Mulher com superobesidade recebe balão deglutível inédito no HC e sonha com bariátrica em três anos na fila de espera

Dispositivo é ministrado pela 1ª vez no HC. Engolido sem necessidade de endoscopia e sedação, balão foi doado dentro de ações do mutirão de bariátrica

Publicado em 13/03/2025 às 18:05 | Atualizado em 13/03/2025 às 18:36
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A dona de casa Edsonia Oliveira, de 58 anos, é a primeira paciente do Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) a receber um balão gástrico deglutível para ajudar no controle da obesidade. Ela está há três anos na fila de espera do HC para cirurgia bariátrica.

No dia 23 de janeiro deste ano, ela foi internada na unidade de saúde para seguir um tratamento que proporcionasse perda de pelo menos 15% do peso e, dessa maneira, pudesse receber autorização para passar pela operação, também conhecida popularmente como redução do estômago.  

Foram 50 dias no hospital, onde ela participou de um programa interdisciplinar para eliminar os quilos necessários para passar pela bariátrica durante mutirão que começou na última segunda-feira (10) e segue até sexta-feira (14)

Ao longo desse período, o acompanhamento de Edsonia incluiu suporte nutricional, psicológico e de atividade física. Há até uma academia dentro do hospital que ela frequentou. Apesar de toda assistência, a paciente não conseguiu perder peso de forma satisfatória para a cirurgia, o que levou a equipe do HC a buscar o balão gástrico.

O dispositivo, envolvido em uma cápsula vegetal, foi engolido pela paciente, na última terça-feira (11), sem necessidade de endoscopia ou sedação. Na manhã desta quinta-feira (13), ela retornou para casa, em São Lourenço da Mata, município da Região Metropolitana do Recife.

"Fui recebida por minha família completa. Todos ficaram muito felizes com a minha volta e por eu ter conseguido o balão, que será muito importante para me preparar para a bariátrica. A minha expectativa é que daqui a quatro meses eu tenha atingido a meta de perda de peso e faça a cirurgia", contou Edsonia ao JC

Com 130,6 kg e 1,48 metros, ela tem um índice de massa corporal (IMC) de 59,6. Essa é uma taxa dentro da classificação de superobesidade (IMC acima de 50). Para os pacientes que fazem parte desse grupo, os médicos recomendam uma perda de peso antes da bariátrica. 

O processo: balão deglutível, cirurgia bariátrica e correção da hérnia abdominal volumosa

No caso de Edsonia, há um fator que exige ainda mais o controle da obesidade. Ela tem uma hérnia abdominal que precisa ser corrigida cirurgicamente. Mas essa operação só poderá ser feita com a perda de peso após a bariátrica, a fim de evitar complicações. A paciente também tem hipertensão e um quadro de pré-diabetes. 

"É uma paciente que tem uma hérnia abdominal volumosa, além da superobesidade. Só que não dá para fazer as duas cirurgias (hérnia e bariátrica) ao mesmo tempo. Se tentarmos corrigir a hérnia com esse peso que ela está, o risco de complicações é muito grande. Mas também não dá para ela fazer a bariátrica sem eliminar peso", explica a médica Luciana Siqueira, vice-coordenadora do Programa de Residência de Cirurgia Bariátrica do HC e responsável pela colocação do balão na paciente.

"Como ela teve uma perda insatisfatória no programa hospitalar, a gente foi atrás da doação do balão, que foi colocado na terça-feira. Com a perda de peso esperada, a gente conseguirá fazer a bariátrica dela e depois corrige a hérnia."

Atualmente, o balão deglutível só é ministrado no sistema privado. Não há cobertura por planos de saúde. O custo estimado para o tratamento é de aproximadamente R$ 18 mil.

Quem pode fazer o tratamento da obesidade com o balão deglutível?

O dispositivo é indicado para quem tem sobrepeso ou obesidade grau 1 (classificação de peso corporal que se dá quando o IMC está entre 30 e 34.9), mas também para quem tem superobesidade, precisa perder peso antes da cirurgia e, dessa maneira, reduzir as complicações no trans e no pós-operatório.

Após ingerir o balão, o paciente é submetido a um raio-x para o médico verificar se está na posição indicada para ser inflado. Em cinco meses, o balão é digerido e sai normalmente pelo trânsito intestinal.

"Assim que Edsonia perder 15% do peso inicial, conseguiremos operar com a técnica sleeve, em que 80% do estômago são removidos, e o intestino fica intacto. É feito um grampeamento no sentido vertical do órgão, a partir do antro, como chamamos a porção inferior do estômago, e sigo até o fundo, nome dado à porção superior do estômago", diz Luciana Siqueira.

Complexidade no tratamento da superobesidade

A médica expressa a complexidade e os desafios enfrentados pelos pacientes com superobesidade no acesso ao tratamento adequado, especialmente na rede pública. Ela destaca o sofrimento dessas pessoas não apenas pelas dificuldades físicas da condição, mas também pelos obstáculos no sistema de saúde.

Além de precisarem seguir as exigências normais do pré-operatório, esses casos demandam uma perda de peso prévia e disponibilidade de leitos de terapia intensiva (UTI), o que se torna um entrave devido à limitação de recursos. 

"Os pacientes com superobesidade têm uma carga de sofrimento surreal. São casos em que já há uma dificuldade maior, porque são necessários várias coisas, além de todo o pré-operatório, toda a avaliação dos especialistas, precisa de uma perda de peso, precisa de vaga de UTI (terapia intensiva) para fazer o acompanhamento no pós-operatório imediato. Nós temos restrições de leitos de UTI", afirma Luciana, ao ressaltar que existe toda uma dificuldade para que esses pacientes consigam efetivamente ser operados.

Com esse depoimento, a médica evidencia a vulnerabilidade desses pacientes, assim como a urgência de soluções para facilitar o acesso à cirurgia bariátrica e ao tratamento adequado. "Com a doação do balão deglutível, que é um dispositivo caríssimo e nem é coberto pelo plano de saúde, conseguimos oferecer à paciente uma esperança de que ela pode perder peso, associado também à dieta. O balão é mais uma ferramenta para proporcionar a bariátrica."

Assim, Luciana expressa felicidade com a doação do balão para Edsonia, além do impacto positivo na esperança e no tratamento. "É como se a gente desse uma nova esperança para que ela siga o fluxo da vida dela, de ter obesidade sob controle, de conseguir corrigir essa hérnia que ela tem na parede abdominal. De verdade, estamos bem felizes. Tenho certeza que ela vai seguir bem direitinho todo o processo."

A médica espera ainda mais doações de balão para ajudar mais pacientes com superobesidade. "Seria dar celeridade à bariátrica para os nossos pacientes que estão aí, estagnados na fila de espera, principalmente os pacientes com obesidade muito grave", salienta Luciana Siqueira. 

Veja como funciona o balão gástrico deglutível para perda de peso:

  • O balão é colocado na cápsula e engolido. Não requer cirurgia, endoscopia ou sedação.
  • Após ser engolido, o balão é preenchido com uma solução salina através de um tubo fino e, dessa maneira, ocupa parte do estômago.
  • Com o balão inflado, há uma maior sensação de saciedade, o que ajuda a reduzir a ingestão de alimentos.
  • Não é necessário realizar a remoção do balão. Em cinco meses, o dispositivo é digerido e sai espontaneamente pelo trânsito intestinal.
  • O método pode ajudar o paciente a perder em torno de 15% do peso corporal, a seguir com mudanças na alimentação e no estilo de vida.

Assista a videocast sobre obesidade e cirurgia bariátrica: 

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