BBB22: Medo do cancelamento e prêmio ultrapassado deixam reality morno
Após duas edições intensas, reality enfrenta as consequências das recentes mudanças em sua fórmula
O "Big Brother Brasil" soube se atualizar e manter sua relevância nos últimos dois anos. A entrada de influenciadores digitais e pessoas públicas no grupo camarote, o contexto pandêmico e a criação rápida de narrativas envolventes conseguiram reforçar uma convergência impressionante entre a TV e o espaço digital. O "BBB", assim, vem pautando as redes sociais como nunca durante os seus meses de exibição.
Terceira edição sob esse formato, o "BBB22" começou em 17 de janeiro sob grandes expectativas. O público, contudo, vem apontando constantemente um clima "morno", "parado" ou até "entediante" no reality. Tudo pode mudar, é claro. Mas alguns aspectos sobre as próprias transformações do reality e da comunicação explicam o atual contexto da casa.
Julgamento da internet inibiu os 'brothers'?
Em primeiro lugar, existe por parte dos brothers um evidente medo do cancelamento. As edições 20 e 21 engataram muito rápido suas narrativas nas primeiras semanas. No 20, eram as "mulheres feministas" contra os "homens machistas". No 21, existiu um grande bloco contra algumas figuras mais solitárias - ora Juliette, ora Lucas Penteado. Particularmente no ano passado, toda essa intensidade teve um preço alto: a danificação da imagem de Karol Conká.
Embora hoje muitos lembrem com humor e saudosismo dos feitos da "Mamacita", que de fato movimentaram a casa, a rapper sofreu fortes consequências da grande exposição combinada à cultura do cancelamento das redes: shows desmarcados, recuo de marcas e muito ódio na internet.
Diante disso, é natural o comportamento mais contido dos participantes, por ora. O próprio público condenou o tom pesado que a última edição ganhou. Para o BBB22, resta esperar que a convivência e a própria dinâmica do jogo façam os atritos surgirem. Isso deve ocorrer naturalmente. Quem não deixou de ver o programa na década passada sabe disso.
Desinteresse pelo prêmio
Em segundo lugar vem um problema mais espinhoso. A relevância que o programa adquiriu já é incompatível com o prêmio de R$ 1,5 milhão. O último reajuste foi feito há 12 anos, mas a moeda brasileira vem se desvalorizando, o que resultou uma notável perda de poder de compra. Até a cantora Anitta levantou essa questão no Twitter, sendo apoiada por nomes como Felipe Neto.
Hoje os participantes conseguem valores muito mais significativos a longo prazo com a publicidade da influência digital. A própria Globo deve reconhecer isso ao não aumentar o valor, enquanto a receita de publicidade do programa só cresce.
Assim, tornou-se mais confortável manter uma estadia "segura" na casa e aguardar as benesses da fama na saída. Poucos querem se arriscar, já que a publicidade aqui de fora ainda exige uma imagem positiva. Se até as pessoas anônimas de casa podem ser atingidas por esse sentimento, o que falar então dos famosos?
Já vem ficando claro que o BBB22 errou na seleção de alguns membros do camarote. "Por que esse jogo aqui precisa ser um inferno pra ser interessante? Por que é que a gente não pode viver de maneira justa e legal?", questionou o ator e cantor Tiago Abravanel, sem lembrar que existe um público esperando algum entretenimento do programa. A impopularidade do brother já vem crescendo depois dessa.
O surfista Pedro Scooby, por sua vez, se tornou até alvo de brothers dentro da casa pelo seu "deboísmo". Durante a votação do primeiro paredão, mostrou desconhecimento e desinteresse em relação às dinâmicas do jogo ao perguntar se poderia votar em si mesmo. O primeiro discurso de Tadeu Schmidt deixou os brothers em alerta. "O que é que você quer? 'Quero entrar no Big Brother, é tudo que eu quero'. Sério? Aí vem para cá e não se compromete. Vem para o jogo e não quer jogar?", disse o apresentador.
Pautas sociais continuam
Apesar dos entraves citados, um aspecto positivo da transformação do BBB nos últimos anos continua forte: sua capacidade de criar discussões em torno de questões sociais. Nesse sentido, o convite feito à Linn da Quebrada foi uma boa jogada da Globo.
A emissora já sabia que a cantora, que se identifica como travesti e tem fortes posicionamentos, despertaria muitas conversas organicamente. Para além da simples presença, sua comunicação eloquente tem feito os espectadores, dos mais aficionados ao “sofá” (aqueles que vêem apenas a edição), refletirem.
Nessa primeira semana, o uso constante do vocativo masculino para se referir à artista fez barulho aqui fora. Tadeu Schmidt precisou intervir e, durante um ao vivo, a perguntou como ela desejava ser chamada.
É uma boa mudança na condução geral do reality, visto que, até 2018, Tiago Leifert chegou até a dizer que "representatividade não leva a nada". Talvez leve, sim. A mudança não ocorre à toa: é se atualizando que o reality continuará sendo relevante.