É hora de pressionar deputados a não aprovarem anistia a partidos políticos que não cumprem regras mínimas de promoção de candidaturas femininas e negras

Leia a coluna Política em Brasília
Romoaldo de Souza
Publicado em 08/05/2023 às 20:29
ANÁLISE Sistema de cotas no Brasil ainda não surtiu efeito esperado Foto: PABLO VALADARES/CÂMARA DOS DEPUTADOS


Pode ser hoje a votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que anistia de penalidades partidos políticos que descumpriram a própria Constituição Federal e não gastaram a cota mínima de recursos do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário para promover candidaturas femininas e de pessoas negras. Ficarão isentas de “sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução e recolhimento de valores, multa ou suspensão” dos respectivos fundos, diz a proposta encabeçada pelo deputado Paulo Magalhães (PSD-BA).

Mais de 60 entidades, a maioria delas representando movimentos femininos, entregaram um manifesto ao presidente da CCJ, Rui Falcão (PT-SP), advertindo que o projeto “coloca em jogo milhões de reais de dinheiro público que foram usados indevidamente por partidos políticos, quase metade dos quais não destinaram os valores proporcionais para candidaturas de mulheres e pessoas negras nas eleições de 2022”. As mulheres representam 17,7% das cadeiras na Câmara dos Deputados. Até o ano passado, eram 15%. “Estamos tratando de dinheiro público e que a eventual aprovação dessa PEC (…) é danosa para a sociedade como um todo, principalmente para a democracia, que será extremamente lesada caso seja aprovada uma anistia que deslegitima a Constituição Federal”, resume o documento.

A poesia do escritor Eduardo Alves da Costa cabe bem nesse momento. Diz ele: “Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada (…) Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho e nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.”

Cinco deputados pernambucanos integram a CCJ. Maria Arraes (Solidariedade), Mendonça Filho (União Brasil), Renildo Calheiros (PCdoB), Silvio Costa Filho (Republicanos) e Waldemar Oliveira (Avante-PE)


UM MINISTRO TERRIVELMENTE LULISTA
O Brasil ainda se recorda da manhã de uma quarta-feira, 10 de julho de 2019. O então presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), saiu apressado do Palácio do Planalto, caminhou pouco mais de 400 metros, entrou no Senado Federal, atravessou um pequeno túnel até chegar ao Salão Negro, o mais importante do Congresso Nacional. Ali, um grupo de parlamentares realizava um culto evangélico. Bolsonaro sentou-se ao lado de políticos da bancada evangélica até chegar sua vez de fazer uma “pregação”. O presidente pega o microfone e anuncia que está para indicar um ministro para o Supremo Tribunal Federal “terrivelmente evangélico.”

”Muitos tentam nos deixar de lado dizendo que o estado é laico. O estado é laico, mas nós somos cristãos. Ou para plagiar a minha querida Damares [Alves, então ministra dos Direitos Humanos]: Nós somos terrivelmente cristãos. E esse espírito deve estar presente em todos os poderes. Por isso, o meu compromisso: poderei indicar dois ministros para o Supremo Tribunal Federal [STF]. Um deles será terrivelmente evangélico”. Foi ovacionado. Dois anos e três dias depois daquele culto, Bolsonaro indicou o pastor presbiteriano André Mendonça para a vaga de Marco Aurélio Mello.

Viramos a chave, eis que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) toma posse em 1º de janeiro deste ano. Aliás, antes mesmo da posse, Lula tinha deixado claro que o advogado Cristiano Zanin era seu nome preferido para a primeira das duas substituições que terá de fazer no STF. A aposentadoria de Ricardo Lewandowski é a oportunidade. Lula quer indicar o seu ex-advogado ao STF, e vai seguir ignorando as pressões até mesmo de petistas. A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e o ex-chefe da Casa Civil, no primeiro mandato petista, José Dirceu de Oliveira já se manifestarem contrários ao nome de Zanin para o STF.

Glesi defende, assim como Marinho, o ex-secretário-geral do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Manoel Carlos de Almeida Neto, assessor de Lewandowski. Essa corrente petista avalia que seria um gesto de agradecimento pela “lealdade” do recém aposentado Lewandowski. Ele chegou ao STF em fevereiro de 2006, no primeiro mandato do petista. José Dirceu, então capitão do time de Lula, no primeiro mandato, ainda hoje está ressabiado com a indicação do seu ex-advogado Dias Tófolli, para o STF. “Ele se voltou contra os seus”, filosofa Dirceu. Lula, pelo visto, não está preocupado nem com o que pensam seus aliados mais próximos muito menos com a oposição, no Senado, onde se dará a sabatina e a votação do indicado. Zanin será um ministro “terrivelmente lulista” diz o senador Rogério Marinho (PL-RN), ex-ministro do Desenvolvimento Regional, no governo Bolsonaro.

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