A Câmara dos Deputados conta hoje com 70 propostas de diferentes naturezas para criminalizar a desinformação, destacada na maioria dos projetos como ‘fake news’. Delas, 65 são Projetos de Lei, criados desde 2018, sendo 39 produzidos neste ano, em decorrência da proliferação de conteúdo falso durante a pandemia de covid-19.
No entanto, a criação de leis desse tipo permanece controversa. Há críticas sobre a eficiência do uso da legislação para regular o compartilhamento de desinformação e o temor de que esse mecanismo acabe sendo usado para possíveis censuras. Para a pesquisadora do Instituto Liberdade Digital Roberta Battisti, diante da complexidade presente no contexto da desinformação, os textos das PLs são vagos e simplistas, e não geram um recuo na produção e no compartilhamento dos boatos e mentiras. “Ao que parece, todos os projetos propostos surgiram no ímpeto de solucionar ‘temporariamente’ o problema das ‘fake news’ no início da pandemia. Acredito que um projeto de lei, por si só, não tem a capacidade de erradicar a desinformação sozinho”, explica.
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O combate à desinformação, ainda segundo a pesquisadora, segue numa discussão além de ações legislativas, já que o espectro de atuação dos conteúdos falsos atinge diversos espaços. “Olhando para os projetos de lei propostos que já mapeamos, não enxergamos em nenhum deles esse potencial de barrar efetivamente a disseminação da desinformação, até porque acreditamos que a solução tenha que partir de decisões e debates multissetoriais, educação digital entre outras medidas.”
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Até o momento, no país, a Lei 13.834 é a única em aplicação e que torna crime casos de denunciação caluniosa, porém somente em contexto eleitoral. Veja alguns dos projetos de lei que estão em tramitação na Câmara dos Deputados para criminalizar o ato de disseminação de informações falsas.
PL 2630/20: Lei das ‘Fake News’
O Projeto de Lei 2630/20 que ficou conhecido como Lei das ‘Fake News’ foi aprovado pelo Senado em junho. A proposta cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, com normas para as redes sociais e serviços de mensagem. A intenção é “evitar que a desinformação possa causar danos individuais ou coletivos e à democracia”. Com autoria do senador Alessandro Vieira (CIDADANIA-SE), até o momento, o PL aguarda despacho do Presidente da República.
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Criado para tentar responder ao cenário de desinformação ascendente na pandemia de covid-19, o texto já passou por várias modificações desde que foi submetido para análise dos congressistas, e segue com críticas de órgãos e centros especializados em direitos da internet no Brasil.
“O PL 2630 foi aprovado muito rápido, sem muita discussão, e agora está na Câmara dos Deputados. Esse debate deu uma esfriada no período de eleições, mas ele corre risco de trazer mudanças significativas nas políticas de uso das redes sociais. Se aprovado na Câmara e não tiver veto presidencial, traz mudanças para as plataformas, na forma de lidar com a desinformação e até na própria arquitetura delas. As empresas teriam que moldar muitas coisas, pois as redes precisam atender às diretrizes, é uma obrigação legal”, acrescenta Roberta Battisti.
PL 1941/2020 e PL 2389/2020
Apresentado em abril e com autoria do deputado Wilson Santiago (PTB-PB), o projeto de lei 1941 estabelece multa a quem, com conduta dolosa, “divulgar notícias falsas, por meios eletrônico, telemático, digital, escrito, televisivo ou por radiodifusão, principalmente nos momentos de epidemias, pandemias, tragédias e eventos sociais de grande repercussão em nosso país, ou em situações em que foi decretado o estado de calamidade pública no território nacional”.
Já o PL 2389, da deputada Rejane Dias (PT-PI), propõe alteração no Código Penal para punir com detenção, de 2 a 4 anos, além de multa, para quem cria, divulga e dissemina informações falsas sobre a pandemia nos meios eletrônicos e nas redes sociais.
Ambos os textos foram adicionados em novembro ao PL 693/2020, apresentado pelo deputado Alexandre Padilha (PT-SP), que prevê penalidade a quem “elaborar ou divulgar informações falsas com o objetivo de influenciar a opinião pública a agir de modo contrário ao consenso científico e às autoridades sanitárias em momentos de emergência de saúde”. Pela proposta, o desrespeito às recomendações das autoridades será considerado crime contra a segurança interna do país, o que torna passível de impeachment o presidente da República que praticar a ação. O delito está previsto na Lei do Impeachment.
De acordo com o material, a pena poderá ir de um mês a um ano, além de multa, podendo ser aumentada em um terço se o agente for funcionário público, político ou pessoa influente.
Para permitir a responsabilização dos provedores que mantiverem as informações inverídicas no ar durante períodos de pandemia, mesmo após notificação judicial ou administrativa, a proposta prevê também uma alteração no Marco Civil da Internet.
A proposta ainda não foi distribuída às comissões responsáveis pelo tema na Câmara. Se houver acordo, poderá ser inserida na pauta do sistema de votação remota definido no Plenário.
PL 3131/2020
O Projeto prevê multa, que varia de R$ 500 a R$ 10 mil, para a elaboração e a divulgação de desinformações ligadas à pandemia de covid-19 que prejudiquem as medidas de enfrentamento da doença. Proposto pelo deputado Ronaldo Carletto (PP-BA) e em trâmite na Câmara dos Deputados, a aplicação do valor da multa levará em consideração “a situação econômica do agente, da repercussão da notícia, o impacto à saúde pública, a habitualidade da conduta, o intuito lucrativo e o lucro de fato eventualmente obtido”. A sanção pode ser triplicada em caso de desinformação de amplo alcance com o objetivo de incentivar o descumprimento de medidas sanitárias.
Para evitar censura, a aplicação da multa se dará apenas por via judicial. O projeto já tramita em caráter conclusivo, ou seja, não necessita de uma discussão e deliberação no Plenário, e será analisado pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
PL 4027/2020
Apresentada em agosto, a proposta altera a Lei de Licitações de Publicidade, de abril de 2010, e veda a contratação, veiculação, patrocínio e anúncios de publicidade oficiais em veículos de comunicação que de alguma maneira propaguem ou estimulem conteúdo inverídico. O texto permanece em tramitação na Câmara e foi apresentado pelo deputado João Daniel (PT-SE).
Confere.ai
Para evitar cair em desinformação e não compartilhar boatos e mentiras, é preciso checar. Em poucos passos, isso pode ser feito utilizando o Confere.ai. Ficou em dúvida com a informação que recebeu? Basta copiar o link ou texto que deseja checar, ir em www.confere.ai, colar e clicar em ‘Conferir’. O Confere.ai possui um medidor que irá informar o nível de características de uma desinformação presentes na notícia apresentada.
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