OPINIÃO | Notícia

Josué de Castro e os ingredientes da paz

Ele, mesmo brasileiro, sempre será um cidadão do mundo. E o mundo precisa de Josué e seus ingredientes da paz. Então, viva Josué de Castro!

Por EULALIA REBECA SILVA ARAUJO E RAUL MANHÃES DE CASTRO Publicado em 24/09/2024 às 0:00 | Atualizado em 24/09/2024 às 9:31

Discorrer sobre Josué de Castro para quem conhece sua história de compromisso humanista é cantar o amor ao próximo e a verdadeira paz entre os homens. Sim! Recordo-me da minha infância, em momentos de tanto carinho, de meu saudoso pai referindo-se a Josué de Castro. Papai me dizia, Josué de Castro, meu pequenino, é o meu orgulho, deve ser o seu também! Ele é "de nossa família". Papai falava orgulhoso: Josué é médico, meu filhinho, foi deputado, sempre foi professor.

Enfim, era tudo de muito bom para meu humilde velho. E foi assim que Josué de Castro se tornou um digno e profundo exemplo, sobretudo afetivo, na minha cabeça desde muito cedo em minha vida. Eram essas vivências ocorridas em 1962, Josué de Castro era então o embaixador do Brasil na Organização das Nações Unidas. Papai me contava que Josué, nascido em Recife em setembro de 1908, era um homem bom, vinha de uma família trabalhadora de Cabaceiras na Paraíba, tinha lutado muito para estudar, cuidar da mãe e que, por isso tudo, se dedicava a acabar com a fome no mundo.

Segundo papai, Josué já tinha escrito vários livros sobre as pessoas pobres e famintas do mundo. Meu querido pai foi por toda sua vida muito agradecido a Josué por ter-lhe ajudado muito a se manter no Rio de Janeiro, após ter migrado como muitos nordestinos. E eu em minha inocência imaginava aquele herói de papai, e a partir de então meu também.

Em 1964, ano da infinita tristeza, um golpe militar no Brasil, nosso herói foi então destituído do cargo de embaixador-chefe em Genebra e logo depois, em abril mesmo, perdeu todos seus direitos políticos, foi cassado por 10 anos. Meu pai me falava do golpe, que só aos poucos fui compreendendo, falava de um período nebuloso que se abatera pelo Brasil, igualmente no meu mundo de criança, também em nossas vidas. Pois, coincidentemente, papai dois anos depois, perde o parco patrimônio construído com muito trabalho, e eu e mamãe tivemos que com ele voltar para um nordeste que eu, menino, desconhecia, mas que pelas nossas vicissitudes, passei a amar. Josué impedido de voltar ao país, foi acolhido pela França para viver, morou em Paris de 1964 a 1973, onde trabalhou até sua morte. Josué morreu de banzo, como apontam inúmeros amigos cientistas e escritores. Eu nunca consegui perdoar seus algozes.

Todo setembro, contudo, sinto-me feliz por saber que cada vez mais os ingredientes da paz são assumidos por pernambucanos, médicos como Dr. Marcelo Valença e Dr. Luiz Alberto Mattos, historiador como Helder Remígio, biógrafo profundo de Josué e pela jovem pesquisadora a nutricionista Eulália, que me ajuda a conter a emoção nesse texto afetivo. É muito importante que a memória da pernambucanidade de Dr. Josué seja sempre preservada, pois, parafraseando Silvio Tendler "Ele, apesar do infinito amor ao Brasil, sempre será um cidadão do mundo." E mundo precisa de Josué e seus ingredientes da paz. Viva Josué de Castro!

Raul Manhães de Castro, médico, Professor Emérito da UFPE e Membro da Academia Pernambucana de Ciencias (patrono Josué de Castro)

Eulalia Rebeca Silva Araujo, nutricionista e Doutoranda em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento

 

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