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Fernando Dueire: Sem tempo a perder

Na formulação original, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabeleceu que o povo brasileiro escolhe sua forma e sistema de governo

Publicado em 22/03/2025 às 7:00
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A promulgação da Constituição Federal de 1988 foi um importante evento da história política nacional. Com ela, restauramos a democracia e inauguramos um ordenamento jurídico marcado pela garantia de direitos fundamentais dos cidadãos.

Do ponto de vista institucional, o fundamento do ordenamento de 1988 é, indubitavelmente, a separação de Poderes, em que o Poder Executivo administra, o Legislativo legisla e o Judiciário julga. O Congresso Nacional, onde atuo, conquistou autonomia e independência: deixou de ser mero carimbador dos atos do Poder Executivo e passou a ser, efetivamente, espaço de representação popular e federativa.

Na formulação original, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em seu art. 2º, estabeleceu que o povo brasileiro escolheria sua forma e seu sistema de governo por meio de plebiscito a ser realizado em setembro de 1993. O escrutínio consagrou o presidencialismo como sistema de governo e a República como forma de governo, derrotando, na época, as campanhas pela monarquia e pelo parlamentarismo. O país seria, portanto, liderado por um Presidente da República, que concentraria as funções de chefe de Estado e de Governo.

A história, no entanto, tem sido mais complexa do que se previu na Constituinte. Requisitos de governabilidade e realidades políticas regionais forçaram todos os Presidentes da República a partilhar o governo de fato — incluindo cargos e ministérios – com históricos e ideologias distintos. É o que se chamou, na Ciência Política, de “presidencialismo de coalizão”.

Passados 36 anos da promulgação da nossa Carta Política, está claro que esse arranjo é, por natureza, instável. Relações fisiológicas entre Executivo e Legislativo levaram a dois impeachments presidenciais, além de inúmeras crises constitucionais. Agravando o quadro, o Judiciário, por meio do Supremo Tribunal Federal, tem transbordado suas competências, desequilibrado o sistema de freios e contrapesos com os demais Poderes.

Estamos longe, enfim, do quadro estabelecido na Constituição. O fato de que o Congresso Nacional, por mudanças na legislação, tem exercido protagonismo na alocação de recursos do orçamento federal mostra que, na prática, o País tem vivido um regime híbrido. Resultam desse descompasso as mazelas da paralisia institucional, instabilidade econômica, erosão dos ideais democráticos e incapacidade de formular um projeto nacional consistente.

É preciso modernizar o ordenamento brasileiro para que se aprimore a governança. O sistema já não conta com os mecanismos de equilíbrio vigentes em outras épocas históricas. O sistema semipresidencialista, alvo de uma proposta de emenda constitucional de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly, se afigura como uma agenda relevante para abordarmos o dilema institucional brasileiro. Tal modelo, adotado com sucesso em Portugal e na França, por exemplo, viabiliza a partilha de poder que caracterizou o “presidencialismo de coalizão” — com a ressalva de que o Parlamento, em vez de governar por arranjos de gabinete, exerce esse poder com transparência, respaldo institucional e responsabilidade por seus atos e decisões.

Buscando tais ajustes, em uma firme régua de tempo, podemos estar mais próximos do projeto democrático da Constituição cidadã. O País tem pressa, e o futuro impõe urgência.

Fernando Dueire, senador

 


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