Há um ditado popular que expressa a situação de quem enfrenta um dilema para se equilibrar entre dois lados antagônicos. Diz-se que essa pessoa se encontra "entre a cruz e a espada". Embora esteja com folgada distância dos seus adversários, atingindo entre 60 a 70% das intenções de voto, conforme pesquisas, o prefeito João Campos vive situação parecida nos momentos cruciais para escolha do seu companheiro de chapa.
Se escolher um vice do PT garante a hegemonia no campo da esquerda e uma possível perda dos votos da direita que foram fundamentais para sua vitória em 2020 contra a prima e então petista Marília Arraes. Se deixar os petistas de fora pode ter contra si a ruidosa militância do partido que, além de ter catapultado Marília em 2020, na eleição de 2022, voltou a se rebelar, ao lado da mesma Marília, e não se intimidou com a presença do presidente Lula quando vaiou o PSB e seu então candidato a governador, Danilo Cabral, dando coro a um movimento de renovação política que levou os socialistas a deixar o poder do estado após 16 anos de hegemonia.
- Ele tem tantos votos que possui gordura suficiente para decidir como quiser"- afirmou a este blog um deputado estadual do PSB que pediu anonimato. O parlamentar é adepto da tese de que a eleição está garantida e o prefeito precisa pensar também em 2026, quando deseja disputar o cargo de governador. Neste caso, necessita deixar o Recife nas mãos de alguém de sua inteira confiança e sem pretensões políticas, como é o caso dos dois auxiliares, Marília Dantas e Vitor Marques, que filiou ao MDB e PCdoB, e exonerou esta quinta-feira para que possam ficar aptos a entrar na disputa.
Quem trabalha com marketing político, sabe que a política não é uma ciência exata e que, no caso do Recife, mesmo quem tem altas intenções de voto, corre risco no meio do embate. Quais seriam os riscos do prefeito? Olhando a situação da capital que foi nas décadas de 60, 70 e 80, berço e suporte da esquerda, ela está cada vez mais rumando para o centro e a direita. Disso não escapou nem mesmo o presidente Lula que, idolatrado no Nordeste, e natural de Pernambuco, teve, em 2022 , 56,32% dos votos recifenses e o ex-presidente Jair Bolsonaro ficou com 43,68% ( seu maior percentual em capitais nordestinas). O presidente do PL, Anderson Ferreira, costuma lembrar que 30% dos moradores da capital são evangélicos, um dos maiores percentuais de Pernambuco.
Recentemente, em entrevista ao podcast Inteligência Limitada, João Campos afirmou que sua eleição de prefeito em 2000 deu-se no campo da centro-esquerda, deixando clara sua tendência a permanecer nessa linha. Na verdade, até hoje o PT têm um pé atrás sobre a mesma eleição de 2020 quando, para atacar Marília Arraes no segundo turno, João bateu duramente nos petistas na TV, associando-os à corrupção. Na cabeça dessas lideranças isso rememorou o que fez o ex-governador Eduardo Campos, pai de João, e o próprio PSB. Campos contrariou Lula candidatando-se a presidente da República contra Dilma Rousseff em 2014 e em 2016 o PSB votou a favor do impeachment da presidente no Congresso Nacional.
Com esse passado de embates, PT e PSB, confiam um no outro? Até as paredes do Palácio Capibaribe, onde o prefeito despacha, sabem que não. Tanto é que João não incluiu o PT em sua administração, só cedendo este ano quando nomeou dois membros do diretório do partido no Recife para as secretarias de Habitação e Saneamento, com o propósito de baixar a temperatura. Isso levou a questão da vice para a alçada do próprio presidente cujo percentual de aprovação no Recife passa dos 60% e, portanto, não é de se jogar fora.
Lula ainda não tratou do assunto com o prefeito, apesar de ter se encontrado com ele três vezes. Na primeira João teria puxado o assunto mas o presidente cortou, segundo fontes do PT, dizendo que trataria do assunto em outra audiência. Esta semana o presidente conversou longamente com os senadores Teresa Leitão e Humberto Costa sobre o assunto. Ficou de falar com a presidente do PT, Gleise Hoffmann, para então marcar com João.
Lula deve insistir com alinhamento dos dois partidos. Resta saber se vai convencer o prefeito. De sua parte, as lideranças petistas que defendem a aliança com o prefeito já levaram até o mesmo a preocupação com a militância, informando que, sem a vice, mesmo que o PT o apoie a base não acompanha e voltará a insistir com candidatura própria. Como os prazos eleitorais estão se esgotando ninguém trabalha mais com candidatura própria. A solução, portanto, para os descontentes, seria mesmo o apoio à candidata do PSOL, Dani Portela. Resta saber se isso não acabará levando o pleito para o segundo turno onde João teria, tranquilamente, os votos do PSOL. Mas a hipótese de segundo turno não está nos planos do PSB.
O PSB quer encerrar a eleição no primeiro turno. Considera-se que para pleitear o cargo de governador, João Campos precisa demonstrar força suficiente para liquidar a fatura no primeiro turno. Um segundo turno seria tido como meia-derrota.