A prisão preventiva obrigatória

A preventiva é decretada, somente, quando comprovado que a pena máxima contida na lei, para o crime imputado ao acusado, for superior a quatro anos

Publicado em 19/12/2024 às 5:00
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A prisão processual penal do Brasil, na atualidade, é dividida entre as cautelares e aquela destinada ao cumprimento da pena privativa de liberdade. As cautelares, só podem ser decretadas pelo juiz durante a investigação criminal ou na fase do processo penal, enquanto a privação da liberdade deve ser cumprida pelos condenados em definitivo, ou seja, quando há o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. A prisão cautelar, por sua vez, pode ser temporária (por até 30 dias, renovável por uma única vez), durante o período de investigação, enquanto a preventiva não tem prazo estipulado para a sua validade. Em síntese, a prisão cautelar é utilizada durante a investigação criminal ou no percurso do processo penal, enquanto a privação da liberdade definitiva é imposta ao réu com o fim de efetivar o fiel cumprimento da pena.

A temporária é apropriada quando imprescindível para as investigações do inquérito policial, quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento da sua identidade e houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, da autoria ou da participação do indiciado no ilícito penal. Na prisão cautelar o detento é inocente, enquanto na fase de execução da pena ele é considerado culpado.

A preventiva é decretada, somente, quando comprovado que a pena máxima contida na lei, para o crime imputado ao acusado, for superior a 4 (quatro) anos, se o acusado houver sido condenado por outro crime doloso, se envolver em crimes de violência doméstica ou familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoas com deficiências, para garantir medidas protetivas ou com a finalidade de garantir a ordem pública/econômica ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que haja indícios suficientes da participação do acusado no delito e, por último, que exista prova da existência do crime.

O que se sabe é que da promulgação da Constituição Federal de 1824, outorgada por Dom Pedro I, até a vigência do atual Código de Processo Penal de 1941, a prisão preventiva foi obrigatória em relação a todos os crimes tipificados como de extrema gravidade. Com o Código de 1941, entretanto, houve uma limitação legislativa no tocante a obrigatoriedade, porque a prisão preventiva só pôde ser decretada pelo juiz quando a pena estipulada pela lei para o crime fosse igual ou superior a 12 (doze) anos de reclusão, com o fim de garantir a ordem pública ou para a conveniência da instrução criminal, nos crimes inafiançáveis ou, finalmente, com o fim de assegurar a aplicação da lei penal. Significa, assim, que com o Código de Processo Penal de 1941, a prisão preventiva permaneceu sendo obrigatória, nos casos em que especificou.

Somente com a aprovação da Lei Federal nº 5.349, de 3.11.1967, a preventiva deixou de ser obrigatória, cabendo ao juiz, a partir disso, analisar caso a caso, mas ela só pôde ser decretada com a comprovação da autoria e da existência do crime, desde que a medida cautelar fosse imprescindível para assegurar a ordem pública, a aplicação da lei penal ou visasse preservar a instrução processual.

Porém, com a introdução da audiência de custódia em nosso ordenamento jurídico, pela Lei Federal nº 13.964/2019, a prisão preventiva voltou a ser obrigatória, quando estabeleceu que na audiência de custódia o juiz deverá decretar a preventiva, sempre que o réu for reincidente, integrante de facções criminosas ou que tenha portado arma de fogo de uso restrito.

A Câmara dos Deputados, em 11.11.2024, apreciando o Projeto de lei nº 714/2023, acresceu a obrigatoriedade para a prisão preventiva, tratando-se de réu acusado da prática de crimes hediondos (lesão corporal de natureza gravíssima ou seguida de morte, roubo, extorsão mediante sequestro, estupro, aqueles praticados por organizações criminosas, epidemia com resultado morte, falsificação de produtos medicinais, homicídio qualificado, favorecimento da prostituição de criança ou adolescente, furto com emprego de explosivo, induzimento ao suicídio ou automutilação por meio da rede de computadores, sequestro e cárcere privado contra menor de idade e tráfico de pessoas), sendo certo que o tráfico de drogas, a tortura e o terrorismo são equiparados aos hediondos pela Constituição Federal, bem como em relação a todos aqueles ilícitos penais praticados com violência ou grave ameaça, em associação criminosa e quando o réu já tiver sido submetido e liberado, anteriormente, em audiência de custódia.

Se o Projeto 714/2023 for aprovado no Senado Federal e sancionado pelo presidente da República, em (doze) meses sairemos dos atuais 820 mil detentos para mais de 1 milhão e quatrocentos mil reclusos. Podem esperar.

Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, professor da pós-graduação em Direito do Instituto dos Magistrados do Nordeste (IMN), mestre e doutor em Direito de Execução Penal, pela Universidade Lusíada de Lisboa, membro do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP)

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