Crimes ameaçam instituições
No México e no Haiti, o momento de violência política fornece exemplos dos riscos de descontrole da criminalidade
Quando o poder de força concedido legalmente aos governos para coibir os criminosos e manter a ordem pública, fica vulnerável e impotente diante da escalada da violência, as instituições democráticas podem se ver ameaçadas. Não é à toa que líderes autocratas, ditadores, surgem como alternativas de poder com discursos de restabelecimento da ordem, pelo império da força. A população amedrontada pode enxergar no aumento da violência de Estado a única saída para a segurança, contribuindo, em muitos casos, para o totalitarismo que se aproveita dessa conjuntura, sabotando direitos individuais e minando a liberdade coletiva.
No México, uma série de atentados a candidatos transformou a eleição da semana que vem em um desfile de coletes à prova de bala e de carros blindados, que não afastam a tensão, dentro e fora dos palanques, fazendo com que a proteção seja a primeira estratégia das campanhas. Em tal cenário que parece de cinema, a política é refém de bandidos que desejam perenizar a estrutura vulnerável à criminalidade, dando às facções ainda mais poder do que já detêm. Desde setembro, 34 candidatos e pré-candidatos foram assassinados em diversos estados mexicanos. A onda de crimes é atribuída às facções do tráfico de drogas, que pretendem decidir, assim, quem pode ou não ser eleito para exercer o poder nas localidades, de preferência interferindo menos nas suas ações.
O sangue derramado no México representa um alerta para toda a América Latina, inclusive para o Brasil, onde o Rio de Janeiro ensaia, faz tempo, relações promíscuas entre a política e o crime organizado. O atual presidente, Lopez Obrador, também será sucedido na eleição de 2 de junho, e tem sido muito criticado pela escalada de violência no país, durante seu governo. Com a criminalidade em alta, as instituições fraquejam, e a democracia que pode apontar melhores caminhos também é porta aberta para os aventureiros que desqualificam a política, entrando nela para assumir o poder, sem querer sair depois. Por isso é importante acompanhar de perto o processo eleitoral mexicano, há meses conturbado, para verificar a vitalidade da dinâmica democrática, sob a ameaça dos traficantes.
Enquanto isso, no Haiti, a violência é dominante, numa verdadeira guerra civil de grupos criminosos contra a polícia e o governo. Até água potável em caminhões-pipa foi impedida de entrar em bairros isolados pelas gangues. A crise humanitária estabelecida chama a atenção do mundo, mas não mobiliza qualquer tipo de intervenção em favor da população submetida a saques, incêndios e tiros. A saúde pública em colapso constitui apenas uma das faces da calamidade que acomete o povo haitiano. Sem capacidade de barrar a baderna violenta, os governos no país se mantêm no poder com precariedade, e sem efetividade na missão de fazer cumprir as leis, primeiro, para promover os direitos básicos, em seguida.
A estabilidade institucional é um dos pilares da democracia em qualquer parte do mundo. Se for invadida pela violência e pelo crime, todas as conquistas democráticas passam a correr perigo.