Um programa voltado para a atenção primária de saúde, criado no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, fechou o ano passado como exemplo da baixa cultura preventiva no país de tragédias anunciadas e hospitais públicos lotados, com pacientes até nos corredores.
Dados levantados pela organização Impulso Gov, publicados no jornal Folha de S. Paulo, apontam que 80% dos municípios não são capazes de aferir a pressão arterial de metade de sua população hipertensa, em intervalos de seis meses, assim como dosar a hemoglobina glicada de metade dos diabéticos, apenas uma vez por ano.
E o programa Previne Brasil foi criado justamente para vincular parte da distribuição dos recursos da atenção primária ao cumprimento de metas de assistência à saúde.
Os números revelam as dificuldades dos gestores municipais para cumprirem as metas preventivas. E a não realização dessas medidas preventivas simples tem consequências conhecidas no âmbito do custeio da saúde pública.
As doenças desencadeadas pela falta de prevenção custam caro aos cofres públicos, e mais ainda à qualidade de vida das pessoas, quando precisam se adequar a rotinas de limitações e tratamentos que pesam na renda mensal familiar.
Outras metas do programa não foram atingidas em várias cidades: o mínimo de seis consultas de pré-natal para 60% das gestantes, exame de câncer uterino para 40% das mulheres de 25 a 64 anos, imunização contra poliomielite e vacinação pentavalente para 95% das crianças, além de serviços odontológicos, testes de HIV e sífilis.
Em 848 municípios, nenhuma meta foi cumprida. Os indicadores começaram a ser colhidos em 2020, pararam com a pandemia, e voltaram a orientar os repasses financeiros em 2022. A estimativa da Impulso Gov é que cerca de R$ 315 milhões tenham deixado de ir para as contas municipais, em decorrência do não atendimento das metas preventivas.
Em setembro passado, os municípios ganharam mais prazo para se adequar ao controle de diabetes e hipertensão. No atual governo federal, não há definição de mudança na política do Ministério da Saúde que atrela a prevenção bem feita ao recebimento de recursos. Mas o Previne Brasil se encontra sob revisão, segundo nota oficial do Ministério.
A vinculação pode ser interessante para o fortalecimento de uma cultura preventiva nem sempre robusta no país. A necessidade imposta pelo programa fez a incidência de seis consultas do exame pré-natal, por exemplo, saltar de 38% para 54% em menos de um ano.
Espera-se que o atual governo federal não somente mantenha, como consolide o programa – e que até sirva de modelo para outras áreas de gestão, onde a prevenção é fator de redução de gastos e melhoria de vida para as populações. Como a prevenção de desastres causados pelas chuvas nas áreas de risco.
Em relação à saúde dos brasileiros, o panorama também descortina problemas como a insuficiência de médicos e profissionais especializados nas redes municipais. A transmissão dos dados de assistência é outra questão relatada.
Ou mesmo a identificação dos pacientes para a adoção de estratégias de busca ativa para o cumprimento das metas.
É preciso, portanto, partir do básico, para avançar na cultura preventiva, e não prosseguir sofrendo as consequências da falta de prevenção.