Bar com 'letreiro do São Luiz' movimenta Centro do Recife com cinema; conheça o Super 8

Iniciativa já realizou quase 90 sessões, com mais de 400 títulos, atraindo realizadores como Lírio Ferreira, Cláudio Assis e Kátia Mesel

Publicado em 18/10/2024 às 13:19 | Atualizado em 18/10/2024 às 14:38

Um bar com fachada que faz alusão ao icônico letreiro do Cinema São Luiz tem despertado a curiosidade de quem passa pela Rua Mamede Simões, um dos points da boemia no Centro do Recife. Mais do que isso: o Bar Super 8 tem atraído diretores conhecidos, cinéfilos e curiosos para exibições, revivendo uma tradição de cine clubismo que tanto marcou a capital no passado.

Com nome que faz alusão ao movimento de diretores que usavam câmeras amadoras, nos anos 1970, o estabelecimento nasceu em agosto de 2022, fruto da iniciativa de Vinicius Costa. Já foram realizadas quase 90 sessões, com mais de 400 títulos, dando oportunidade para novos realizadores e instigando conversas na rua do Centro, área tão esvaziada, com um sofá colocado na parte externa.

Por lá, já passaram nomes como Lírio Ferreira, Cláudio Assis, Lula Gonzaga, Katia Mesel, Adelina Pontual, Daniel Bandeira e Paulo Cunha. A iniciativa também recebeu um "Voto de Aplauso" na Câmara do Recife, por iniciativa de Cida Pedrosa (PCdoB).

"O letreiro tem uma magia: ele é analógico e dá a possibilidade de trocar as palavras. A ideia era colocar o nome dos cineastas nele e isso traz uma questão simbólica, afetiva. Hoje temos a tradição de fazer a troca das letras enquanto as pessoas estão bebendo, e vejo que é uma experiência emocionante quando os realizadores e realizadoras olham o nome dos seus filmes ou mostras, um sentimento de valorização que não é comum para quem faz cinema independente", diz Vinicius Costa, ao JC.

Início

ROBERT JAFFIER/DIVULHAÇÃO
Público assiste exibição no Bar Super 8, no Recife - ROBERT JAFFIER/DIVULHAÇÃO

No começo, em 2022, o local não tinha o icônico letreiro, nem uma tela de exibição posicionada para a rua, como atualmente, o que dificultava a atração de pessoas para as sessões.

"O início do bar foi bem promissor no sentido financeiro. As contas estavam equacionadas porque a rua tinha um movimento constante de frequentadores. Por outro lado, a gente tinha uma dificuldade muito grande de trazer pessoas pra exibir aqui", diz Costa, ao JC.

"Era uma proposta nova, não sei se as pessoas se sentiam confortáveis em estar num espaço que tinha o nome de Super 8. Existia uma desconfiança de saber se a ideia seguia seu propósito mesmo. Eu não estudei cinema e não sou do meio do audiovisual, era apenas um entusiasta que discutia o assunto comigo mesmo e não conhecia as pessoas."

Letreiro

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Bar Super 8, no Recife - ROBERT JAFFIER/DIVULHAÇÃO

Em 2023, o crescente declínio do comércio no Centro do Recife também impactou o Super 8, que passou a ter apenas andar, em vez de dois. Em contrapartida, o espaço viveu alguns "pontos de virada".

Na época, o filme "Retratos Fantasmas", de Kleber Mendonça Filho, estava cotado para representar o Brasil no Oscar, e entrou no catálogo na Netflix.

Vinicius Costa já tinha a ideia de colocar no bar um letreiro de cinema que fizesse alusão ao São Luiz. "Mas eu achava que poderia soar para o público como uma espécie de apropriação e recuava da ideia", explica.

"Um dia Lula Terra me convenceu com um argumento, o de que o São Luiz estava fechado e que o cinema pernambucano precisava disso. Na mesma hora, ele ligou para Kleber, que deu a autorização para exibir seu filme por causa da ideia do letreiro. Entre trancos e barrancos, deu certo", diz.

"Um dos desafios durante a sessão foi o som baixo. E mais uma vez Lula Terra resolveu o problema com uma ideia brilhante, a de comentar o filme enquanto ele era exibido. E vi que o público se emocionou, que não viu como apropriação, mas sim uma homenagem."

