Com uma peregrinação silenciosa e comovente em frente à curva B do estádio San Paolo de Nápoles, centenas de napolitanos se despedem nesta quinta-feira (26), com altares improvisados e lágrimas de Diego Maradona, ídolo de uma cidade que se identifica com sua vida extravagante e ao mesmo tempo trágica. O desfile, composto majoritariamente por homens, quase todos com máscara pela pandemia de coronavírus, é interrompido de vez em quando pelos aplausos e gritos de "Diego, Diego, Diego".
Os fãs transformaram o estádio em um santuário em memória do argentino. Centenas de velas, rosas azuis, fotos, lenços e camisetas foram colocadas em frente ao estádio, que foi a verdadeira casa de Maradona em Nápoles. Rosário, de 77 anos, conhecido por ser o poeta do estádio, barbeiro na juventude e que vive em frente ao San Paolo desde 1954, recita uma poesia que compôs ontem, após receber a notícia da morte de Maradona em Buenos Aires aos 60 anos, vítima de uma parada cardíaca.
"Adeus, ciao Diego", grita em lágrimas. Uma longa faixa cobre a parte externa da entrada ao estádio e diz: "Ao rei imortal, tua bandeira não deixará de balançar".
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Amor incondicional
"Não esperávamos sua morte. Nós não escolhemos o Maradona, foi ele quem escolheu Nápoles", confessa emocionado à AFP-TV Gino, de 48 anos. O amor de Nápoles ao "Pelusa", que liderou o Napoli no título do 'Calcio' em duas ocasiões, em 1987 e 1990, foi marcado por luzes e sombras, futebol e máfia.
"Sua vida privada nunca importou para nós", comentou outro admirador, Antonio, evitando falar do que fez o astro argentino fora dos gramados em sua passagem pelo Napoli de 1984 a 1991, marcada também pelas festas noturnas, confusões sentimentais e principalmente pelo seu vício na cocaína, através do qual conheceu e manteve relações com a Camorra, a máfia napolitana.
"Representei no sul uma parte da Itália que não contava", admitiu o argentino no documentário de 2008 dirigido por Emir Kustirica, exibido na noite de quarta-feira pelo canal 7 da televisão italiana. Para Il Mattino, o jornal da capital do sul da Itália, entre as cidades mais pobres da península, Nápoles é agora "o túmulo de Maradona".
Devido ao confinamento que limita as movimentações na região de Campanha, fortemente afetada pela covid-19, as autoridades impediram grandes manifestações. Apesar disso, o luto é sentido. "O Rei", o "imortal", o "Deus" será lembrado como "o eterno rebelde que trouxe felicidade e redimiu uma humanidade desesperada e sofrida", transformado hoje em um "símbolo de liberdade", como escreve o jornal de esquerda Il Manifesto.
"O último herói dos últimos", que com o futebol uniu uma cidade, pobres e ricos, agora "joga com os anjos, que o querem como capitão, para que os leve à vitória como só ele sabe fazer", disse emocionado Gianmpiero diante do estádio que levará o nome da lenda argentina.
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