Mais de sessenta dias se passaram desde o dia em que uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) Metropolitano do Recife saiu, pelas ruas da cidade, para atender o primeiro caso suspeito de infecção pelo novo coronavírus em Pernambuco. Naquele 25 de fevereiro, uma Terça-Feira de Carnaval, as equipes do Samu já haviam recebido treinamento para atuar num cenário de crise imposta pela doença e sabiam que a pandemia não tardaria para chegar à capital pernambucana. De lá para cá, a pressão na rotina dos socorristas se multiplicou. Hoje, apenas na cidade, em comparação ao trabalho pré-covid-19, o Samu atende até 20 vezes mais chamados diários de síndrome respiratória aguda grave (srag), uma condição que pode ser provocada vírus e bactérias, além de ser caracterizada pela necessidade de internação de pacientes com febre, tosse ou dor de garganta associadas a desconforto respiratório. Todo paciente com srag atualmente é um caso suspeito de covid-19.
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“Antes da pandemia, nós fazíamos de três a cinco atendimentos por dia de srag no Recife. Agora, esse número chegou a 60 chamados diários. Pelo menos metade das ambulâncias que vemos hoje pelas ruas circula para atender uma pessoa com sintomas sugestivos do novo coronavírus”, informa o cirurgião-geral e urologista Leonardo Gomes, diretor-geral do Samu Metropolitano do Recife. Também coordenador dos Hospitais Provisórios da cidade, voltados para o enfrentamento da doença, ele traz dados para exemplificar a demanda de atendimentos do Samu durante a pandemia. Só no último dia 29, Leonardo diz que foram feitas, num plantão de 12 horas, 15 saídas com as Unidades de Suporte Avançado (USA), as chamadas unidades de terapia intensiva (UTIs). Delas, oito foram para chamados de covid-19. Além delas, naquele mesmo plantão, o Samu teve 79 saídas de Unidades de Suporte Básico (USB), voltadas para atender os casos suspeitos moderados da infecção. Desse total, 39 foram de pessoas que apresentavam sintomas sugestivos do novo coronavírus.
“Geralmente, num plantão normal, há uma média de cinco saídas de USB para uma UTI móvel. Ou seja, 80% dos atendimentos são feitos pelas ambulâncias de suporte básico e 20% pelas UTIs móveis. Em tempos de covid-19, está sendo meio a meio praticamente”, destaca Leonardo. Ele acrescenta que, em um dos plantões de 12 horas nesta semana, houve 18 saídas de UTI. “A gente nunca circulou tanto num mesmo dia.”
A demanda do Samu é reflexo da franca aceleração da curva epidêmica no Recife, que concentra mais da metade (55%) dos casos confirmados de covid-19 de Pernambuco e 44% das mortes do Estado causadas pela doença. Até ontem, a cidade totalizou 3.780 registros de pessoas que adoeceram pela infecção, sendo 1.504 casos leves da doença e 2.276 casos de srag decorrente do novo coronavírus. “E os chamados que recebemos não vêm mais de uma determinada localidade. No começo da epidemia, passamos um tempo com mais atendimentos em Boa Viagem, na Torre e em Casa Amarela (Zonas Sul, Oeste e Norte do Recife, respectivamente). Agora a gente está praticamente com toda a cidade nos demandando”, diz Leonardo.
Com as unidades de saúde superlotadas com pacientes que apresentam sintomas sugestivos de covid-19 e outros que já têm diagnóstico confirmado da doença, o trabalho do Samu se concentra no limite, assim como a capacidade das UTIs na cidade. No cenário de pandemia, nem sempre a geografia (proximidade entre o local do chamado e o serviço para onde o paciente deve ser encaminhado) é respeitada. “Não está fácil para ninguém. Posso pegar um paciente no Ibura (bairro da Zona Sul), deixar na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Nova Descoberta ou na UPA da Caxangá. Procuramos uma unidade que tem condições de atender o paciente”, destaca o diretor-geral do Samu.
Dificuldades para encontrar vagas nos serviços é uma realidade do dia a dia. “Quando falamos de sobrecarga do sistema de saúde, logicamente que não é mais tão simples pegar uma pessoa em casa e desembarcá-la na primeira UPA. Há turnos e dias da semana em que as coisas ficam mais difíceis”, acrescenta Leonardo.
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