Brasil ainda resiste à retirada dos cobradores dos ônibus: apenas 30% adotaram a mudança totalmente
Resultado é apontado em levantamento nacional da NTU. Quando é considerada também a mudança parcial, 60% dos sistemas aderiram
Não foi à toa que o transporte por ônibus da Região Metropolitana do Recife viveu um ano de protestos contra a retirada de cobradores e, principalmente, a dupla função de motoristas. Os dois processos, que estão correlacionados, são difíceis, polêmicos e ainda estão longe de virar consenso, ao menos no Brasil. Levantamento atualizado do próprio setor empresarial aponta que apenas 30% dos sistemas extinguiram a função do cobrador no País, por exemplo. Por outro lado, quando considerados aqueles que adotaram o modelo parcialmente, esse percentual sobe para 60%.
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Os dados são da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), atualizados a partir de informações repassadas por 105 sistemas de transportes urbanos por ônibus do País. O Brasil tem um número muito maior do que esse - são 2.901 sistemas, segundo a NTU -, mas o levantamento foi feito apenas com aqueles de maior representatividade nas capitais e grandes cidades. Até porque, são os que costumam atender às pesquisas da entidade. Os cobradores representam, em média, de 12% a 14% do custo dos sistemas de ônibus.
O mesmo levantamento mostra que 34,6% desses sistemas ainda não eliminaram o profissional dos coletivos. Por outro lado, a maioria já aderiu à bilhetagem eletrônica, primeiro passo para avançar com a universalização do pagamento eletrônico das passagens: 89,4% dos sistemas avaliados já têm a tecnologia de alguma forma acessível à operação. Mas para se ter ideia do quanto a mudança é complicada, menos de 20% dos sistemas, que eliminaram totalmente o posto de cobrador, conseguiram extinguir o pagamento da tarifa com dinheiro em espécie.
A própria entidade, que representa nacionalmente as empresas de ônibus no País, a NTU, alerta que o processo exige discussão com a sociedade, investimento em tecnologia e planejamento para executar as mudanças para conseguir que a mudança seja implementada de forma gradual e trazendo benefícios para a operação. “Isso é fundamental. Caso contrário, comprometemos a eficiência do processo. Sendo feito da forma correta, é bom para o sistema, para o passageiro. Permite praticidade, embarque e viagens mais rápidas, além de mais seguras, porque o dinheiro deixa de circular no ônibus. Agora, não se pode retirar o cobrador sem que a rede de vendas de crédito e cartões tenha uma ampla capilaridade. Além disso, é fundamental que o percentual de pagamento em dinheiro seja muito baixo, algo próximo a 1%”, argumenta o presidente da NTU, Otávio Vieira da Cunha.
O presidente da NTU, entretanto, diz que a crise provocada pela pandemia criou uma urgência para essa modernização dos meios de pagamentos e a consequente substituição do cobrador. “São mais de R$ 9 bilhões em prejuízos acumulados desde a pandemia. São os dados que temos atualmente. Quando somamos com o transporte sobre trilhos, aumenta para quase R$ 17 bilhões. É muito. Está muito difícil operar os sistemas de transporte e a perda da ajuda federal que esperávamos receber (os R$ 4 bilhões vetados pelo presidente Jair Bolsonaro) criou um cenário ainda pior”, alerta.
PERNAMBUCO
Os empresários pernambucanos defendem a mudança. Lembram que os sistemas de transporte público de referência no mundo apontam claramente uma tendência para os meios digitais de pagamento. E que a operação sem dinheiro a bordo é uma realidade em diversas cidades no País e no mundo. “Conferem diversos benefícios ao serviço, como maior agilidade nos embarques, mais segurança para os passageiros e informações mais precisas para planejamento da operação. Os pagamentos eletrônicos também permitem a integração temporal e intermodal e o sistema está preparado para mais flexibilizações no serviço, uma demanda dos nossos clientes já indicada em pesquisas”, argumenta Marcelo Bandeira, diretor de Inovação da Urbana-PE.
O diretor afirma esperar ter 100% dos pagamentos de forma digital em, no máximo, dois anos. “Já contamos com uma das maiores redes de venda de créditos eletrônicos de transporte do país, com mais de quatro mil pontos na RMR, aplicativos para celular, site, terminais de autoatendimento e equipes volantes de venda. Temos adotado estratégias e avaliado alternativas para ampliação dos pagamentos eletrônicos, possibilitando a substituição do dinheiro não apenas pelo cartão de passagens, como também pelos cartões de débito e crédito, QRcode e carteiras virtuais”, promete.