OPINIÃO

Não há política pública no Governo Federal para acolher crianças vítimas de estupro

Caso da menina do Espírito Santo que engravidou após ser estuprada durante anos tomou conta da mídia e da opinião pública nos últimos dias

Romoaldo de Souza
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Romoaldo de Souza
Publicado em 20/08/2020 às 7:39 | Atualizado em 20/08/2020 às 7:42
AGÊNCIA BRASIL
Zero de interesse do Estado que constitucionalmente é laico, mas na prática é governado com visões religiosas - FOTO: AGÊNCIA BRASIL

Mesmo que especialistas já tenham escrito quase tudo sobre a situação de uma menina de dez anos estuprada, supostamente por um parente, mas eu gostaria de jogar luz, trazer à reflexão, dois pontos desse caso.

O primeiro deles é que foi após esse episódio da menina do interior do Espírito Santo, que o Brasil parou para se dar conta que os hospitais do país registram centenas de abortos legais anualmente, de meninas com até 14 anos, vitimadas pela violência do estupro.

E sabe qual é a política pública do governo federal para acolher esses meninas? Nenhuma. Zero de interesse do Estado que constitucionalmente é laico, mas na prática é governado com visões religiosas.

É só ler o que disse o presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) ao defender um juiz “terrivelmente evangélico” para a mais alta corte de Justiça do país: “o estado é laico, mas eu sou cristão".

Para quem tem interesse, é só dar uma espiada no Artigo 5º da Carta Magna: “VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.”

Voltando ao caso da menina estuprada no Espírito Santo, é de causar náusea a nota divulgada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O presidente da entidade, dom Walmor Oliveira de Azevedo, considerou “lamentável presenciar aqueles que representam a Lei e o Estado, com uma missão de defender a vida, decidirem pela morte de uma criança de apenas cinco meses, cuja mãe é uma menina de 10 anos. Dois crimes hediondos”.

Não senhor bispo. O que é de se lamentar é perceber que a Igreja Católica considera que uma menina que foi estuprada, violentada durante anos por um parente, supostamente alguém de sua confiança, tenha cometido crime hediondo por ter passado pelo procedimento do aborto.

Eu sinto muito que o episcopado brasileiro se esconda no biombo do Direito Canônico para condenar a menina violentada e não lhe dirija uma frase sequer de conforto, de aconchego.

Mas isso vale para a ala militante da CNBB como vale também para outras religiões e religiosos que agem cegamente em função de um dogma, de uma verdade anunciada, e se omitem para a barbárie.

Pense nisso!

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