreto.
Confira, abaixo, a entrevista feita com a Grow, holding responsável pelas marcas Grin e Yellow:
BlogMoveCidade – No caso do Recife, vcs têm registrado acidentes com os equipamentos desde que iniciaram a operação no início do ano?
Grow – Não contabilizamos acidentes porque não temos acesso a todas as ocorrências. O que nós temos são as notificações dos nossos usuários. O que podemos dizer é que 99,99% das nossas viagens não recebem qualquer notificação de acidente. De qualquer forma, cada acidente é muito importante para a Grow (holding responsável pelas marcas Grin e Yellow), e estamos trabalhando firme para intensificar a comunicação e a divulgação das boas práticas no uso de patinetes. Estamos espalhando dezenas de duplas de educadores pela cidade de São Paulo, nos pontos de maior uso dos patinetes como Faria Lima, Vila Olímpia e Paulista, para orientar os nossos usuários, diariamente, por tempo indeterminado. Essas ações devem acontecer em breve em outras cidades do País. Além de orientar, estamos distribuindo nacionalmente capacetes, num programa que já distribuiu mais de 5 mil equipamentos e que até o final do ano doará 20 mil unidades aos usuários. Também toda primeira corrida do dia de todos os usuários será precedida no app da Grin e da Yellow por um pop-up com as nossas orientações. Estamos vivendo uma revolução na mobilidade. Uma grande novidade que está ajudando a reduzir o uso dos carros e devolvendo as ruas para as pessoas. E para que o patinete seja seguro é preciso um esforço de todos. E é preciso mais ciclovias, menos velocidade dos carros, sempre mais orientação por parte das empresas e mais cuidado por parte dos usuários.
BlogMoveCidade – Sobre o cadastramento para operação no município, fizeram e já estão com autorização legal para operar?
Grow – Estamos credenciados pela Prefeitura de Recife e operando normalmente na cidade.
BlogMoveCidade – Quais as mudanças operacionais adotadas para se ajustar às regras impostas pela prefeitura?
Grow - A estrutura de operação da Grow sempre privilegiou a organização da cidade e o bom uso do espaço público. Intensificamos nossas campanhas de respeito à lei de trânsito, prevalência do pedestre e estacionamento de forma adequada.
Situação fugiu do controle em Paris, quando um jovem morreu ao colidir contra um caminhão. Foto: AFP
BlogMoveCidade – A Grow tem sofrido com a fiscalização realizada pela prefeitura? Vem tendo equipamentos apreendidos? Quais (patinetes e/ou bicicletas) e quantos?
Grow – Desde o credenciamento, a Grow opera normalmente na cidade.
BlogMoveCidade – A Grow pode fazer uma comparação entre as regras criadas no Recife e as de SP? São parecidas ou não? Uma é mais rigorosa que a outra?
Grow – A regulamentação de Recife é mais moderna e promove a utilização da patinete como nova forma de mobilidade urbana. A possibilidade do estacionamento em vagas livres, criação de vagas dedicadas e liberdade oferecida ao usuário são, sem dúvida, diferenciais da cidade.
BlogMoveCidade – Qual a situação que a Grow tem enfrentado nas outras cidades onde opera em relação às regras criadas pelas prefeituras?
Grow – O diálogo e a educação do usuário são os balizadores de nossas operações nas cidades. Diálogo com o poder público, usuários e não usuários e educação do usuário.
BlogMoveCidade – Quais os procedimentos judiciais que a empresa tem adotado para garantir a operação?
Grow – A Grow não abre essas informações por questões estratégicas.
Rio de Janeiro aprovou duas leis semana passada. Foto: Estadão
BlogMoveCidade – Sabemos que vocês não divulgam números de equipamentos e viagens por cidade, mas informem alguns dados porque a impressão que temos no Recife é que a qtd de equipamentos é muito, muito pequena e que está basicamente concentrada em Boa Viagem. No Centro são poucos, muito poucos. Vemos essa realidade pelo app. Isso compromete a confiabilidade do serviço, algo fundamental para qualquer sistema de transporte, incluindo os modais da micromobilidade.
Grow – A Grow possui um time de rebalanceadores que atua para deixar os equipamentos espalhados de forma uniforme dentro de nossa área de atuação. A quantidade de equipamentos é estruturada de forma que garanta a densidade necessária de equipamentos na região. Juntas, as companhias Grin e Yellow contam com mais de 135 mil patinetes e bikes em sete países, já realizaram 2,7 milhões de viagens em apenas seis meses e contam com 1,1 mil funcionários.