Danos morais

Decisão final do STJ mantém indenização de R$ 80 mil à ‘maior doadora de leite do Brasil’

Michele Rafaela Maximino vai receber indenização após ter sido ridicularizada em programa apresentando pelo humorista Danilo Gentili

Gabriela Carvalho
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Gabriela Carvalho
Publicado em 25/06/2020 às 13:18 | Atualizado em 25/06/2020 às 13:38
Foto: Fernando da Hora/Acervo JC Imagem
Michele Rafaela Maximino orgulhou a cidade de Quipapá em 2013 após chegar ao marco de aproximadamente 480 litros de leite materno doados - FOTO: Foto: Fernando da Hora/Acervo JC Imagem

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu por manter a decisão do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) que fixou em R$ 80 mil o valor de indenização por danos morais a ser paga a doadora de leite Michele Rafaela Maximino, que foi ridicularizada no programa Agora é Tarde, apresentado pelo humorista Danilo Gentili. Em acórdão encaminhado à publicação nessa quarta-feira (24), o STJ reafirmou que foi "configurado o dever de indenizar, em virtude de ofensa à imagem e à honra da autora" e que seria "inviável" alterar essa conclusão. 

Sobre o pedido de revisão do valor de indenização feito pelas defesas do apresentador, de Marcelo Mansfield e da Rede Bandeirantes, o acòrdão afirmou ser "incabível" reexame do valor fixado, mantido no valor de R$ 80 mil, que, com juros e correções monetárias, deve chegar a R$ 180 mil.

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Em outubro de 2013, a doadora, que é técnica de enfermagem, foi motivo de piada no programa do apresentador, que fez referências em termos pejorativos ao fato de ela produzir grande quantidade de leite materno.

Ao requerer os danos morais, a técnica de enfermagem alegou que, após o episódio, passou a ser alvo de constrangimentos na cidade onde morava e teve suas relações familiares e de trabalho prejudicadas. Relatou ainda que o abalo psicológico afetou sua produção de leite, prejudicando crianças que dependiam dela para se alimentar.

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Na primeira instância, Danilo Gentili, a TV Bandeirantes e o humorista Marcelo Mansfield, que atua ao lado de Gentili no Agora é Tarde, foram condenados a pagar indenização de R$ 200 mil. A sentença foi reformada pelo TJPE, que reconheceu abuso da liberdade de expressão por parte dos humoristas, mas considerou desproporcional o valor indenizatório, reduzindo-o para R$ 80 mil.

Processo

O processo começou na 2ª Vara Cível da Comarca de Olinda, passou para o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e, agora, chega ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em 2016, os réus foram condenados pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) a pagar uma multa de R$ 200 mil. O apresentador recorreu da decisão na 5º Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Pernambuco, onde teve a multa reduzida para R$ 80 mil.

Relembre

Michele orgulhou a cidade de Quipapá em 2013 após chegar ao marco de aproximadamente 480 litros de leite materno doados. A solidariedade, porém, deslanchou em um triste episódio: a técnica em enfermagem foi ridicularizada pelo então apresentador do programa ‘Agora é Tarde’, Danilo Gentili, que a chamou de ‘vaca’ em rede nacional e a fez parar com as doações à época.

Apenas no ano passado a técnica em enfermagem voltou à Quipapá, sua cidade natal. Sua família veio morar no Recife após sofrer chacotas no município da Mata Sul de Pernambuco, devido à exposição em rede nacional. Michele chegou a deletar todas as suas redes sociais porque, segundo ela, os fãs de Gentili mandavam "pornografia e mensagens rudes" para ela.

O despertar para a importância da doação

Foi na gestação da terceira filha, Mariana, agora com sete anos, que a família percebeu a importância da doação de leite. Como a menina nasceu prematura, teve que ficar internada na UTI. Ederval e Michele puderam acompanhar o drama das mães que não tinham leite para amamentar suas crianças.

"Michele tinha muito leite. A partir daí, a gente percebeu que dava para salvar vidas e começamos a não desperdiçar mais", comenta o professor, que chama o leite de "néctar da vida". O casal ainda tem o jovem Richard, de 20 anos, e Gabriel, de nove anos. A técnica de enfermagem diz ainda que na terceira gravidez, conseguiu doar 480 litros de leite.

Cidade não tem banco de coleta e doação de leite materno

A doação do leite materno produzido por Michele demanda uma logística que envolve tempo e dinheiro da família. Isto porque a cidade onde a mulher mora, na Zona da Mata de Pernambuco, não possui banco de doação ou de coleta do líquido. Para que o leite não seja desperdiçado, visto que na última gravidez a técnica em enfermagem produzia cerca de três litros por dia, o marido tem que levá-lo, três vezes por semana, para a cidade de Caruaru, no Agreste do Estado, que fica a cerca de 70 quilômetros de Quipapá.

"Na cidade não tem banco de leite. Eu venho lutando desde 2013 para ter um banco, pelo menos, de coleta, só para arrecadar este leite. Porque o banco de doação requer uma estrutura maior. É muito triste saber que a cidade que tem a maior doadora de leite do Brasil não tem sequer um banco de coleta de leite", relata Ederval. Segundo ele, mesmo o líquido durando 15 dias congelado, não era possível fazer a viagem até a cidade do Agreste, devido à falta de dinheiro para combustível. "Eu trabalho, não tenho tempo para fazer isto. É uma luta. Eu espero que, com o nascimento do João, a gente consiga sensibilizar o governador ou o prefeito para que a gente tenha este local de coleta", relata.

Doação de leite

De acordo com o Instituto Nacional Figueira (Fiocruz), cada litro atende dez crianças e qualquer quantidade é aceita pelos bancos de leite materno. Segundo o Instituto, no Brasil, em 2018, 182.740 mulheres foram doadoras e 185.414 crianças receberam o leite que, no total, somou 215.328 litros captados. Pelo caráter sazonal das doações, os bancos sofrem com estoques baixos principalmente em festas de fim de ano, onde há escassez de até 60% do volume.

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