TARIFA ZERO: política de inclusão social ou risco à degradação do transporte público? Leia artigo
A incorporação de conceitos como cidades de 15 minutos, requalificação das áreas centrais e tarifas flexíveis oferece perspectivas mais equitativas para a gestão municipal e metropolitana
Sob a ótica de que a melhor política de transporte público é diminuir a necessidade de deslocamentos, o artigo abaixo faz uma leitura crítica sobre o programa Tarifa Zero, que vem crescendo no País. Já são mais de 80 municípios e a expectativa é de que a maior cidade do País e uma das maiores do mundo, adote em breve em alguns horários e dias.
Como o contraditório é sempre necessário na boa discussão, a Coluna Mobilidade reproduz o artigo. Confira:
A Tarifa Zero é um verdadeiro veneno disfarçado de remédio
Por Miguel Angelo Pricinote
Fundador do Mova-se Fórum de Mobilidade
A proposta de Tarifa zero, que busca oferecer acesso gratuito ao transporte coletivo urbano, convida-nos a refletir sobre as dinâmicas urbanas brasileiras sob uma lente sociológica. As semelhanças com políticas históricas como o apartheid são inegáveis e nos levam a questionar as estruturas sociais que perpetuam a segregação espacial em nossas metrópoles.
No entanto, a política de tarifa zero para o transporte público, embora pareça ser uma medida inclusiva à primeira vista, revela-se míope e enganadora quando analisada sob a perspectiva sociológica. Ao eliminar o custo do transporte, ela não apenas promove a expansão urbana descontrolada, mas também compromete a qualidade do serviço, tornando-o progressivamente menos eficiente. Esta abordagem, ao invés de beneficiar as comunidades, acaba por afastar ainda mais a parcela vulnerável da população do acesso aos serviços básicos.
Antes de pensar em simplesmente zerar as tarifas, é pertinente explorar soluções urbanísticas alternativas, como o conceito de cidades de 15 minutos. Ao proporcionar a proximidade entre moradia e serviços essenciais, essa abordagem visa mitigar a segregação territorial ao promover a inclusão social e o acesso facilitado aos recursos urbanos. A requalificação das áreas centrais, ao invés de promover a elitização, busca revitalizar espaços urbanos de maneira inclusiva, preservando a diversidade cultural.
MENOS DESLOCAMENTOS É A SOLUÇÃO
Lembrando sempre que a melhor política de transporte é diminuir a necessidade de deslocamentos
Outro ponto a considerar são as tarifas flexíveis, uma estratégia que, ao invés de eliminar completamente os custos de transporte, permite uma adaptação conforme a renda e a necessidade. Essa abordagem busca manter a sustentabilidade do sistema de transporte coletivo, evitando a deterioração dos serviços pela sobrecarga gerada pela tarifa zero.
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É crucial reconhecer que a Tarifa Zero, por si só, não é uma panaceia e sim um grande engodo. Aumentar a demanda sem melhorar a qualidade do serviço pode resultar em condições de viagem precárias, congestionamentos e acidentes. Além disso, a medida pode conduzir à “perificação” das cidades, incentivando a ocupação em áreas distantes, mas menos atendidas pelos serviços urbanos.
ELEIÇÕES MUNICIPAIS E O USO INDEVIDO DA TARIFA ZERO
Portanto, neste período pré-eleições municipais é importante salientar que a Tarifa Zero, embora inspirada por princípios de inclusão social, demanda uma abordagem mais abrangente para enfrentar os desafios urbanos. A incorporação de conceitos como cidades de 15 minutos, requalificação das áreas centrais e tarifas flexíveis oferece perspectivas mais equitativas para a gestão municipal e metropolitana.
No entanto, é importante ressaltar que os problemas relacionados ao transporte público e à mobilidade urbana são sintomas, e não a doença em si, de um problema mais grave e crônico que é o planejamento urbano e as políticas de uso e apropriação do solo. Dessa forma, a busca por uma cidade mais humana, democrática e sustentável pode ser fortalecida, superando as limitações inerentes à proposta isolada da tarifa zero. A solução para esses desafios passa necessariamente por uma revisão das políticas de uso e apropriação do solo, visando uma distribuição mais justa e equitativa dos recursos urbanos.