A decisão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de manter a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) no programa de privatizações do governo federal, enquanto retirou outras sete empresas públicas, foi recebida como um golpe certeiro para o futuro do Metrô do Recife.
A leitura que metroviários, especialistas em transporte metroferroviário e gestores públicos estão fazendo é que, pelo menos por enquanto, a sinalização é de que a privatização do Metrô do Recife não foi engavetada pela União, como se esperava e o presidente Lula deu a entender na campanha presidencial de 2022.
E, por isso, poderá estar mais perto do que se imagina. O entendimento é que, mesmo podendo vir a retirar a CBTU do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) e do Programa Nacional de Desestatização (PND) por decreto presidencial a qualquer momento, a permanência é um claro sinal de que o governo federal vai seguir com a concessão pública.
Para quem não sabe, o Metrô de Belo Horizonte (MG), que também era gerido pela CBTU junto com os sistemas do Recife, João Pessoa (PB), Maceió (AL) e Natal (RN), foi concedido à iniciativa privada no finzinho do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em dezembro de 2022. Foi a gestão de Bolsonaro, inclusive, que incluiu a CBTU no PND.
E o Metrô do Recife tem um estudo de concessão pública que previa um pacote no valor de R$ 8,4 bilhões em 30 anos. Desse total, R$ 3,8 bilhões seriam aportes públicos para reerguer o sistema e cobrir a diferença entre receita tarifária e despesa de operação.
SETE EMPRESAS PÚBLICAS EXCLUÍDAS DO PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO
Na quinta-feira (6/4), em pleno feriadão da Semana Santa, o governo federal publicou um decreto retirando sete empresas públicas do programa de desestatização.
Entre elas, os Correios e a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação). As duas fazem parte de um pacote de mais oito excluídas dos programas de PPI e PND. A lista foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União, na quinta-feira.
As medidas já eram esperadas porque, após sua eleição, Lula já havia afirmado em discurso que as privatizações iriam acabar no País. O anúncio, inclusive, provocou reação no mercado financeiro na ocasião. Mas, mesmo assim, a CBTU permaneceu.
“De fato, é um sinal de que o governo federal vai seguir com a concessão pública mesmo. Ainda mais sabendo que existe interesse do setor privado para assumir o metrô. Estamos falando de um investimento superior a R$ 2 bilhões só para atualizar o sistema. Fora o que vai ter que ser destinado para manter a boa operação”, analisa um especialista em anonimato.
“Esse é o problema porque o governo federal não diz nada, absolutamente nada. Nem sobre a privatização nem sobre a situação do sistema. O Metrô do Recife segue na mesma situação difícil do ano passado. Sem recursos para investimento, com valores insuficientes para o orçamento e, o que é pior, sem um planejamento estratégico. O último que tivemos foi para os anos de 2015 a 2019”, critica um metroviário.
A Coluna Mobilidade não conseguiu falar com Sindicato dos Metroviários de Pernambuco (Sindmetro), entidade que, com articulações políticas, conseguiu convencer, às vésperas das Eleições 2022, o então governador de Pernambuco Paulo Câmara a engavetar a proposta de concessão do sistema construída, inclusive, com técnicos do próprio governo estadual.
COMANDO DO METRÔ DO RECIFE SERIA INTERINO
Nos bastidores comenta-se, inclusive, que a permanência da CBTU no PND é reflexo da disputa política que está sendo travada no governo federal entre os que defendem a continuidade do processo de privatização e os que são contrários.
“De fato, há visões distintas no governo federal sobre a manutenção ou não da CBTU no PND. Até mesmo a concessão do Metrô de Belo Horizonte gerou divergências. A questão é que não se sabe se a União conseguiria investir mais no metrô”, afirma um gestor público.
Reflexo dessa indecisão do governo do presidente Lula seria a indicação do novo superintendente do Metrô do Recife, feita em março. Segundo informações extraoficiais, o eletrotécnico Dorival Martins estaria apenas interinamente no cargo, até que as arrumações políticas sejam feitas em Brasília.
