Toda análise requer um recorte temporal. Ao mesmo tempo, avaliar periodicamente desempenho de governos é uma das molas mestras da democracia. Tem quem acha muito precoce dizer qualquer coisa sobre um gestor nos trinta primeiros dias do seu mandato. E, de fato, o curto prazo pode ser uma escolha ruim para se fazer críticas e prognósticos. Ainda mais quando observamos o tamanho e complexidade da máquina pública brasileira.
Ainda assim, é inevitável reconhecermos o que foi possível caminhar no primeiro mês de governo e, principalmente, que rumo vem sendo dado à gestão. Em algumas ocasiões, logo de imediato, as escolhas que o mandatário faz revelam prioridades e estratégias. O tamanho do secretariado ou a quantidade de ministérios é um exemplo de como se desenham as estruturas para responder às questões centrais que a sociedade demanda.
No âmbito federal, o terceiro governo Lula enfrentou, logo de partida, uma das maiores crises da democracia brasileira, com os ataques aos Três Poderes, no dia 8 de janeiro. Em seguida, viria à tona a crise humanitária que atinge o povo Yanomami, à qual o governo tenta responder com ações incisivas e orquestradas, com atuação de diversas pastas, porém a solução certamente não virá imediatamente, por se tratar de um problema histórico complexo.
Além de reações a essas questões, o governo apontou, em um balanço divulgado dos trinta primeiros dias, a manutenção do Bolsa Família no valor de seiscentos reais como uma das medidas exitosas, além da retomada do Fundo Amazônia, robustecido por doações milionárias de países como a Alemanha. O aumento do piso salarial dos professores também foi uma medida que certamente repercutiu positivamente na sociedade.
No entanto, a querela que o presidente Lula resolveu empunhar contra a independência do Banco Central tende a retardar avanços importantes na área econômica, que possam reverberar em melhoria imediata dos indicadores. Muitas vezes, os comportamentos dos líderes têm efeito mais decisivo do que suas próprias ações.
Na esfera estadual, a gestão Raquel Lyra viveu altos e baixos perante a opinião pública, sobretudo porque, de largada, emitiu decreto que atingiu áreas da administração estadual com rebatimento direto nos serviços prestados à população. A justificativa factível de que se tratava de um "freio de arrumação" na máquina do estado foi muitas vezes obscurecida pela visão de fragilidade de uma decisão mal formulada, vinda justamente de um governo que escolheu o caminho narrativo da técnica versus a política, sendo a primeira capaz de sanar os problemas que a segunda não dá conta de resolver.
A relação com o Poder Legislativo, nesse primeiro mês, não pareceu ser um problema para a governadora, que soube dialogar de forma positiva com os deputados. Mesmo seu partido não sendo a maior bancada da Assembleia, Lyra parece ter encontrado o ponto de equilíbrio para a relação com o Legislativo fluir. O que chama a atenção, ainda como saldo dos primeiros trinta dias, é a ausência de um eixo norteador, por onde fluem as prioridades do governo. Ao mesmo tempo em que tudo parece imprescindível, temos a impressão de que a forma para enfrentar os desafios ainda está sendo rascunhada. Talvez não haja tanta pressa, sob a máxima de que ela seria inimiga da perfeição, já que a governadora conta com apoio popular ainda em grande medida. Mas o tempo corre e, quando a vida "real" se impuser, após o período festivo do carnaval, é preciso que comecem aparecer as respostas. Em Brasília ou aqui, as promessas devem se converter em medidas factíveis, porque de discursos e promessas o povo já está farto.