TRANSPORTE PÚBLICO

Apesar da aprovação do reajuste zero, proposta do governo de Pernambuco não prevê investimentos no transporte público do Grande Recife. Esse é o perigo

Sistema de transporte não tem investimentos previstos na proposta técnica que o Estado apresentou na reunião do CSTM. Não há estimativa de renovação nem de refrigeração da frota, assim como 100% das linhas continuando a operar sem cobradores

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Roberta Soares

Publicado em 22/02/2024 às 14:03 | Atualizado em 01/03/2024 às 15:34
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Sem dúvida, como afirmou o secretário de Mobilidade e Infraestrutura de Pernambuco, Diogo Bezerra, a aprovação do Bilhete Único Metropolitano e do não aumento das passagens dos ônibus do Grande Recife nesta quinta-feira (22/2), é um momento histórico. É fato. Até mesmo os operadores, que geralmente pedem reajustes em índices bem superiores ao proposto pelo governo, votaram fechado com a proposta.

Mas, o momento não é só de comemoração. É também de alerta. É preciso estar atento para que o governo de Pernambuco não deixe de fazer investimentos no sistema de ônibus da RMR, que está muito ruim, com intervalos longos, redução de frota, operando com coletivos sem refrigeração e sem prioridade nas ruas.

Estar atento para que, com o objetivo de viabilizar as duas medidas - que têm impacto financeiro no setor e vão representar, por baixo, um custo de mais R$ 60 milhões por ano de subsídio público (somados aos R$ 250 que vêm sendo colocados ano ano no setor) - o governo deixe de viabilizar e exigir melhorias na operação.

PROPOSTA TÉCNICA DO ESTADO NÃO PREVÊ MELHORIAS

A mesma proposta oficial do governo de Pernambuco para criar o Bilhete Único Metropolitano e não reajustar as passagens prevê, inclusive, que não haja investimentos para melhorias no setor.

Você pode conferir a proposta na íntegra AQUI

Refrigeração da frota

O uso de ar-condicionado em todos os ônibus, como previsto em lei, não foi simulado no estudo. Apesar de a refrigeração da frota estar prevista na Lei 16.787/2019, que determina a renovação de parte da frota dos veículos com vida útil acima de 8 anos, para os convencionais, e 10 anos para os articulados.

“Mas a critério do CSTM, desde que prevista a meta de renovação e seus impactos financeiros nos cálculos da revisão tarifária. Diante da obrigatoriedade de se incluir os custos relativos à renovação de frota na tarifa paga pelos usuários, não se simulou nesse estudo proposta de ampliação da frota refrigerada”, diz a nota técnica.

Utilização do cobrador

Para o ano de 2024 foi mantida a operação com 100% da frota sem cobrador, como é desde 2022/2023. A redução dos cobradores, inclusive, foi incorporada ao estudo de recomposição tarifária.

Abono de dupla função validado

Foi considerado na planilha de custos o valor de R$ 135, por motorista, para que recebam o pagamento da tarifa em dinheiro nos ônibus, sob pena de multa para a empresas.

Aumento da demanda

O CTM estimou um aumento de 5% da demanda de passageiros equivalentes (pagos) de 5% de julho de 2022 a julho de 2023. Teriam sido 229,4 milhões de passageiros pagantes no ano. Atualmente a demanda está em 75% de antes da pandemia nos dias úteis.

Créditos não utilizados

De julho de 2022 a julho de 2023, o CTM identificou uma diferença de R$ 12 milhões entre a venda e o uso dos créditos eletrônicos, que desde 2020 (pela Lei 18.861/2020), deixaram de ter limite de utilização.

Por isso, estima 2,8 milhões de passageiros pagantes a mais para o ano de 2023/2024.

Redução tarifária fora-pico

Programa de redução de R$ 1,00 na tarifa fora-pico, criado pelo PSB, foi extinto e o CTM prevê tarifa única em qualquer horário do dia.

Linhas opcionais

Não sofrem alteração por enquanto até um estudo posterior.

GOVERNO RETIROU 200 ÔNIBUS DE OPERAÇÃO PARA REDUZIR CUSTOS

O alerta é válido porque, embora a gestão Raquel Lyra tenha optado por não reajustar as passagens do Grande Recife em 2023, no primeiro ano de governo - sob o argumento de que precisava, primeiro, moralizar o sistema -, o que os usuários viram no decorrer do ano foi a precarização do serviço, inclusive com a redução da frota de coletivos sem nenhum aviso prévio à população.

