A empresária Cristina Santos, dona da padaria Pão Massa, no Bairro da Madalena, no Recife, sabe que 2022 será mais um ano difícil. "Ainda não nos recuperamos totalmente da queda do movimento durante a pandemia. No pior momento, em 2020, o faturamento chegou a cair 80%, e mesmo agora, quase dois anos depois, estamos com cerca de 65% do movimento de antes da pandemia", diz a empresária.
Cristina cita que o cenário para o comércio foi ainda mais prejudicado com o aumento brutal nos últimos anos dos insumos fundamentais para o seu negócio: trigo, água e energia elétrica. "Tínhamos duas lojas mas tivemos que fechar uma delas. Foi a forma que encontramos para continuar", resume.
Em 2022, Cristina já começa o ano com um novo desafio, adequar o aumento de salário de seus funcionários aos custos da empresa. "No meu setor, a referência para reajuste é o percentual de aumento do salário mínimo. Este ano o índice deve ficar um pouco acima, ou seja, deve superar um pouco os 10%", diz ela que atualmente tem 20 funcionários, mas já chegou a ter 50, no período anterior a pandemia. "Em uma empresa com 10 funcionários, honrar o aumento corresponde em gastos ao salário de mais um funcionário", contabiliza.
A empresária não vê outra forma de assimilar este novo incremento nos custos que não seja repassando parte do aumento para os seus produtos. "Fizemos um ajuste nos preços em dezembro e teremos que fazer outro agora em janeiro. Mas a gente sabe que não dá para repassar tudo para o cliente então o sacrifício é feito na redução, novamente, da margem de lucro", afirma.
CORREÇÃO
Começou a valer desde o primeiro dia de 2022, o novo valor do salário mínimo no Brasil, que passou a ser de R$ 1.212. O novo valor considera a correção monetária pelo Índice Nacional de Preço ao Consumidor (INPC) de janeiro a novembro de 2021 e a projeção de inflação de dezembro de 2021, estimada pela área técnica do Ministério da Economia. No total, o aumento é de 10,18% em relação ao valor anterior, que era de R$ 1.100.
O novo mínimo altera o valor de cálculo de benefícios previdenciários, sociais e trabalhistas, assim como a o cálculo das contribuições dos trabalhadores ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que também serão reajustados.
Para o assessor econômico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Pernambuco (Fecomércio-PE), Ademilson Saraiva, apesar de o ajuste no salário mínimo ser um aumento esperado todos os anos, o impacto desta vez foi maior, sobretudo para as pequenas empresas. "O aumento de 10,18%, agora em 2022, foi praticamente o dobro do ano passado [5,22%] e o maior desde 2016. Nas pequenas empresas, e em especial para o empresário dos setores de comércio e serviços, cujo piso salarial dos seus servidores não é atrelado a negociações e acordos coletivos com sindicatos, o impacto é imediato", diz o assessor.
O economista pontua ainda que em uma conjuntura econômica melhor, o aumento seria menos expressivo. "Em um ano em que se espera, mais uma vez, um baixo crescimento da economia e receitas frustradas, o reajuste do salário mínimo representa um aumento significativo nos custos do empreendedor, o que pode implicar, inclusive, no aumento do desemprego e da informalidade", alerta Ademilson Saraiva.
MICRO E PEQUENOS
O gerente para a Região Metropolitana do Recife do Sebrae-PE, Leonardo Carolino, assinala que o microempreendedor individual (MEI), mesmo que não tenha funcionários de carteira assinada, terá ajuste na contribuição da previdência, que se baseia em 5% do valor do salário mínimo. Leonardo revela ainda que cerca de 5% dos empreendedores classificados como MEI possuem funcionários [a legislação permite ao MEI a contratação de apenas um empregado] e, neste caso, o aumento é duplo, porque atua tanto sobre a contribuição do MEI quanto na remuneração do seu funcionário. O Brasil possui 13 milhões de MEIs e Pernambuco, 412 mil. Esses números são do ano passado e representam um crescimento de 16% sobre o ano de 2020.
Para os microempresários e empresas de pequeno porte, que também possuem empregados com carteira assinada, a elevação dos custos com pessoal deve fazer parte do planejamento financeiro anual. "Aqui no Sebrae a gente explica a quem vai empreender ou contratar pela primeira vez que ele não paga ao funcionário apenas o valor do salário mínimo, tem ainda o que incide a mais". Leonardo se refere aos encargos sociais. Quando o salário era de R$ 1.100, os encargos somavam no total R$ 1.573, diz ele. "Tem a questão da previdência patronal, que é 3% sobre o salário; tem o FGTS de 8% e tem ainda os provisionamentos necessários para pagamento ao longo do ano como férias e 13o. salário, além do aviso prévio. Tudo isso representa elevação de custos para o empresário.
Para o analista do Sebrae-PE ter uma gestão eficiente do negócio, sobretudo a gestão financeira, pode fazer a diferença para manter a empresa funcionando. "A formação do preço do produto ou serviço sofrerá impacto, será preciso revisar valores para acomodar a elevação da inflação, os custos dos insumos de produção como energia e combustível, os tributos que podem incidir sobre o negócio como IPTU e IPVA, caso a empresa tenha automóveis, tudo o que teve aumento entra no novo cálculo de formação de preços, sob risco de o empresário botar um produto à venda e ter prejuízo porque não conseguiu cobrir a elevação dos seus custos", apregoa o gerente do Sebrae-PE.
CONTRIBUIÇÃO
Com o aumento do salário-mínimo para R$ 1.212, em 2022, as contribuições mensais dos microempreendedores individuais (MEI) também serão reajustadas. A partir de fevereiro de 2022, o valor referente ao INSS do Documento de Arrecadação Simplificada do MEI (DAS-MEI) será de R$ 60,60, o que corresponde a 5% do salário-mínimo. Os MEI que exercem atividades ligadas ao comércio e Indústria pagam R$ 1 a mais referente ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e os ligados ao setor de serviços, R$ 5 referentes ao ISS (Imposto sobre Serviços).
O reajuste vale apenas para os boletos que vencerão a partir do dia 20 de fevereiro. O valor a ser pago até 20 de janeiro continua sendo o de R$ 55. O gerente de políticas públicas do Sebrae, Silas Santiago, destaca que o aumento de 10,18% no valor da contribuição ocorre pois o imposto mensal pago pelos MEI é atrelado ao salário-mínimo e que, por isso, o reajuste ocorre todos os anos. “Mesmo com o aumento na contribuição mensal, ser formalizado e estar com os impostos em dia é um grande benefício para os microempreendedores individuais”, ressalta.
Por meio da contribuição, os microempreendedores individuais têm direitos previdenciários, como aposentadoria por idade, auxílio-doença, salário-maternidade, auxílio-reclusão e pensão por morte. Além disso, ao se tornar MEI, os optantes passam a ter um CNPJ, emitir notas fiscais, ter acesso às linhas de crédito e financiamentos com condições especiais. Quem não estiver com pagamento em dia, pode perder o direito aos benefícios previdenciários, como aposentadoria e licença-maternidade, e ter o CNPJ cancelado pela Receita Federal.
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