URBANISMO

Há um ano, Governo de Pernambuco prometia projeto para o Memorial Arcoverde, em Olinda, ainda intocado

Espaço no Complexo do Salgadinho segue sem execução de projetos entregues há décadas. Gestão estadual disse que pandemia "impediu andamento às licitações"

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Katarina Moraes

Publicado em 07/08/2021 às 8:00
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Em agosto de 2020, era publicada mais reportagem no JC relatando a situação de abandono do Parque Memorial Arcoverde, no Complexo do Salgadinho, ligação entre o Recife e Olinda. À época, a Empresa de Turismo de Pernambuco (Empetur), garantia que um plano de “requalificação da área” estava em andamento, sem dar um prazo; mas, um ano depois, nada parece ter mudado. O espaço de 80 hectares segue sem execução de projetos arquitetônicos entregues há décadas por renomados paisagistas e continua a ser uma demonstração do descaso do poder público com uma área urbana de grande potencial para as comunidades das redondezas.

Bicicletário, área para realização de feiras, estacionamento com 110 vagas, passeio de acesso, áreas verdes, banheiros e vestiários, salas para aulas de dança e ginástica, campo society, ciclovia de 500 metros, arquibancadas, quadras poliesportivas, áreas para jogos, palco para eventos, entre outros espaços para uso da população. Essa deveria ser a descrição atual do equipamento inaugurado em dezembro de 1994 durante a gestão do governador Joaquim Francisco (1991-1994), que faleceu na última terça-feira (3), caso tivesse sido assinada a ordem de serviço do projeto de 1986 de Burle Marx, Acácio Gil Borsói e do paisagista Luiz Vieira.

Com exceção do Espaço Ciência, que constava na planta e está em funcionamento, há muitos anos o parque representa a contradição do que deveria ser, mas não é. Em vez de entretenimento, quadras de futsal, as pistas de skate e de cooper são subutilizadas. Em vez de contemplação, bancos se perdem no mato alto que carece de capinação. Em vez de limpeza, lixo, o esgoto e a lama tomam conta do chão. Em vez de infraestrutura, só restam as paredes do que um dia já foram os banheiros, e algumas das cercas que deveriam limitar o espaço. Em vez de segurança, é ponto de venda, de consumo de drogas e de prostituição.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Situação de abandono do Parque Memorial Arcoverde - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
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ESPORTE SEM ESPAÇO Quadra de basquete e de futebol está deteriorada. Cestas do basquete não existem mais - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
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FALTA DE CAPINAÇÃO Mato toma conta do Memorial Arcoverde. Estruturas estão pichadas e carecem de manutenção. Inaugurado em 1994, local nunca passou por grande reestruturação - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
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CAVALO NA SOMBRA Animais são "frequentadores". Durante quase todo o dia, o local não recebe ninguém, aumentando sensação de abandono - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
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Situação de abandono do Parque Memorial Arcoverde - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Todas as faltas do poder público fizeram com que a população também abandonasse o local. O aposentado Marinaldo Luis, 62 anos, foi um dos poucos cidadãos que passeavam por lá em uma quinta-feira, quando o JC visitou o equipamento. Todas as manhãs, ele, que mora próximo ao parque, corre no entorno do Memorial, mas admite o medo de usar o espaço. “Aqui só é frequentado de manhã logo cedo. Nessa hora (por volta das 10h), você não vê um pé de pessoa. Já vi gente ser assaltada aqui 9h, 10h da manhã. Está abandonado, devia ser uma coisa bem melhor. Eu gostaria que aqui tivesse mais segurança, que fosse um ambiente mais gostoso para a gente vir sem medo”, disse.

HISTÓRICO DE REPORTAGENS SOBRE O MEMORIAL NO JC:

2011: Promotor quer Cirque du Soleil longe do Memorial Arcoverde

2013: Leitor atento pede reforma no Parque Memorial Arcoverde

2016: A agonia sem fim do Memorial Arcoverde

2020: Parque Memorial Arcoverde tem projeto há décadas, mas segue abandonado

Pai de quatro meninas e morador da região, o pedreiro e ciclista Célio Ferreira, 39, precisa se deslocar até o Parque da Jaqueira, nas Graças, à procura de lazer gratuito para as crianças. “O pessoal ainda vem hoje [até o Memorial] porque esse é o lazer que o pobre tem, mas a gente vê que não tem condições”, contou. Todas as manhãs, ele usa a ciclofaixa do local pela manhã para ir até o emprego no Centro do Recife, mas revela pegar atalhos à noite, quando a escuridão reina. “Geralmente, aqui é um abandono só, com prostituição e assalto, principalmente à noite; quando não passo de jeito nenhum. Aqui deveria ter uma iluminação boa”, pediu.

A falta de semáforos e de faixas de pedestres suficientes também complica o acesso ao Memorial. Duas passarelas metálicas faziam a ligação entre as duas partes do parque, mas foram destruídas pela ação da maresia e do tempo, e posteriormente retiradas. Assim, pedestres precisam correr e se arriscar para atravessar a Avenida Agamenon Magalhães ou a Avenida Dom Hélder Câmara, onde os carros passam em alta velocidade, para chegar ao equipamento. “Tem faixa de pedestre, mas não tem sinal, e no fluxo intenso ninguém para, temos que atravessar correndo, é perigoso”, relatou o vendedor Alex Ferraz, 24, que trabalha em uma loja em frente ao equipamento.

