A conduta do juiz que acusou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de ter relativizado o furto de celulares no país será investigada. A decisão unânime foi tomada pelo plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O procedimento administrativo disciplinar (PAD) foi instaurado em desfavor do magistrado José Gilberto Alves Braga Júnior, que é lotado no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Em julho deste ano, ele fez a acusação contra Lula em uma sentença após uma audiência de custódia realizada no plantão judicial.
"De mais a mais, deixo aqui ressaltado que não importa se o furto foi de um celular ou outro objeto de maior valor. Acresça-se que talvez o furto de um celular tenha se tornado prática corriqueira na capital, até porque relativizada essa conduta por quem exerce o cargo atual de presidente da República, mas para quem vive nesta comarca, crime é crime, e não se pode considerar como normal e aceitável a conduta de alguém que subtrai o que pertence a outrem", escreveu o magistrado na sentença que converteu uma prisão em flagrante em preventiva.
A afirmação atribuída a Lula tem origem em uma fake news disseminada durante o processo eleitoral de 2022, em que duas declarações em vídeo do então candidato foram editadas para distorcer o sentido.
"A polarização e radicalização política do país elevou a um certo déficit de civilidade no vocabulário das pessoas se sentirem à vontade de dizerem qualquer coisa, em qualquer lugar, para os dois lados", afirmou o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, ao proferir a decisão na tarde da última terça-feira (14), durante a 17ª Sessão Ordinária.
PEDIDO DA AGU
O plenário decidiu pela abertura do PAD atendendo solicitação da Advocacia Geral da União (AGU), que protocolou reclamação disciplinar contra o magistrado.
De acordo com a AGU, o magistrado teria imputado a Lula a conduta de relativizar a ação delitiva de subtração de telefone celular, crime tipificado no art. 155 do Código Penal, descumprindo os deveres de diligência, prudência, imparcialidade, decoro, integridade profissional e pessoal.
VOTO DO RELATOR
A decisão do colegiado seguiu voto do relator, o ministro Luis Felipe Salomão. No voto, o corregedor fez referência, especialmente, à expressão usada pelo juiz "até porque relativizada essa conduta por quem exerce o cargo de presidente da República".
Para o ministro, a referência foi desnecessária para fundamentar a decisão na audiência de custódia. Segundo destacou, o comportamento fere o artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) em seus incisos 1º e 4º bem como os artigos 1º, 2º, 8º, 13º, 25º e 29º do Código de Ética da Magistratura Nacional.
"Objetivamente, não se há de falar que não houve ofensa ao presidente da República, porque foi disparada a reclamação (disciplinar) a partir dos fatos que foram desencadeados pela fala e pela decisão do juiz", apontou o corregedor.
"De modo que eu reputo que é um tanto didático esse caso. Porque no contexto de uma audiência de custódia, seja com base em fake news, seja com base em notícia verdadeira, o que tem a ver o presidente da República com a audiência de custódia do furto de um celular?”, questionou.