Hoje é um bom dia para começar a planejar se libertar do uso permanente do automóvel. Foto: Arnaldo Carvalho/JC Imagem
Chegamos a mais um Dia Mundial Sem Carro, data criada pelos franceses em 1997, ampliada na Europa em 2000, e lembrada no Brasil desde 2007. Uma dia para reflexão. Um dia para tentativas de mudança de hábitos. Um dia para as pessoas pensarem em experimentar outras formas de deslocamento. Em diminuir a necessidade de utilizar o automóvel para tudo. Tentar fragmentar os deslocamento, misturando as opções de transporte. Utilizar o ônibus em alguns dias e trechos, caminhar e pedalar pela cidade em outros. Deixar o carro na garagem em mais alguns. É difícil, é verdade. É desanimador também. Mas é possível!
– Só vou andar de transporte coletivo quando ele tiver qualidade
– Na Europa eu ando, porque é bom, mas no Brasil e ainda mais no Grande Recife, é impraticável
– Impossível andar a pé nessa cidade: é perigosa, suja e não tem calçadas
– Não há ciclovia ou ciclofaixa suficiente para a gente pedalar no Recife
Antes que você, caro leitor, pense em usar uma dessas desculpas para justificar o uso cotidiano e frequente do automóvel, saiba que elas são conhecidas e repetidas por muitos. E se você optar por ficar com elas, vai continuar refém da comodidade e vendo a cidade da janela do carro. Sem senti-la. Até mesmo para ter propriedade em reclamar melhorias. As dificuldades estão por toda parte – é fato e ninguém nega –, mas se a sociedade decidir esperar por todas as mudanças necessárias, desistirá. Por isso, no dia de hoje, pense em tentar mudar. Planeje uma ida ao trabalho de uma ou várias formas que não seja de carro.
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Não estamos aqui demonizando o automóvel. Até porque ele é necessário em muitas situações. A discussão necessária não é a propriedade, mas a utilização do carro. Isso porque ele é maligno para a saúde das cidades. Na Grande São Paulo, por exemplo, onde há dados permanentemente atualizados sobre a poluição, os carros são responsáveis pelas emissões de 62,91% de monóxido de carbono. Enquanto o transporte coletivo sobre pneus, somando ônibus urbanos, micro-ônibus e ônibus rodoviários, foi responsável por 1,92% das emissões.
O que queremos dizer é que é possível usar menos o transporte individual. E que essa mudança começou. É lenta, é verdade, mas começou. O abandono do desejo pelo carro já é real. Os jovens já estão deixando de querer o automóvel. Não anseiam mais pela propriedade, apenas pela utilização. É o conceito MaaS – Mobility as a Service (mobilidade como serviço) –, que ganhou o mundo e cresce no Brasil.
Em três anos, a emissão de novas Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) caiu 20,6% entre jovens de 18 e 21 anos no País. De 1,2 milhão de CNHs em 2014, reduziu para 939 mil em 2017. De forma geral, considerando as quedas em outras faixas etárias, o número de CNHs caiu de 3 milhões para 2,1 milhão. Por outro lado, a opção pelo compartilhamento de modais de transporte só cresce. Para forçá-lo a agir, apresentamos números impactantes de um trânsito irresponsável. Pesquisa divulgada na semana passada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) apontou que, somente em 2018, 69 mil acidentes foram registrados nas estradas federais do Brasil e que 54 mil deles resultaram em mortos ou feridos. As colisões entre veículos são o mais comum: 60,1% dos acidentes com vítimas no País. Ou seja, o trânsito brasileiro nas BRs gera 190 acidentes e mata 14 pessoas todos os dias. No País, o trânsito mata, em média, 40 mil pessoas por ano.
Quando o recorte é feito em Pernambuco, o cenário também é impactante. Números da Secretaria Estadual de Saúde (SES) mostram que em 2018 os hospitais públicos especializados em ortopedia e traumatologia atenderam 39,6 mil vítimas de acidentes (os chamados ATTS – acidentes de transporte terrestre, como define o setor de saúde). Desse total, 28,8 mil eram motociclistas, o que representa 72% dos atendimentos e confirma a praga que a imprudência na condução de motocicletas virou para a saúde pública.
Foto: Diego Nigro/Acervo JC Imagem
Como se já não bastassem os dados, os questionamentos e mudanças que o governo federal tem promovido em relação à segurança viária, ao rever e abrandar as regras para habilitação de condutores e fiscalização de excesso de velocidade nas vias – só para citar dois exemplos – evidenciam ainda mais a necessidade de mudança. “A boa formação do condutor é fundamental para que ele se conscientize sobre as leis e o seu papel no trânsito e na mobilidade. Datas como o Dia Mundial Sem Carro são essenciais para trazer uma reflexão a essas pessoas sobre o uso excessivo do automóvel, que é um meio de locomoção individual responsável por aumentar o trânsito, dificultar a mobilidade coletiva e que amplia a emissão de poluentes nas cidades. Este dia é oportuno para que as pessoas vivenciem as cidades de outra maneira, com alternativas sustentáveis que contribuam com o meio ambiente, seja com transporte público, bicicleta ou por meio de caminhadas”, ensina Cristiano Caporici, diretor do Instituto Mobih, entidade que estimula a mobilidade mais humana, inteligente e segura nas cidades.
Por tudo isso, experimente mudar. Arrisque-se!