VULNERABILIDADE

Pernambuco tem uma a cada quatro crianças em extrema pobreza. É o segundo pior cenário do País

Levantamento da PUCRS com microdados provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) aponta extrema situação de vulnerabilidade no Estado. Só não pior que no Maranhão

Lucas Moraes
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Lucas Moraes
Publicado em 27/09/2022 às 12:21 | Atualizado em 27/09/2022 às 17:29
GUGA MATOS/JC IMAGEM
Em todo o Brasil, o número de crianças em situação de pobreza é recorde - FOTO: GUGA MATOS/JC IMAGEM
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Em Pernambuco nasce-se extremamente pobre. No Estado, uma a cada quatro crianças de 0 a 6 anos vivia com renda inferior a R$ 161,56 por mês em 2021. A pobreza passou a ser condição inerente ao desenvolvimento da pessoa humana, ou melhor, fator inibidor para que isso aconteça.

O dado revela uma das piores situações do País, sendo superado apenas pelo estado do Maranhão.

No cenário dramático, crianças chegam ao mundo em famílias monoparentais, sem renda ou escolaridade e, em sua maioria, são negras. Há características que distinguem os locais onde está a pobreza. São essas as pessoas que, desde pequenas, já enfrentam todo tipo de dificuldade para não se desenvolverem e, consequentemente, não serem parte integrante do desenvolvimento do País. 

Em todo o Brasil, o número de crianças em situação de pobreza é recorde. Em 2021, 44,7% das crianças viviam em situação de pobreza, e 12,7% em situação de extrema pobreza (contra taxas de 28,3% e 8,2% para população geral, respectivamente). 

A pobreza entre as crianças é a maior na faixa de 0 a 6 anos de idade desde 2012, quando foi iniciada a série histórica da PUCRS Data Social, laboratório de estudos lançado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Apenas entre 2021 e 2020, a alta foi de 8,6 pontos percentuais, quando o índice havia caído para 36,1%, em função do pagamento do auxílio emergencial naquele ano.

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Comunidade do Arco-íris, Capina do Barreto, no Recife, é retrato da pobreza - GUGA MATOS/JC IMAGEM

Em 2019, antes da pandemia, a taxa de pobreza entre as crianças de até seis anos de idade era de 41,5%.

O estudo trabalha com as linhas de US$5,50 PPC (per capita) para pobreza e US$1,90 PPC para a extrema pobreza, assim como definidas pelo Banco Mundial. Em valores mensais de 2021, a linha de pobreza é de aproximadamente R$465 per capita e a linha de extrema pobreza é de aproximadamente R$160 per capita.

Crianças que vivem em domicílios com renda per capita abaixo desses valores estão em situação de pobreza e/ou de pobreza extrema.

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EXTREMA POBREZA POR ESTADO DO BRASIL (PERCENTUAL DE CRIANÇAS 0 A 6 ANOS) - PUCRS

Em Pernambuco, especificamente, está uma das piores situações do País. Em 2021, o Estado registrou uma em cada quatro crianças com renda per capita abaixo dos R$ 160. 

No Estado, em 2019 haviam 137.385 criança na extrema pobreza. Em 2021, o número já saltou para 230.931.

Para 2021, o cenário de Pernambuco só é comparado aos do Maranhão (31%), Piauí (25%) e Bahia (25,1%), onde pelo menos 1 em cada quatros crianças estava em situação de extrema pobreza. Mesmo no cenário de pobreza, com exceção do Ceará, todos os estados do nordeste tinham mais de 60% das suas crianças classificadas como pobres. 

A extrema pobreza atingiu 26,8% dessas crianças no Estado, avançando sobre os 19% registrados no ano de 2019.

Pernambuco conseguiu avançar dez pontos percentuais em apenas um ano o número de crianças em situação de pobreza no Estado. Em 2020, eram 57,8% das crianças nessa situação. No ano passado, chegou-se a 67,4%.