Foram 200 ônibus a menos considerando o início de 2023. A redução foi descoberta em agosto de 2023, mas teria sido iniciada pelo Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano (CTM) entre junho e julho. Foi feita a partir das programações de férias, quando todo passageiro sabe que há uma redução dos coletivos nas ruas. Mas, historicamente, essa redução era recomposta com o fim das férias, o que não aconteceu.

Se o comparativo for feito em relação a 2019, antes da pandemia de covid-19, eram 300 ônibus a menos, o que amplia os intervalos e faz com que os veículos circulem cada vez mais cheios, gerando ainda mais desconforto para os passageiros.

Em novembro de 2019, o sistema operava com uma frota de 2.459 coletivos no Grande Recife. Em novembro de 2022, eram 2.326. E, em agosto de 2023, estavam em operação apenas 2.132.

O CTM recompôs parte da frota e, segundo dados oficiais, atualmente são 2.375 ônibus em operação, com uma demanda de 1,3 milhão de passageiros catracados (que pagam) por dia. As gratuidades não estão incluídas.

OTIMIZAÇÃO DO SERVIÇO

A solução de redução, na época, teria sido provocada porque o Estado buscava equilibrar a conta entre receita e despesa do sistema. Essa conta não fecha desde a crise sanitária de covid-19 porque o número de passageiros segue em 75% do pré-pandemia.

O que o setor operacional definiu como redução, o governo de Pernambuco chegou a chamar de otimização do serviço, já que as empresas passaram a receber pelo custo e, não mais, pelo passageiro transportado. A mudança aconteceu em 2020, no auge da pandemia de covid-19 e para garantir que a frota de ônibus fosse bem superior à demanda de passageiros por respeito às regras sanitárias.

INVESTIMENTOS E INTEGRAÇÃO TEMPORAL

O secretário de Mobilidade e Infraestrutura de Pernambuco (Semobi), Diogo Bezerra, que também preside o CSTM, garantiu que o governo pretende, sim, fazer melhorias no sistema de transporte além de não reajustar a tarifa.

A decisão de não aumentar a passagem criou um temor no setor de que o Estado esteja fazendo “cortesia com o chapéu” do passageiro. Ou seja, ao não reequilibrar o custo e a receita, haja uma redução do serviço de ônibus nas ruas.

“Estamos trabalhando para que isso não aconteça e um dos pontos principais será a finalização da licitação das linhas de ônibus, que permitirá que os operadores que hoje são permissionários passem a ter contratos e possam, assim, fazer investimentos”, explicou o secretário.

“O corpo técnico do Estado está finalizando a revisão da rede de transporte - que deverá passar por novas mudanças com a unificação dos anéis tarifários - e acredito que até o fim do ano consigamos concluir essa análise para lançar a licitação. Enquanto isso, estamos trabalhando para, via Novo PAC, investir na infraestrutura de transporte”, afirmou.

Sobre a integração temporal, o secretário disse que somente após alguns meses da nova operação do sistema - considerando a unificação dos anéis - é que mudanças no tempo dado ao passageiro para integrar nos terminais integrados (atualmente de apenas duas horas) poderão ser pensadas.

PEDIDO POR MELHORIAS NO SISTEMA DE ÔNIBUS

Durante a reunião, a vereadora do Recife pelo PT Liana Cirne, representando a Câmara de Vereadores, destacou a Ação Popular que apresentou contra 10 empresas de ônibus da RMR e que se baseia no descumprimento da Lei 16.787 de 2019, que exige a renovação de todos os ônibus com mais de oito anos de uso, sendo 70% deles climatizados.

Os pedidos da Ação incluem a recomposição imediata da frota e a suspensão dos benefícios fiscais enquanto a lei não for cumprida. Além das empresas, a Ação também é direcionada ao Governo de Pernambuco e ao Grande Recife. A última movimentação do caso é que foi expedido uma intimação para a Procuradoria Geral do Estado, além das empresas de ônibus.

A vereadora também está protocolando ofícios solicitando promoção de ações específicas para o combate à violência e à insegurança dentro dos coletivos e ampliação do tempo máximo de utilização da integração temporal para 4 (três) horas.

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