"Então que qual puxar um samba [...] depois de tanta mutreta/ Depois de tanta cascata/ Depois de tanta derrota/ Depois de tanta demência?", canta Chico Buarque em "Que Tal um Samba?", seu lançamento mais recente. A música que também dá nome à sua atual turnê com Mônica Salmaso, que chega ao Recife neste final de semana.
Mostrando que a verve política do cantor continua, a música fala sobre um recomeço após anos de "baixo astral, pandemia, abandono e tragédia política", como consta no texto de divulgação.
É nesse clima de retomada que o Buarque retorna à capital pernambucana, com shows realizados desta quinta-feira (8) ao sábado (9), sempre a partir das 20h, no Teatro Guararapes. A última vez que o artista esteve em Pernambuco foi em 2018, com o show "Caravanas".
"Que Tal um Samba?" traz como convidada a cantora Mônica Salmaso, que já gravou dois álbuns em homenagem às obras de Chico Buarque. A paulistana fará números solo na abertura e outros em dueto com o carioca. Com tamanho espaço, Salmaso também é protagonista ao lado de Chico nesse espetáculo.
"A obra do Chico faz parte da minha formação musical e emocional. Escutei os discos dele desde sempre, desde muito antes de supor que viraria cantora. A sua obra está na minha vida inteira", diz Mônica, em entrevista ao JC.
Ela explica que a ideia nasceu durante o período mais pesado da pandemia, quando Chico topou participar de um projeto seu, intitulado "Ô de Casas". "Ali a gente se divertiu, ele confiou e gostou da brincadeira. Aquele momento da pandemia, trouxe muitas dores, muitas aflições, muitas perdas, mas trouxe também importantes aprendizados, momentos de linda humanidade e presentes gigantes como este", diz a cantora.
"Este convite significa um herói reconhecendo identidade com o que faço. O que para mim quer dizer que fiz as escolhas certas até aqui. Me sinto honrada e ao mesmo tempo me sinto pronta. Percorri uma estrada até aqui que me levou a este presente”.
Com uma hora e 40 minutos de duração, o roteiro é inteiramente autoral, à exceção de citações a obras-primas de Dorival Caymmi e Baden Powell & Vinicius de Moraes. O repertório flui entre as diferentes décadas da carreira de Chico Buarque. Uma canção da safra mais recente, como "As caravanas", se liga ao clássico "Deus lhe pague" como se as duas tivessem nascido a um só tempo.
Mônica Salmaso abre o espetáculo com seis números solo, todos pinçados por ela no cancioneiro de Chico, incluindo ‘Beatriz’ e escolhas inusitadas, como ‘Todos juntos’, da trilha de ‘Os Saltimbancos’. A cantora também toca diferentes instrumentos ao longo da apresentação: kalimba, tamborim e flauta de pastoreio norueguesa.
"O Chico me disse para escolher o que eu queria fazer como abertura com total liberdade e foi gentil a ponto de dizer brincando “só me diga o que vai querer pra eu não escolher repetido (risos)", diz Mônica, sobre o repertório.
"Eu busquei escolher canções abrangentes, que contam uma história da importância da obra dele para mim em um bloco que, da melhor forma, mostrasse meu trabalho e pudesse preparar o palco para a sua chegada. Submeti minhas ideias a ele, ele gostou e, passado um tempo, chegou com a sequência à partir de sua entrada toda já desenhada."
A partir do momento que Chico entra no palco, em "O Velho Francisco", todo o repertório foi escolhido por ele. Inclui canções como "Desalento", "O Meu Guri" e "João e Maria".
"Eu acho toda a sequência do repertório, agora com uma lindíssima mudança em homenagem à Gal Costa, irretocável. Amarrado por temas fundamentais. É tudo o que precisa ser dito e sentido dentro dele. O Brasil inteiro, nossos afetos, nossos problemas, nossas dores recentes e antigas, denúncias feitas através da beleza e da poesia. Tudo com inteligência, qualidade e extrema beleza".
Os shows de Chico Buarque, ícone da esquerda desde o regime militar, ficaram ainda mais repletos de manifestações nos últimos anos de acirramento das forças políticas. Mônica Salmaso cometa sobre como a turnê, assim como o single, estão alinhados com o atual momento:
"Estamos saindo de uma experiência de guerra - é como eu sinto o deslocamento provocado pela pandemia - e por quatro anos de uma política desumana, truculenta, repleta de ignorância e desastrosa."
"Esta turnê tem o significado de nos trazer de volta para casa. Para uma identidade atropelada pelos últimos acontecimentos. É uma apoteose de afeto e de identidade. Essa é a característica mais importante deste show, na minha opinião. Foi extremamente potente antes das eleições e agora tem sido uma comoção coletiva. Saio emocionada do palco e muito grata”, finaliza.
SERVIÇO
Turnê "Que tal um samba?", de Chico Buarque
Quando: 8, 9 e 10 de dezembro, a partir das 20h
Onde: Teatro Guararapes (Av. Professor Andrade Bezerra, s/n, Salgadinho – Olinda)
Quanto: R$ 480 e R$ 240 (meia), à venda na Bilheteria Virtual.