Cinema da periferia

Após a sessão de "Retratos Fantasmas", houve uma adaptação no ar e o telão passou a ficar de frente para a rua, o que estimulou mais a entrada do público. Um outro ponto de virada foi a chegada de Thor Neukranz, graduado em Cinema pela Universidade Federal de Pernambuco, no projeto.

"Thor é do bairro de Água Fria e deu a ideia de trazer o cinema da periferia. Ele já fazia um trabalho neste sentido e percebi que vinha coisa boa pela frente porque todas as pessoas que tinham feito propostas queriam trazer filmes de amigos ou o próprio filme. Com Thor conseguimos dar uma dinâmica e consistência de apresentações."

Thor Neukranz também deu a ideia de colocar um sofá, que antes era apenas um móvel decorativo, na rua durante os debates.

"O projeto passa pela ideia de fazer um diálogo de gerações de estilos. Quase todas as sessões, espontaneamente, juntava muita gente, que fechava a rua e participava dos debates. Ter os mestres e mestras aqui é importante, mas a presença da nova geração que não tem visibilidade e que viu aqui um espaço aberto para mostrar seu trabalho é crucial".

Diálogo com o poder público

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Gaby Esposito, Cida Pedrosa e Vinicius Costa, no Bar Super 8 - ROBERT JAFFIER/DIVULHAÇÃO

Vinicius Costa acredita que o poder público poderia facilitar a vida de projetos como esse, inclusive estimulando propostas em outros lugares.

"Trabalhar com arte é mais difícil do que num mercado tradicional, por incrível que pareça. Você não é reconhecido, não tem apoio, é autuado por qualquer coisa. Parece que a reunião dessas pessoas é um perigo. O poder público deveria fortalecer as salas de cinema tradicional porque precisamos de todos os espaços abertos", diz.

"O fundamental é o fato do cinema ser gratuito e ser aberto para a rua. Se faltasse esse ingrediente a engrenagem não ia funcionar perfeitamente como está funcionando. É o elemento que é o coração, esse é o nosso intuito. Dar visibilidade ao cinema invisível. Os espaços culturais estão se acabando. Aqui, a gente empurra o cinema e a cultura de graça, na rua e de uma forma acolhedora, com respeito com atenção, com dignidade."

Confira as próximas exibições do Super 8:

Outubro
Terça (22.10) Noite de poesia com Giuseppe e Luna Vitrolira.
Quarta (23.10) Filmes de estudantes UniAESO, UFPE e participação de cineasta francesa Camille. Filmes Chupachupa 6’+ Dix sept heure 9’ + Timeline 10’ + Invasão ou Contatos Imediatos do Terceiro Mundo (2023)
Quinta (24.10) redoma de PV FERRAZ, corpo onírico de MARINA e HIATOS de Marcela Coelho com Orun Santana
Terça (29.10) Obras da Escola do Porto Digital com prof Sandra Chacon.
Quarta 30.10 Animação pernambucana via Fê Soares
Quinta 31.10 Cynthia Falcão com seu doc Trocas Atlânticas + Nome de Batismo de Tila Chitunda + pesquisadoras

Novembro
Quarta 06.11 - Semana do Audiovisual Negro c Wandryu
Quinta 07.11 - Semana do Audiovisual Negro c Wandryu
Quarta 13.11 Filmes dente de Rita Luna, Sethico de Wagner Montenegro e videoclieps de GRAXA
Quinta 14.11 Bertrand Lira e outros diretores. Parceria com cinelimite. Filmes restaurados do super8. Onda queer paraibana dos anos 1980. Seleção exibida em diversas cidades como São Paulo e Nova Iorque
Quarta 20.11 Obras de Joelzito Araújo e participação do pesquisador Vinicius Andrade
Quinta 21.11 Homenagem ao Mundo Livre com Fred 04 e Pedro Severien. Videoclipes e doc.
Quarta 27.11 Projeto Projazzçöes c Anderson Stevens
Quinta 28.11 Marcelo Pedroso e Gabriel Mascaro. Filmes Corpo Presente + A onda traz, o vento leva + As Aventuras de Paulo Bruschy

Dezembro:
Quarta 04.12 Homenagem com filmes de Jomard Muniz de Brito participação de Petrônio
Quinta 05.12 Mombojó apresenta projeto inédito
Quarta 11.12 Paulo Bruschy + wolder walace
Quinta 12.12 Livro Germana e Ernesto Cinema Pernambucano?
Quarta 18.12 Ave Sangria
Quinta 19.12 Homenagem Junior Black

 

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