DECISÃO

MPPE denuncia trio envolvido em caso de agressão contra estudante em marina por racismo e outros crimes

A Polícia Civil indiciou os suspeitos apenas por lesão corporal e injúria racial, mas a promotoria mudou o entendimento sobre o caso

Imagem do autor
Cadastrado por

JC

Publicado em 17/03/2021 às 7:25 | Atualizado em 17/03/2021 às 9:42
Notícia
X

Três envolvidos no caso de agressão contra um estudante de 20 anos em uma marina em Maria Farinha, em Paulista, no Grande Recife, no último dia 30 de janeiro, foram denunciados pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) pelos crimes de racismo, injúria racial e lesão corporal, com agravamento devido ao motivo fútil. A denúncia ainda será analisada pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).

>> Trio investigado por agressões contra jovem negro em Maria Farinha é indiciado por injúria racial e lesão corporal

>> Jovem negro é vítima de injúria racial e lesão corporal em estabelecimento do Grande Recife

>> "Meu sentimento é só de revolta", diz jovem vítima de injúria racial em Maria Farinha

Ao término das investigações, a Polícia Civil de Pernambuco havia decidido indiciar os três suspeitos - dois homens e uma mulher - por injúria racial e lesão corporal. No entanto, a promotora Julieta Maria Batista Pereira de Oliveira mudou o entendimento do caso.

"O nosso entendimento, desde o início, lá na delegacia, sempre foi o crime de racismo. Mas o delegado não entendeu dessa maneira, entendeu como injúria racial. Se o crime tivesse sido o de racismo, eles não responderiam em liberdade. Só que o entendimento do MPPE compartilhou com o nosso entendimento, com as provas que foram apresentadas, com os vídeos, as testemunhas", disse o advogado Luiz Carlos Tomé, que integra a defesa do estudante e de uma ex-funcionária da marina, demitida após o caso.

O crime de racismo é inafiançável e imprescritível. Segundo Tomé, caso o juiz decida pela pena máxima, os denunciados podem ficar presos por oito anos em regime fechado. 

O advogado afirma que as vítimas estão mais aliviadas com a decisão do MPPE. "Estão mais tranquilos, porque estão vendo que a justiça está sendo feita. Ninguém quer passar por uma situação dessa. Foi uma coisa horrível, a gente precisa acabar com isso", comentou.

No entanto, ainda depende do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) aceitar ou não a denúncia feita pelo MPPE. Por nota, o TJPE informou que os autos do processo estão conclusos para despacho, e que a ação será analisada pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Paulista.

Nota do MPPE

"No dia 10 de março foi ajuizada pela 7ª Promotoria Criminal do Paulista denúncia na 1ª Vara Criminal da Comarca do Paulista contra três pessoas por ofensas à integridade física e injúria de forma preconceituosa as vítimas Lucas de Lima Paiva e Glecia Kelle Fernandes da Silva, ofendendo-lhes a dignidade ou o decoro, utilizando-se de elementos a raça, cor, etnia, na presença de várias pessoas e consoante provas, em um dia de passeio de lancha em Maria Farinha. As três pessoas foram denunciadas incursas nas penas do art.20 da Lei 7.716/1989 e dos arts 129 e 140, §3º, combinados com o art.61, inciso II, alínea “a”, todos do Código Penal, além de concurso material de crimes (art.69 do CPB)."

Entenda o caso

Dois homens de 23 e 25 anos e uma mulher de 23 anos foram presos em flagrante por injúria qualificada racial e lesão corporal contra o estudante no dia 30 de janeiro por suspeita de agredir e gritar ofensas relacionadas à cor da pele de um jovem negro de 20 anos na MF Marina Clube, localizada na praia de Maria Farinha.

Segundo o rapaz, ele havia sido convidado para um passeio de lancha por uma amiga que sairia pela manhã; o passeio duraria a maior parte do dia. Ele teria ido junto a um grupo de amigos de ambos. "Quando cheguei lá, ela disse que tinha chamado outros amigos, que eu não conhecia e nunca tinha visto. Até aí tudo bem... eles chegaram e não falaram comigo, nem eu com eles, até o momento em que eu fui tentar passar para pegar uma cerveja. Ele (um dos agressores) me fez um questionamento e eu respondi algo que ele não queria. Aí ele perguntou porque eu tinha respondido aquilo, que aquela não era a resposta que ele queria. Eu disse que aquela pergunta não me interessava muito não, que só queria passar para pegar minha cerveja."

A vítima conta que o homem impediu sua passagem e que, após alguns minutos, ele desistiu de pegar a bebida. "Depois de 1h, ele olhou pra mim do nada e disse 'tá (sic) olhando o que, boy? Não era pra você estar aqui. Aqui não é lugar pra você. Você tem carro? Cadê seu carro? Tu é pobre, tu é preto, tu não merece estar aqui'. Aí eu falei que enquanto ele estivesse lá, não ficaria junto. Aí a irmã dele falou 'sai mesmo, pobre. Sai mesmo, preto. Não era pra você estar aqui.'"

O estudante relatou que nesse momento falou com o marinheiro e disse que iria pular da lancha, mas o profissional não permitiu. Ao invés disso, ele parou na marina mais próxima. "Eu já desci gritando para o pessoal do restaurante, dizendo que ele queria vir pra cima de mim, que queria me agredir. Quando olho pra trás, ele já estava próximo, já veio batendo em mim. Meus amigos chegaram, empurraram ele e me tiraram. Aí o pessoal da marina me ajudou e me escondeu pra ele não vir pra cima de mim. Eu passei muito tempo escondido, escutando a gritaria lá fora."

O jovem permaneceu na cozinha do estabelecimento até a chegada da polícia. Testemunhas confirmaram a versão do garoto e o trio foi encaminhado para a Delegacia de Polícia Civil de Paulista. Os três foram soltos após pagamento de fiança. 

 

Tags

Autor