MPPE aponta falhas e omissões em investigação de PMs do Bope que mataram homens no Recife

Em manifestação à Justiça, promotores destacaram que delegado da Polícia Civil e peritos não apresentaram todas as provas solicitadas

Publicado em 03/07/2024 às 11:16

Em manifestação à Justiça, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) teceu duras críticas ao inquérito que apurou a ação de policiais militares do Batalhão de Operações Especiais (Bope) que resultou nas mortes de dois homens na comunidade do Detran, na Iputinga, Zona Oeste do Recife. O caso teve repercussão nacional. 

No documento de 24 páginas, entregue na última segunda-feira (1º), os promotores que acompanham o processo contra os seis PMs acusados de homicídio qualificado (sem chance de defesa das vítimas) apontaram falhas e omissões na investigação conduzida no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Também indicaram laudos de perícias que não foram entregues, mesmo com a solicitação do MPPE. 

Os promotores destacaram que, no dia 21 de novembro de 2023, quando o inquérito foi instaurado, entraram em contato com o delegado Roberto Lobo para apresentar requisições necessárias para a elucidação da ação do Bope. O objetivo principal era esclarecer se as mortes ocorreram por legítima defesa ou não. 

"Dentre as diligências necessárias que não foram observadas pela autoridade policial, vê-se como necessária e ainda exigível ao Estado, agora sob o controle do Poder Judiciário: coleta de informações a respeito dos percursos realizados pelas viaturas envolvidas na ocorrência, identificação de todos os seus integrantes e obtenção dos registros das comunicações realizadas via rádio e CIODS, entre outras elencadas no requisitório", pontuou o MPPE. 

O documento destacou que foi requisitada "a conclusão e juntada de perícias tanatoscópicas realizadas nas vítimas, com exame detalhado externo e interno e fotos, inclusive em tendo havido localização e apreensão de projétil encontrado em algum dos corpos, que seja feita perícia de comparação balística em relação às arma utilizadas pelos policiais envolvidos na ocorrência". Mas a resposta não foi apresentada.

O MPPE afirmou ainda que os percursos das viaturas e os diálogos dos integrantes da ação policial não constavam no inquérito. 

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Uma câmera de segurança filmou o momento em que policiais do Bope invadiram a residência onde estavam Bruno Henrique Vicente da Silva, de 28 anos, e Rhaldney Fernandes da Silva Caluete, 32. Em depoimento, testemunhas contaram que os PMs obrigaram as mulheres e crianças a saírem do local. Os tiros foram ouvidos em seguida. Por fim, os corpos dos dois homens foram retirados enrolados em lençóis. 

Logo após as mortes, nove militares do Bope se apresentaram na sede do DHPP, no bairro do Cordeiro, e relataram que os homens foram mortos porque teriam reagido à abordagem.

Mas, após as investigações, o MPPE decidiu denunciar por homicídio qualificado seis PMs que entraram no imóvel e teriam atirado nas vítimas. Pontuou ainda que os militares teriam alterado a cena do crime para dificultar o trabalho dos investigadores. Além disso, teriam forjado socorro às vítimas, que já estavam mortas - como atestaram os médicos de plantão na UPA da Caxangá.

Na nova manifestação à Justiça, críticas em relação às lacunas na investigação também foram feitas no âmbito das perícias.

"Projéteis localizados no abdome da vítima Bruno Henrique deixaram de ser recuperados, sob a alegação de dificuldades técnicas; as lesões não tiveram suas dimensões registradas pelo perito oficial, registros de constatação de escoriações foram feitos sem outras anotações técnicas pertinentes. (...) Ao responder a quesitos complementares, o Sr. perito oficial sequer apresentou mapa dos corpos com os respectivos trajetos. Muito embora tenha indicado os orifícios de entrada e saída e respectivas correspondências, em um dos laudos essa informação se mostra insuficiente quando apontada uma mesma região como sede de orifícios de saída", disse o MPPE. 

EXAME DE PÓLVORA NAS MÃOS DAS VÍTIMAS NÃO FOI FEITO

O grupo de promotores questionou também a forma como a investigação da Polícia Civil foi conduzida para apurar a ação dos PMs do Bope nas mortes. 

"A investigação não deveria ter como foco antecedentes e condutas ilícitas das vítimas, posto que mortas, e sim a legalidade ou não da conduta dos policiais. Porém, diante da alegação dos policiais militares de que as vítimas realizaram disparos de arma de fogo e até apresentaram munições deflagradas, a nosso ver, revela-se pertinente que as autoridades investigativas requisitassem a coleta de material para realização de perícia residuográfica nas vítimas, prova cujo resultado deveria ser examinado em conjunto com outras provas", ressaltou o documento do MPPE. 

"Noutro viés, sustentado o argumento pelos policiais militares de que as vítimas se dedicavam a práticas de traficância, as autoridades investigativas não providenciaram a realização de perícia nos aparelhos celulares apresentados pelos policiais militares, ora acusados, nem mesmo no aparelho registrado em nome da vítima Rhaldney. (...) Ademais, não foram ouvidas testemunhas moradoras da vizinhança, inclusive da residência onde se alega ter ocorrido a apreensão de substância entorpecente e outros objetos no telhado da residência."

O MPPE destacou que Rhaldney possuía antecedentes criminais por receptação. Bruno tinha certidão negativa. 

MPPE TEVE CONCLUSÃO CONTRÁRIA À POLÍCIA CIVIL

Na manifestação à Justiça, o MPPE pontuou que, apesar de a Polícia Civil concluir no inquérito que houve legítima defesa, as provas demonstram o contrário. Ainda assim, outras 

"Forçoso o reconhecimento de que as investigações foram conduzidas e concluídas sem exaurimento de diligências e com pendência de juntadas de dados requeridos, com omissões do agente público do órgão técnico científico que, a nosso ver, podem ser vistas como ações que trazem dificuldades ao pleno esclarecimento da verdade e que indicam a necessidade de providências pelos Órgãos do Sistema de Justiça, e com o Ministério Público dirigindo seus requerimentos à Justiça, para a adoção de medidas existentes no ordenamento jurídico para assegurar a elucidação dos fatos", declarou o MPPE. 

Apesar da repercussão, a Polícia Civil nunca autorizou entrevistas sobre a investigação do caso. 

PROMOTORES PEDEM QUE PRISÃO DE POLICIAIS SEJA MANTIDA

Os promotores também pediram à Justiça a manutenção das prisões preventivas dos policiais militares Carlos Alberto de Amorim Júnior, Ítalo José de Lucena Souza, Josias Andrade Silva Júnior, Brunno Matteus Berto Lacerda, Rafael de Alencar Sampaio e Lucas de Almeida Freire Albuquerque Oliveira. Todos estão no Centro de Reeducação da Polícia Militar (Creed), em Abreu e Lima. 

O MPPE ressaltou, na manifestação, que as prisões são necessárias enquanto a ação penal estiver em curso, visto que testemunhas ainda serão ouvidas na fase de audiência de instrução e julgamento dos réus. Ainda não há data marcada pela Justiça. 

Recentemente, os desembargadores da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) também decidiram negar o pedido de liberdade provisória para os PMs

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