TJPE rejeita novo recurso e mantém júri popular de acusados de matar estudante em protesto
Após 7 anos, um ex-oficial da PM e um soldado réus pelo homicídio de Edvaldo da Silva Alves, de 19 anos, não foram julgados. Seguem em liberdade
O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) rejeitou um novo recurso e manteve a decisão de levar a júri popular um ex-oficial da Polícia Militar e um soldado acusados pela morte de Edvaldo da Silva Alves, de 19 anos. O estudante foi atingido com um tiro de elastômero (bala de borracha) durante protesto que cobrava mais segurança para o município de Itambé, na Mata Norte, em 2017.
Em junho deste ano, por unanimidade, os desembargadores da 3ª Câmara Criminal do TJPE negaram provimento aos recursos da defesa e decidiram que os PMs deveriam ir à júri popular. Mas os advogados apresentaram embargos de declaração, afirmando que houve "existência de nulidade absoluta do processo".
A defesa apontou que, quando houve a migração do processo físico para a versão eletrônica, "não houve a devida intimação do processo para o PJe (Processo Judicial eletrônico) e "tampouco intimação para o julgamento do recurso em sentido estrito interposto (ocorrido em junho), impossibilitando, assim a defesa de acompanhar o julgamento e optar por defender sua tese oralmente".
A defesa solicitou que o tribunal reconhecesse a "a nulidade absoluta de todos os atos do processo desde a sua migração".
Nas contrarrazões, a Procuradoria de Justiça deu parecer contrário, por entender que a defesa dos réus não apresentou qualquer requerimento de sustentação oral para o julgamento ocorrido em junho.
Além disso, pontuou que não houve nulidade processual por ausência de intimação da defesa técnica para o julgamento do recurso interposto se não houve pedido expresso de sustentação oral.
Em seu voto, o desembargador Eudes dos Prazeres França, relator do caso, afirmou que "não há o menor fundamento na insatisfação do embargante".
"Não há nulidade processual quando não há comprovação de prejuízo à parte. A migração para o formato eletrônico não foi acompanhada de intimação, mas o embargante não demonstrou ter havido supressão de qualquer documento ou petição relevante que deixou de ser incluído ou que houve prejuízo à defesa", citou.
"A ausência de pedido expresso de sustentação oral pelo defensor no momento adequado também afasta a alegação de nulidade, visto que não houve violação ao direito de defesa", argumentou.
Novamente, por unanimidade, a 3ª Câmara Criminal do TJPE rejeitou os embargos de declaração. A decisão foi publicada na última quinta-feira (12).
A defesa ainda pode recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar impedir que ocorra o júri popular - ainda sem data.
MORTE DO ESTUDANTE EM PROTESTO
Edvaldo fazia parte de um grupo de moradores que protestava na rodovia PE-75 para cobrar mais segurança, na tarde de 18 de março de 2017. Quatro policiais militares chegaram e, na tentativa de acabar com a mobilização, um deles recebeu a ordem para disparar o tiro, que atingiu uma perna do estudante.
Um vídeo gravado no local mostrou o momento em que o comandante da operação, o então capitão Ramon Tadeu Silva Cazé, apontou para a vítima e disse: "É esse aqui que vai levar o primeiro tiro?". Em seguida ordenou que o soldado Ivaldo Batista de Souza Júnior disparasse o tiro.
Mesmo ferido, Edvaldo foi arrastado para a viatura policial. Ramon ainda foi filmado dando um tapa na vítima. Após ficar 25 dias internado na UTI, o estudante morreu no Hospital Miguel Arraes, em Paulista.
Os dois PMs viraram réus por homicídio doloso (com intenção de matar). Ao ex-capitão também foi atribuído o crime de tortura.
Os outros dois policiais que também estavam no momento foram acusados pelo crime de omissão de socorro, mas eles tiveram o processo suspenso e convertido em medidas cautelares.
Em 2019, a Justiça decidiu que os acusados pelo homicídio iriam a júri popular. A defesa recorreu da decisão e, em 2022, os recursos foram encaminhados para análise em segunda instância. Durante todo esse tempo, o processo permaneceu parado, como revelou reportagem do JC, até que em junho deste ano houve o julgamento pela 3ª Câmara Criminal do TJPE.
No âmbito administrativo, após investigação da Corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS), Ramon foi expulso da Polícia Militar de Pernambuco em dezembro de 2017. Ele recorreu ao TJPE e chegou a retornar às atividades. Mas, em maio de 2022, o processo transitou em julgado e ele, de vez, perdeu a patente.
Já o soldado Ivaldo cumpriu a punição de 30 dias de prisão militar ainda em 2017. Ele segue na corporação.
FAMÍLIA RECEBEU INDENIZAÇÃO
Meses após a morte do estudante, o governo de Pernambuco firmou um acordo de reparação - considerado inédito no Estado - com a família dele.
Na época, a Procuradoria Geral de Pernambuco afirmou que seria paga uma indenização por danos morais, além de pensão aos pais por danos materiais. Os valores não foram informados.