SÍNDROME CONGÊNITA DO ZIKA

ZIKA NA GRAVIDEZ: um terço de bebês de gestantes infectadas pelo zika tem síndrome congênita

Estudo, liderado por pesquisadores da Universidade de Pernambuco (UPE) e publicado no The Lancet Regional Health - Americas, contou com participação da Fiocruz e mais 25 instituições

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 10/12/2022 às 21:19 | Atualizado em 10/12/2022 às 21:30
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A necessidade da pesquisa surgiu após a epidemia de zika no Brasil em 2015, que levou ao nascimento de bebês com microcefalia - FOTO: EDMAR MELO/ACERVO JC IMAGEM
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Uma colaboração nacional, formada por pesquisadores da Fiocruz e de outras 25 instituições do Brasil agrupados no Consórcio Brasileiro de Coortes relacionadas ao vírus Zika (ZBC Consortium), avaliou os impactos da infecção de gestantes pelo zika vírus na saúde dos bebês.

A pesquisa conta com o apoio da London School of Hygiene & Tropical Medicine (LSHTM).

ZIKA NA GRAVIDEZ

Publicado no The Lancet Regional Health - Americas recentemente, o estudo revelou que aproximadamente um terço dos filhos de mães infectadas pelo zika, durante a gravidez, apresentaram, nos primeiros anos de vida, anormalidades relacionadas à síndrome da zika congênita

Esse é o estudo mais robusto e com maior número de crianças nascidas de gestantes infectadas pelo zika publicado até o momento.

A necessidade dessa avaliação surgiu após a epidemia de zika no Brasil em 2015, que levou ao nascimento de bebês com microcefalia.

Mas as amostras pequenas, a alta variabilidade entre as estimativas e a limitação dos dados de vigilância limitavam confiabilidade da estimativa do risco dessas manifestações que envolvem deficiências neurológicas funcionais, anormalidades de neuroimagem, alterações auditivas e visuais e microcefalia.

Essas disfunções aparecem mais frequentemente de forma isolada do que em combinação, com menos de 0,1% das crianças expostas apresentando duas delas simultaneamente. 

Os resultados foram encontrados a partir da análise combinada de dados de 13 estudos que investigam os resultados pediátricos em gestações afetadas pelo zika vírus durante a epidemia de 2015 a 2017 no Brasil.

Ao todo, participaram da pesquisa 1.548 gestantes de 13 coortes do Zika Brazilian Cohorts Consortium.

Esses dados abrangem todas as quatro regiões do Brasil afetadas pela epidemia naquele período, com infecção pré-natal confirmada em laboratório por testes genéticos e avaliação dos potenciais efeitos adversos em nível individual.

"Este trabalho dá uma contribuição fundamental para a compreensão das consequências para a saúde da infecção pelo vírus zika durante a gravidez. Ele reúne dados individuais de crianças nascidas de 1.548 gestantes residentes em diferentes regiões do País que tiveram o diagnóstico confirmado de infecção pelo zika durante a gravidez, permitindo uma estimativa mais precisa dos riscos", diz o pesquisador Ricardo Arraes de Alencar Ximenes, da Universidade de Pernambuco (UPE) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que liderou o estudo. 

"Além da contribuição em termos de conhecimento, esse estudo traduz a competência dos pesquisadores brasileiros e das instituições públicas para responder a desafios científicos", acrescenta. 

MICROCEFALIA ZIKA

Em relação à microcefalia, condição neurológica em que a cabeça do bebê é menor do que o esperado para sua idade e sexo, uma a cada 25 crianças nascidas de mães infectadas pelo vírus zika durante a gravidez apresentou a disfunção no nascimento ou durante o acompanhamento.

Na maioria dos casos, a condição era detectável próximo ao momento do nascimento, mas algumas crianças nascidas com perímetro cefálico normal desenvolveram a microcefalia nos anos seguintes.

EM QUE FASE DA GRAVIDEZ O ZIKA É PERIGOSO?

O risco de filhos de mães infectadas por zika na gestação apresentarem microcefalia foi de 2,6% no nascimento ou quando avaliados pela primeira vez, aumentando para 4% nos primeiros anos pré-escolares.

Esse risco foi relativamente consistente nos diferentes locais de estudo, sem apresentar variação relativa às condições socioeconômicas ou área geográfica.

Na Fiocruz, cinco institutos contribuíram para a pesquisa: o Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF) e o Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI), no Rio de Janeiro (RJ); o Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), em Manaus (AM); o Instituto Aggeu Magalhães (IAM/Fiocruz Pernambuco), em Recife (PE) e o Instituto Gonçalo Moniz (IGM/Fiocruz Bahia), em Salvador (BA).

A pesquisadora Flor Ernestina Martinez-Espinosa, do ILMD/Fiocruz Amazônia, é coautora sênior do estudo (ao lado de Patrícia Brasil, do INI/Fiocruz) e coordenou uma das coortes de gestantes expostas ao vírus Zika.

O projeto em Manaus ocorreu a partir de uma parceria entre a Fiocruz e a Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado (FMT-HVD), instituição de referência para doenças infecciosas e parasitárias no estado do Amazonas que sedia dois laboratórios da Fiocruz Amazônia.

"Formamos um grupo inter e multidisciplinar que acompanhou mais de 800 mulheres que procuraram a FMT-HVD por apresentar doença exantemática e por se declararem gestantes, sendo, portanto, notificadas como casos suspeitos de vírus zika na gestação", afirma Flor Ernestina. 

"Essa população fez testes para confirmar os dois eventos (gravidez e infecção por zika). Trezentos e vinte casos foram confirmados, e 760 dos casos notificados foram acompanhados até o final da gestação. Atualmente, estamos fazendo a busca ativa das crianças expostas para analisar sua situação no quinto ano de vida", complementou Flor Ernestina Martinez-Espinosa.

De acordo com o pesquisador Demócrito Miranda, da Universidade de Pernambuco, "crianças nascidas de mães infectadas devem ser submetidas a uma avaliação multidisciplinar no início da vida para diagnóstico e intervenção precoces de eventuais manifestações congênitas atribuas ao vírus zika". Ele divide a primeira autoria do artigo com o pesquisador Ricardo Ximenes.

A realização de estudos adicionais com tempo de acompanhamento mais longo é apontada pela equipe de pesquisadores como o futuro da pesquisa.

Os possíveis caminhos para investigação incluem a avaliação do risco de hospitalização e morte para crianças com microcefalia à medida que envelhecem e, naquelas sem microcefalia, averiguar os riscos de outras complicações, como aquelas ligadas ao desenvolvimento comportamental ou neuropsicomotor.

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