Construído sobre área de mangue, boa parte Memorial Arcoverde é utilizado hoje como local de treinamento de direção para motoristas iniciantes, onde a área verde foi pavimentada para receber o Cirque de Soleil em 2009. Apesar dos pedidos do Ministério Público de Pernambuco nos anos seguintes, o espaço jamais voltou a ser arborizado. Durante o período de carnaval, lá também é palco para festas privadas de grande porte desde 2018 “como forma de atender à crescente demanda da iniciativa privada por espaços abertos para a realização, especialmente, de shows com atrações nacionais”, segundo disse a Empetur ao JC em 2020.

O esporte como resistência no Memorial

Não podemos ficar sem espaço. Uma comunidade sem área de lazer é prato cheio para a marginalidade e para as drogas, temos que ocupar as pessoas
Aurélio Carneiro, conhecido como Dabalaia

O uso do local pelos camarotes, entretanto, é amplamente criticado pelas comunidades da redondeza - que cuidam do Memorial com o próprio dinheiro e força de trabalho. “Deixam buracos de 2 a 2,5 metros para colocar as torres no Carnaval. A gente trabalhou e colocou areia na pá. Ainda quebraram bancos e traves”, disse o segurança patrimonial Aurélio Carneiro, de 60 anos, conhecido como Dabalaia. Há 26 anos, é ele quem organiza peladas no parque, mantendo-o movimentado aos sábados e domingos até hoje.

Todos os finais de semana, times de comunidades do Recife e de Olinda jogam no Memorial Arcoverde, e precisam pagar cerca de R$ 130 mensais à Empetur para alugar um espaço entregue às traças. “Nós pagamos, nada é de graça nesse parque. É R$ 130 por horário, que é dividido pela comunidade. Não tem banheiro para tomar banho mais, está abandonado, antigamente tinha e era organizado. Hoje não tem nada, nem marcam o campo. Minha comunidade mesmo vai pagar o rapaz para limpar [o campo]. Até a marcação dele somos nós quem fazemos”, explicou.

CORTESIA
Após instalação de camarotes durante o Carnaval 2020, comunidade precisou nivelar o campo sozinha - CORTESIA
CORTESIA
Após instalação de camarotes durante o Carnaval 2020, comunidade precisou nivelar o campo sozinha - CORTESIA
CORTESIA
Times de comunidades do Recife e de Olinda precisam pagar R$ 130 mensais para jogar no Memorial Arcoverde em um horário no final de semana - CORTESIA

O agente comercial José Cassiano de Lima, de 59 anos, morador de Salgadinho, em Olinda, é um dos ‘peladeiros’ do Memorial há mais de 20 anos, e sente saudades dos tempos em que o parque era conservado. “Era todo cercado, o gramado era bom, com refletores, vestiário, hoje não tem mais nada. Tinha campo de futebol, skate, duas quadras pequenas com rede. Eu gostaria que tivessem academias naquele espaço. Olinda é muito esquecida”, desabafou.

Percebendo o alto índice de criminalidade na comunidade de Salgadinho, Jorge Cavalcante, de 47 anos, fundou no parque o Projeto Social Asa Branca, com escolinha de futebol para mais de 200 crianças entre 4 e 17 anos. “O crack estava muito forte, e queríamos fazer algo. Achei o futebol oportuno, porque eles ficam doidos para ser jogadores. Eles não pagam nada, mas têm que trazer comprovante de que estão estudando. Vamos no colégio todo mês para saber como o menino está; se estiver bem, damos chuteira, por exemplo”, contou. Mesmo assim, ele revela como é difícil tocar o projeto sem um apoio do governo e em um espaço abandonado: “não tem condições das escolinhas treinarem lá”.

O que dizem o Governo de Pernambuco e a Prefeitura de Olinda

Por nota, a Secretaria de Turismo e Lazer de Pernambuco garantiu que o projeto de requalificação do Parque Memorial Arcoverde foi licitado, mas que “houve contingenciamento de despesas do Governo do Estado pela pandemia da Covid-19”. “Isso impediu que fosse dado andamento às licitações dos projetos complementares necessários à fase de planejamento da obra”, disse a gestão. Assim, “após a licitação e elaboração, será possível iniciar a execução da obra” - realizada inteiramente com recursos estaduais, segundo o governo. A pasta ainda disse fazer periodicamente trabalhos de manutenção no local.

Além disso, informou que o projeto arquitetônico encontra-se em fase de aprovação pela Prefeitura de Olinda, e que a Empetur aguarda que o município agende para este mês de agosto uma reunião sobre a planta. Já a Prefeitura afirmou só ter recebido o projeto na última semana, e que será apreciado pela Comissão Especial de Aprovação de Projetos (CEAP) até o fim da próxima semana. A gestão municipal completou que compete ao Estado a manutenção do parque, incluindo a iluminação. “A iluminação gerida pela Prefeitura naquela área são os postes em frente ao Centro de Educação Musical de Olinda (CEMO). Até o final de semana uma equipe do setor de Iluminação Pública estará no local para realizar a manutenção dos equipamentos”, prometeu.

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Não podemos ficar sem espaço. Uma comunidade sem área de lazer é prato cheio para a marginalidade e para as drogas, temos que ocupar as pessoas

Aurélio Carneiro, conhecido como Dabalaia

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