A primeira semana de julho começa com a expectativa do encontro de presidentes latino-americanos no âmbito do Mercosul, amanhã. As recentes declarações de relativização da democracia – que abrange direitos humanos elementares, como de crítica e liberdade de expressão – da parte do presidente brasileiro, são realçadas num momento em que o país retoma a liderança do bloco. Alberto Fernandez, da Argentina, transmite a presidência do Mercosul para Lula, sob o olhar atento das populações do continente e do resto do planeta. Em especial, dos líderes da União Europeia, que aguardam sinais de aproximação institucional e comercial para fortalecer as relações e estabelecer mais pontes entre os dois lados do Atlântico.
Embora Lula tenha se apresentado, quando eleito, como representante da volta do Brasil ao palco global em favor do meio ambiente, são justamente exigências ambientais dos europeus que ainda travam o acordo de livre comércio, cujas negociações se arrastam por décadas, e empacaram na gestão de Jair Bolsonaro. Lula também demonstra insatisfação com os termos solicitados pela Europa, e essa será certamente uma das pautas do encontro com seus pares do Mercosul, a partir da terça-feira.
O presidente brasileiro tem expressado o desejo de ver uma integração mais coesa e diversificada na América do Sul, que não se limite à economia. É possível que volte a falar a respeito, agregando temas como infraestrutura e saúde. Deveria incluir a educação, principal porta de entrada para o desenvolvimento econômico e social em qualquer parte do mundo, sem a qual os esforços comerciais tendem a se perder, por mais conectados que sejam. As facilidades de comunicação, os avanços tecnológicos e a existência de raízes culturais comuns são oportunidades para que os países invistam em políticas articuladas para a ampliação e melhoria dos sistemas educacionais.
Outros assuntos na agenda incluem acordos bilaterais, como o Uruguai pretende fazer com a China, um dos principais parceiros comerciais do Mercosul. O temor é que um acerto bilateral atrapalhe o comércio com o bloco inteiro. Há muitos temas econômicos, como se vê, a serem tratados no encontro de cúpula desta semana. E de fora da economia também, para a tal da repriorização puxada pelo governo brasileiro. No entanto, é difícil que a polêmica declaração de Lula, e seus efeitos dentro e fora do país, não contaminem o debate. Afinal, a democracia deveria ser um pressuposto do Mercosul, como é para a Comunidade Europeia. O protagonismo do Brasil na liderança do bloco nos próximos meses ganha o risco de perder relevância, diante do descontrole verbal do presidente da República que acabou de entrar – a exemplo do descontrole similar daquele que saiu.
Num continente necessitado de aperfeiçoamento dos laços econômicos para garantir um ciclo de crescimento que ampare a melhoria da qualidade de vida de populações empobrecidas, a contaminação pela política rebaixa o otimismo, e mantém o nevoeiro de indefinições tapando o horizonte.