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A pobreza entre as crianças é a maior na faixa de 0 a 6 anos de idade desde 2012 - GUGA MATOS/JC IMAGEM

“A exposição à pobreza monetária e às demais privações a ela associadas, nessa faixa etária que é a mais importante para o desenvolvimento das habilidades cognitivas e não cognitivas de uma pessoa, é algo grave, que traz prejuízos irreversíveis, e que comprometem não só o potencial da pessoa e de seus descendentes, mas também o potencial de desenvolvimento econômico do País”, alerta a pesquisadora do PUCRS Data Social e da Escola de Negócios da PUCRS, Izete Bagolin.

E em meio a tanta pobreza, as crianças já sofrem mais que os adultos. Para se ter uma ideia comparativa, a taxa de pobreza da população brasileira como um todo era de 28,3% em 2021, e a taxa de extrema pobreza era de 8,2%.

Entre as crianças, as cifras encontradas foram de 44,7% e 12,7%, respectivamente. Essa diferença, segundo os pesquisadores, se deve ao fato de as crianças estarem mais concentradas na base da pirâmide social.

E não são quaisquer crianças que sofrem com a pobreza e extrema pobreza. O estudo revela que em todo o País, entre as crianças negras, por exemplo, a taxa de pobreza em 2021 era de 54,3%, e a taxa de pobreza extrema ficava em 16,3%.

Já entre as crianças brancas essas cifras eram de 32,4% e 8,2%, respectivamente. Em áreas rurais, 69,7% das crianças estavam em situação de pobreza, e 26,1% em pobreza extrema. No meio urbano, no entanto, eram 40,2% e 10,4%, respectivamente.

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POBREZA POR ESTADO DO BRASIL (PERCENTUAL DE CRIANÇAS 0 A 6 ANOS) - PUCRS

O professor Andre Salata, pesquisador do PUCRS Data Social e da Escola de Humanidades da PUCRS, afirma que 64,8% das crianças de zero até seis ano de idade vivem em domicílios que estão entre os 40% mais pobres do País, e somente 4,4% moram nos domicílios que compõem o estrato dos 10% mais ricos. Ou seja, as crianças estão "sobrerepresentadas" na base da pirâmide social, ou seja, a mais crianças entre os mais pobres. 

Segundo Salata, a taxa de pobreza e extrema pobreza entre as crianças já vinha crescendo, mas a explicação para esta variação recente está no impacto da pandemia de covid-19 sobre a renda do trabalho e, também, na instabilidade das políticas de auxílios concedidos à população.

“No início de 2020 houve forte queda da renda do trabalho entre os mais pobres, e mesmo assim a taxa de pobreza infantil caiu para os menores valores da série histórica (36,1%). Isso se deve, em grande medida, ao Auxílio Emergencial, pois sem ele aquela taxa seria de aproximadamente 45,7% em 2020", aasegura.

Ele também alerta: "Ao mesmo tempo, a decisão de interromper o pagamento do Auxílio Emergencial no início de 2021, e sua posterior redução de valor e cobertura, fizeram a incidência da pobreza infantil dar um grande salto”.

O estudo também mostra que as crianças em situação de pobreza sofrem desvantagens em outras dimensões que não a monetária. Por exemplo, Entre as crianças cujas famílias estão acima da linha de pobreza, o adulto de referência tinha em média 11,9 anos de estudo.

Essa média cai para 8,8 entre as crianças cujas famílias estavam abaixo da linha de pobreza, e desce para 8,3 entre os extremamente pobres. Além disso, Entre as crianças que estão acima da linha de pobreza, 14,4% vivem em famílias monoparentais. Esse percentual sobre para 27,4% entre as crianças cujas famílias estão abaixo da linha de pobreza, e chega a 39% entre aquelas em situação de extrema pobreza.

Ou seja, há uma clara tendência de redução do nível de escolaridade na família e de ausência de um dos responsáveis para as crianças mais pobres.

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