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Estudo ajuda a entender disfunções cerebrais de pacientes com esquizofrenia

Medicamentos atualmente disponíveis no mercado agem de forma genérica no cérebro e podem causar graves efeitos colaterais

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Agência Fapesp

Publicado em 26/06/2021 às 8:00
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Luciana Constantino | Agência FAPESP – Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) fizeram um mapeamento de proteínas cerebrais com o objetivo de desvendar as bases moleculares da esquizofrenia. Os resultados do estudo, divulgado no European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, poderão orientar a busca de tratamentos mais específicos e eficazes contra a doença. Os medicamentos atualmente disponíveis no mercado agem de forma genérica no cérebro e podem causar graves efeitos colaterais.

O trabalho foi liderado pela equipe do Laboratório de Neuroproteômica do Instituto de Biologia (IB-Unicamp), que usou amostras de tecido cerebral de pacientes com a doença coletadas pós-morte. Dois tipos de células nervosas – neurônios e oligodendrócitos – foram tratados em cultura com MK-801, um medicamento que altera a função neurotransmissora do glutamato e mimetiza in vitro o que ocorre em portadores de esquizofrenia. Desse modo, o grupo conseguiu estudar os processos biológicos associados ao transtorno que são específicos de cada tipo celular.

Os neurônios tratados com a substância apresentaram estresse oxidativo (um dos fatores que podem levar à degeneração do cérebro) e apoptose (um tipo de morte celular programada). Já os oligodendrócitos, células responsáveis pela formação e manutenção da bainha de mielina (capa de gordura que facilita a transmissão dos impulsos nervosos), apresentaram diferenças associadas à síntese proteica e à organização da membrana.

“Cultivamos em laboratório oligodendrócitos e neurônios e tratamos com MK-801. Depois analisamos as proteínas do cérebro e de cada uma das células, cruzando os dados. Pudemos, assim, destrinchar quais diferenças são específicas dos neurônios, quais estão ligadas aos oligodendrócitos e as comuns a ambos os tipos celulares”, explica o professor Daniel Martins-de-Souza, orientador do trabalho e coordenador do laboratório, financiado pela FAPESP.

A doutoranda Giuliana da Silva Zuccoli, primeira autora do artigo, destaca que a potencial falta de mielina ou disfunção na formação da bainha podem estar relacionadas à disfunção cognitiva ou de memória na doença.

A mielina "encapa" o axônio – parte do neurônio, semelhante a um braço, que se liga a outro neurônio em uma sinapse. Com isso, impede a perda de energia na transmissão de impulsos de um neurônio a outro.

No ano passado, outra pesquisa conduzida no Laboratório de Neuroproteômica, com apoio da FAPESP, já havia relacionado a esquizofrenia ao distúrbio de oligodendrócitos, que acabam produzindo bainha de mielina com debilidades.

Pesquisas anteriores descreveram que cérebros de pacientes com esquizofrenia apresentam níveis anormais do neurotransmissor glutamato. Apontaram também ligação da disfunção da neurotransmissão glutamatérgica com a hipofunção do receptor NMDA (NMDAr, que é ativado pelo glutamato). A neurotransmissão glutamatérgica é essencial para cognição, aprendizagem e memória do ser humano.

“O tratamento de células neurais com MK-801 revelou que neurônios, oligodendrócitos e astrócitos são afetados, mas apresentam respostas diferentes em uma hipofunção NMDAr. A ativação de NMDAr em oligodendrócitos está envolvida com sua maturação, modulação metabólica e mielinização em torno dos axônios. Assim, compreender os efeitos da desregulação glutamatérgica em neurônios e oligodendrócitos é crucial para entender o papel dessas contrapartes celulares na esquizofrenia, especialmente no contexto hipocampal”, escrevem os pesquisadores no artigo.

E concluem: “Pudemos encontrar assinaturas proteômicas em comum entre o hipocampo e os neurônios tratados com MK-801, bem como entre o hipocampo e os oligodendrócitos tratados com MK-801”. Esses dados serão importantes para o desenvolvimento de tratamentos mais direcionados aos diferentes processos biológicos disfuncionais nas diversas células cerebrais.

O estudo foi conduzido em colaboração com o grupo do professor Helder Nakaya, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP). O apoio da FAPESP se deu por meio de seis projetos (18/14666-4, 17/25588-1, 19/00098-7, 17/50137-3, 12/19278-6 e 13/08216-2).

Casos

Considerada um transtorno mental grave e debilitante, a esquizofrenia afeta em torno de 23 milhões de pessoas no mundo, sendo 1,5 milhão de brasileiros, de acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).

É caracterizada por pensamentos ou experiências que parecem não ter contato com a realidade, fala ou comportamento desorganizado e participação reduzida nas atividades cotidianas. O tratamento envolve uma combinação de medicamentos, psicoterapia e cuidados especializados. Para detectar a esquizofrenia é realizada uma avaliação clínica.

Uma metodologia desenvolvida por pesquisadores brasileiros no ano passado se mostrou promissora na criação de um exame de sangue capaz de diagnosticar a doença. O método foi desenvolvido por grupos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Unicamp e é o primeiro capaz de diferenciar o transtorno por meio da análise de alterações bioquímicas e moleculares envolvidas nas patologias (leia mais em: agencia.fapesp.br/33824/).

O artigo Linking proteomic alterations in schizophrenia hippocampus to NMDAr hypofunction in human neurons and oligodendrocytes, dos autores Giuliana S. Zuccoli, Guilherme Reis-de-Oliveira, Bruna Garbes, Peter Falkai, Andrea Schmitt, Helder I. Nakaya e Daniel Martins-de-Souza, pode ser lido em https://link.springer.com/article/10.1007/s00406-021-01248-w.

Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

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