A eleição de vereadores no Recife em 2024
Nas últimas três eleições no município o QE apresentou uma trajetória bastante estável, gravitando, em média, no entorno de 21.796 votos
Por conta do decréscimo populacional intercensos registrado na capital pernambucana, as vagas do legislativo diminuirão de 39 para 37 no pleito deste ano de 2024. O quociente eleitoral (QE), parâmetro referencial de votos válidos necessários para os partidos ou federações conquistarem uma vaga no parlamento, deve aumentar em decorrência.
Nas últimas três eleições no município o QE apresentou uma trajetória bastante estável, gravitando, em média, no entorno de 21.796 votos. Essa regularidade decorreu das poucas variações relativas nos votos apurados e nos votos válidos havidas nessas eleições, implicando, por via de consequência, em pequena oscilação na alienação eleitoral (abstenção + votos brancos + votos nulos). No pressuposto de que tal fenômeno se mantenha em 2024, o QE deve ficar na casa dos 22.000 votos.
Paralelamente, o STF considerou inconstitucional a exigência de que as siglas partidárias tenham votação de 80% do QE para se credenciarem à última etapa da distribuição de sobras eleitorais, mas manteve inalterados os dispositivos esculpidos da norma vigente (Lei 14.211/21) que estipularam cláusulas de desempenho nas etapas anteriores:
(1) as vagas iniciais do processo de alocação serão preenchidas apenas pelas siglas que atingiram o QE, e que tenham candidatos com votos de no mínimo 10% do QE;
(2) na 2ª etapa da alocação de vagas (a 1ª etapa das sobras) as sobras são disputadas somente pelas siglas com votação maior ou igual a 80% do QE e candidatos com votação de no mínimo 20% do QE. Daí a chamada “regra dos 80-20”.
Em termos práticos: as siglas só ascendem ao parlamento do Recife na etapa inicial se tiverem votação igual ou maior que 22.000 votos (100% do QE) e candidatos com no mínimo 2.200 votos (10% do QE).
Ultrapassada tal barreira, para se credenciar às sobras, são exigidas votações mínimas de 17.600 votos para as siglas (80% do QE) e de 4.400 votos para candidatos (20% do QE). Esgotada esta fase, e havendo ainda vagas remanescentes, todas as siglas podem participar da etapa final da distribuição de sobras, independente dos requisitos dos 80-20, de conformidade com o decisum do STF.
Imagine-se agora, à guisa de exemplo, a eleição de um vereador no Recife por determinada sigla em 2024. Há que se supor de início que:
(a) o STF referenda as deliberações já tomadas (julgamento em curso) quanto aos dispositivos da legislação impugnada; (b) o QE da eleição fica no patamar de 22.000 votos, e (c) os candidatos satisfazem as exigências de votações nominais mínimas de 10% do QE na etapa inicial de alocação de vagas e de 20% do QE na 1ª etapa de distribuição de sobras.
Assentado neste marco hipotético, pode-se inferir que:
(1) se a sigla tem votação intermediária entre 22.000 votos e 44.000 votos, ela elege um vereador pelo quociente partidário e se credencia a fazer mais um por sobras;
(2) se a sigla possui apenas um pouco mais de 22.000 votos, garante um vereador, mas fica carente de sobras para almejar uma 2ª vaga;
(3) se a sigla exibe votação abaixo de 22.000 votos, mas acima de 17.600 votos, fica com chances de conquistar uma vaga (não atingiu o QE, mas tem votação acima de 80% do QE), vai depender de sua média de votos e, finalmente,
(4) se a sigla tem votação abaixo de 17.600 votos, não faz vereador (e nem suplente), exceto se ainda houver vagas não ocupadas e que sua votação nominal seja tal que esteja entre as maiores médias da última etapa de distribuição de sobras (etapa flexibilizada pelo STF).
Para a eleição de 2 ou mais vereadores, o raciocínio é o mesmo, em múltiplos de QE, mutatis mutandis.
Enfim, siglas e candidatos nas eleições municipais vão se defrontar pela primeira vez com as cláusulas de desempenho do novel regramento dos 80-20, ligeiramente amenizado pelo STF, e, no caso do Recife, em adição, irão se deparar com o estreitamento da porta de ingresso no legislativo.
Maurício Costa Romão é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br