CARESTIA

Auxílio emergencial fez dinheiro chegar às mãos das pessoas e impulsionou alta dos preços

Alimentos e materiais de construção tiverem consumo aumentado durante a quarentena, o que fez preços crescerem

Marcelo Aprígio
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Marcelo Aprígio
Publicado em 11/09/2020 às 18:34 | Atualizado em 11/09/2020 às 19:50
BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
DIEESE registra aumento no preço da cesta básica. Os itens que mais subiram foi: Leite, farinha, arroz e carne. - FOTO: BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

Mesmo em meio a tantas notícias desalentadoras durante a pandemia do novo coronavírus, o período trouxe um pouco de esperança para a casa do ambulante Samuel Ferreira, de 36 anos. Casado e pai de três crianças, ele viu a renda da família mais que dobrar com o auxílio emergencial. Antes, conta Samuel, a casa contava apenas com, em média, R$ 800 mensalmente, graças aos trabalhos que realizava. Com o benefício, o valor chegou a R$ 1.800.

“Achei que finalmente poderia terminar [a construção da] minha casa, que sobraria um dinheirinho para dar na mão da minha esposa e comprar uma roupa melhor para os meninos”, conta. Porém, a disparada no preço de alimentos básicos e de materiais de construção fez ruir somente as expectativas de Carla, como também tornou o novo orçamento insuficiente para o sustento da família. “Já teve vez que cheguei no caixa do supermercado e precisei devolver algumas coisas porque o dinheiro tinha acabado”, diz ele.

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Em agosto, a inflação aumentou (0,24%) pelo terceiro mês seguido, com o maior patamar verificado para o período desde 2016. Vários produtos da cesta básica, a exemplo do arroz (19,2%), óleo (18,6%), leite (15,3%) e feijão (12,1%), tiveram elevação nos preços, deixando a conta ainda mais salgada para quem depende de salário mínimo ou programas sociais.

Só arroz, em 12 meses, acumula alta de quase 100%. Num país traumatizado com os anos de hiperinflação até 1994, qualquer menção à alta de preços faz soar alertas, seja para o orçamento das famílias, como para o Governo, que precisa tourear a situação. Supermercados do Recife, que no meio do ano passado vendiam o saco com um quilo de arroz por R$ 3,50 reais, hoje cobram até R$ 9,00 pelo pacote.

Já a disparada de preços de produtos básicos para a construção civil fez com que a inflação do segmento (o Índice Nacional da Construção Civil, ou Sinapi, do IBGE) chegasse a 0,88% em agosto, maior percentual mensal desde março de 2014 e bastante acima do percentual de julho (0,49%).

Na avaliação do economista e professor do Unit-PE Edgard Leonardo, além da pressão doméstica, há outras razões do encarecimento, como o aumento nas exportações brasileiras e a valorização do dólar ante o real. "Um dos fatores primordiais que levou ao aumento de preços de produtos básicos foi o dólar alto, o que incentiva os produtores a aumentarem as exportações, reduzindo, assim, a oferta de produtos no mercado interno”, pontua Edgard.

Ele ressalta, porém, que o benefício do governo federal também tem forte influência na elevação dos preços, pois estimulou o aumento do consumo. “Por outro lado, com o auxílio emergencial pago pelo governo desde abril, a procura por produtos como arroz, feijão, cimento e areia por quem foi beneficiado cresceu bastante, pressionando os preços”, diz ele.

O economista Rodolpho Tobler, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), tem opinião parecida com Edgard. “Os preços sobem em decorrência de uma conjunção de fatores. O principal deles é a alta do dólar que, além de encarecer os insumos industriais e agrícolas, torna o mercado externo mais atrativo”, argumenta. “Soma-se a esse fator uma redução da disponibilidade de alguns produtos dada à busca mais intensa por alimentos e itens para promover pequenas reformas em casa”, completa.

Alta de preços deve continuar

Edgard Leonardo defende que o cenário não deve mudar muito nos próximos meses. Para ele, a redução do auxílio emergencial — de R$ 600 para R$ 300 — deve afetar a demanda por móveis, eletrodomésticos e materiais de construção, mas não os alimentos, por se tratarem de itens essenciais. “Nesses últimos meses, além de consumir mais alimentos, grande parte da população foi em busca de dar um “up” na casa. Isso deve ter uma diminuída, porque com menos dinheiro do auxílio, as pessoas vão se preocupar mais com o que é essencial e não pode faltar”, afirma o economista, prevendo que a pressão sobre a cesta básica deve continuar grande e puxando os preços para cima.

Já Tobler alerta que imóveis que serão lançados ainda em planta no quarto trimestre e em 2021 devem ter valores bem mais salgados para os compradores. “Infelizmente, quem não teve ou tem a oportunidade de comprar apartamento agora será penalizado, porque as empresas serão obrigadas a repassar esse aumento de custos para os preços dos lançamentos futuros. Quem vai pagar o pato é o consumidor”, afirma ele.

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