O desafio – e o risco – de ir e vir
Enquanto a chuva continua e o frio aumenta, a mobilidade reduzida dificulta a chegada de ajuda e aumenta a tensão da população
Com o principal aeroporto do estado, em Porto Alegre, interditado, vários trechos intransitáveis nas rodovias e o transporte intermunicipal na dependência de boletins constantes de segurança, o deslocamento no Rio Grande do Sul é, ao mesmo tempo, fator de esperança e de medo para a população. Os primeiros voos da malha aérea emergencial já chegaram ao interior, facilitando a distribuição de donativos e viabilizando a volta para casa de muita gente que esperava a chance de estar com os familiares, neste que é um dos piores momentos da história para os gaúchos. Mas a previsão de mais de uma centena de voos semanais, incluindo o uso de pistas em Santa Catarina, depende das condições do tempo nos próximos dias, sobretudo em cidades como Caxias do Sul, onde os alagamentos têm provocado a retirada dos habitantes, e a instabilidade do solo, aumentado a quantidade de áreas de risco.
Num cenário de devastação ambiental, o direito de ir e vir pode ser uma opção arriscada. Operações de salvamento e resgate de pessoas e animais em isolamento podem durar mais de quatro horas em lanchas e jet-ski, ou ainda mais, pois há gente que não se dispõe a ir embora de seu lugar, preferindo o risco de ficar ao de sair. No entanto, o estabelecimento da malha emergencial de voos é uma necessidade coletiva indiscutível, para garantir o mínimo de condição de mobilidade. Assim como o transporte por ônibus, reduzido a uma fração do existente, funcionando de maneira improvisada em estações organizadas dentro das possibilidades disponíveis. Os passageiros não deixam de procurar o serviço, e certamente a demanda é maior do que a oferta de linhas e veículos para os trajetos entre os municípios.
A situação caótica impõe medidas urgentes e um planejamento que se debruce sobre a convivência com as mudanças climáticas. Há locais que sofreram três enchentes em alguns meses. Quase a metade das escolas no Rio Grande do Sul está danificada pelos temporais e alagamentos, o que fez com que o Ministério da Educação anunciasse o inevitável: a flexibilização do calendário escolar, nas redes públicas e privadas, em todos os níveis de ensino. Como há falta de energia e de conexão de internet na maioria das localidades atingidas, o MEC não autorizou a adoção do ensino remoto como alternativa. Quando as águas baixarem e o horizonte reaparecer, além da reconstrução das unidades escolares, alunos, professores e funcionários terão que contar, também, com a restauração dos caminhos interrompidos pelas águas e deslizamentos. Difícil prever quando os gaúchos poderão frequentar as aulas em segurança, de novo, após 90% das cidades afetadas pelas enxurradas.
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) divulgou que os países que fazem fronteira com o Rio Grande do Sul, Argentina e Uruguai, estão facilitando a entrada, no Brasil, de veículos com donativos para as vítimas das enchentes. Ampliar as opções de mobilidade e de transporte de apoio humanitário é fundamental para que se possa minimizar a agonia dos brasileiros do Sul.