Dependendo da decisão que venha a ser tomada, o metrô seria repassado a um grupo político ou a outro. Se a União decidir que vai tirar a CBTU do PND, a presidência poderia ir para o grupo do senador Humberto Costa (PT), por exemplo, que está pleiteando o cargo para o seu assessor parlamentar e ex-vereador do Recife, Dilson Peixoto (PT).
“Mas, caso a decisão seja por manter a concessão, iriam escolher um partido que topasse tocar o projeto, coisa que o grupo de Humberto Costa não aceitaria. É tudo uma arranjo político”, reforça outro gestor público.
VEJA A LISTA DE EMPRESAS QUE DEIXARAM O PROGRAMA DE PRIVATIZAÇÃO
"Ficam excluídos do PND e revogadas as qualificações no PPI", segundo o DOU
ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos)
EBC (Empresa Brasileira de Comunicação)
Dataprev (Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência)
Nuclep (Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A)
Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados)
ABGF (Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias S.A.)
Ceitec (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A).
"Ficam revogadas as qualificações no PPI", segundo o DOU
Armazéns e imóveis da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento)
Telebras (Telecomunicações Brasileira S.A)
PPSA (Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A. - Pré-Sal Petróleo S.A )
METRÔ DO RECIFE TEM UM DÉFICIT ANUAL DE R$ 300 MILHÕES
O Metrô do Recife é, atualmente, um sistema abandonado, sem recursos sequer para garantir uma boa operação diária. Sem falar em investimentos, que inexistem há pelo menos cinco anos. O déficit de custeio anual é de R$ 300 milhões.
E são muitas as consequências do abandono. Mas a principal delas é a quebra e a consequente paralisação do sistema, prejudicando os passageiros que dependem do serviço. Já foram 400 mil pessoas transportadas por dia, nas duas linhas principais do sistema: Linhas Centro e Sul. Agora, são menos de 200 mil passageiros diários (algo próximo a 160 mil).
A crise econômica aliada ao aumento de mais de 180% no valor da passagem - que subiu de R$ 1,60 para R$ 4,25 num período inferior a dois anos - e as quebras provocadas pelo sucateamento espantaram o usuário.
Também de acordo com os dados encaminhados pela CBTU, foram nove quebras somente entre janeiro e abril de 2022. Em 2021, outras 22 paralisações. Algumas superiores a 24 horas de interrupção do sistema, o que comprova o grau de desmonte do metrô. A maioria com mais de 10h.
CONHEÇA A PROPOSTA DE CONCESSÃO PARA O METRÔ DO RECIFE
O processo de estadualização e concessão pública do Metrô do Recife seria iniciado ainda em maio de 2022. A modelagem e os valores foram apresentados ao Ministério da Economia no fim de 2021 e já tinham sido validados pela equipe técnica que está à frente dos estudos.
Futuro do Metrô do Recife é decidido. Sistema será concedido à iniciativa privada. Confira detalhes
O governo de Pernambuco seria o gestor do futuro contrato de concessão pública do Metrô do Recife, no valor de R$ 8,4 bilhões e com validade de 30 anos. Desse total, R$ 3,8 bilhões seriam aportes públicos para reerguer o sistema e cobrir a diferença entre receita tarifária e despesa de operação.
Sendo, R$ 3,1 bilhões mobilizados pelo governo federal e R$ 700 milhões pelo governo de Pernambuco. E, dos R$ 3,1 bilhões bancados pela União (Ministério da Economia), R$ 1,4 bilhão seriam recursos que ficariam guardados para serem utilizados pelo Estado ao longo do contrato de concessão pública.
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O R$ 1,4 bilhão seria a reserva para garantir o equilíbrio econômico financeiro do contrato, já que os estudos realizados em dois anos já apontaram que a receita gerada pela demanda de passageiros do Metrô do Recife não seria suficiente para cobrir o custo de operação.
O modelo a ser adotado pelo governo do Estado seria de concessão pública simples, sem contrapartida financeira ao longo do contrato.
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