10 imóveis do Centro do Recife conseguiram isenções fiscais, principal medida do Recentro para atrair investimentos
Proprietários de imóveis antigos ainda enfrentam dificuldades em conseguir os benefícios, criados para atrair investimentos para a região
Após dois anos de programa, dez imóveis localizados no Centro do Recife conseguiram as isenções fiscais destinadas pelo Recentro para atrair investimentos para a região. O “desconto” nos impostos foi a principal e inaugural medida do programa de revitalização do território atendido por ele.
Lançado em 2021, o programa determinou que, nas áreas abrangidas pelo Recentro, os descontos de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), Imposto Sobre Serviços (ISS) e Imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI) seriam dados por até 10 anos para os proprietários que se comprometessem em revitalizar ou recuperar parcialmente ou totalmente seus imóveis.
Desde então, quatro empreendimentos conseguiram a redução da alíquota do ISS de 5% para 2% em serviços realizados por eles. Dois deles no Moinho Recife Business & Life, no bairro do Recife, pelo trabalho de construção civil nos prédios. Já o Hotel Marina, em São José, conseguiu o desconto por realizar serviços de construção civil e de climatização.
A redução do IPTU chegou a seis imóveis — que tiveram de se comprometer em fazer reparos ou manutenções. Somente o Moinho Recife, complexo empresarial multiuso localizado, conseguiu isenção de 100% do imposto em duas operações. Têm 50% de desconto o Mangue Orange Hostel, a empresa de tecnologia Softex Recife, outros dois edifícios empresariais no Recife Antigo e o Café Duque, na Rua Duque de Caxias, o único no bairro de Santo Antônio a conseguir qualquer benefício.
O dono do Café Duque, José Amorim, de 44 anos, já tinha tentado o benefício antes do Recentro, mas a burocracia dificultava o processo. Com o Recentro, conseguiu. “Já tinha o requerimento antigo com a fundamentação [para a isenção], foi mais fácil por causa disso. Não demorou nem 2 meses para eu conseguir”, contou.
O benefício diminuiu os custos da operação do prédio, onde há 17 anos funciona o café em uma área que tem se degradado ao longo do tempo. Além do térreo, são ocupados pelo proprietário outros dois andares do edifício — os outros quatro estão vazios. “Recebi propostas, mas se for abrir para virar um prédio comercial vai ser todo um custo de vigia, porteiro, zelador”, pontuou.
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ISENÇÃO NEGADA
Há, também, quem não conseguiu os benefícios. É o caso de Paulo Correa, administrador e um dos proprietários do Edifício Pernambuco, em Santo Antônio, que disse só ter tomado conhecimento sobre a necessidade de comprovar as reformas ou reparos após entrar com o processo.
“A gente fazia algumas manutenções, mas não tínhamos o documento. Por isso o processo não andou. Agora vou entrar novamente com o processo já obtendo a licença”, disse. “As pessoas que tem imovel na região tem essa dificuldade, não sou o único. todos têm essa dificuldade em relação a documentação”.
Ele é um dos proprietários que enfrentam a baixa ocupação do imóvel causado pela saída dos moradores do Centro. Diz que, hoje, cerca de 40% do prédio está alugado, o que não dá nenhum lucro para ele. “Nessa parte fiscal, o resultado é muito baixo. Me falaram que já melhorou, que um número maior de empresas conseguiu esse benefício, mas ainda é muito pouco”, pontuou.
Outro exemplo é o dono do Edifício Douro, Breno Coelho, que não conseguiu dar início ao processo para conseguir o desconto pela estrutura antiga do prédio não ter acessibilidade. “No meu caso, eu tinha que regularizar algumas questões do prédio primeiro para conseguir a carta e dar início. Mas não vou desistir. O único meio de sobrevivência desses imóveis em Santo Antônio é com isenção”, disse.
Ao contrário do Pernambuco, 100% do Douro, que é um edifício comercial, está ocupado. “Não tenho problema com ocupação. Pelo valor baixo que cobramos, a gente tem procura. Mas a despesa do prédio é alta e se a questão do IPTU não for vencida se torna inviável.”
AMPLIAÇÃO DO BENEFÍCIO
Em dezembro de 2023, a Prefeitura do Recife sancionou uma alteração na Lei do Recentro, que ampliou o plano de incentivos fiscais para trecho do bairro da Boa Vista — Setor de Preservação Rigorosa (SPR-01) da Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico-Cultural (ZEPH-08) — e o número de atividades econômicas beneficiadas.
Uma das principais alterações é que a partir de agora quem fizer melhorias, reparos, construção, recuperação, total ou parcial nos imóveis nesses locais poderão ser contemplados com a redução de 60% e 100% do IPTU, já a partir da expedição do Alvará de Serviço sem Reforma emitido pela Secretaria de Política Urbana e Licenciamento (SEPUL).
A versão anterior, estabelecia que só após a conclusão das obras e de posse das licenças e certidões exigidas é que o proprietário poderia solicitar o benefício de redução do IPTU, que agora pode ser de 60%, pelo prazo de 3 (três) anos, no caso de realização de obras de reparo e manutenção; e de 100%, pelo prazo de 10 anos, para a realização de obras de construção, de recuperação total, de recuperação parcial ou de renovação. As duas modalidades são referentes a imóveis residenciais ou não.
O consultor urbano da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Pernambuco (Ademi-PE), Sandro Guedes, opinou que o incentivo fiscal não é o mais importante para produção imobiliária na região, mas sim a flexibilização de regras que permitam mais construções.
“Esse instrumento do incentivo não tem um impacto decisivo. Para a construção não é tão relevante a ponto de influenciar na decisão de fazer ou não o empreendimento, o que mais influencia é a viabilidade dele como um todo. Demanda, capacidade de pagamento do cliente e interesse do cliente”, disse.
O arquiteto e urbanista Luiz Amorim, professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), defende que a iniciativa da criação do Recentro é louvável e inclusive tardia, mas que o estímulo à reocupação do Centro deve ser feito com cuidado.
“Uma das principais chamadas do Recentro foi a vinda do mercado imobiliário. Essa ação tem que acontecer com cuidado para que não transformemos o Centro em apartamentos de Airbnb, sem moradores, perdendo características próprias do morar, não dando oportunidade aos bancários, comerciários que atuam no centro e não tem como encontrar seus lugares de moradia a não ser em locais muito distantes, levando 2 ou 3h por dia para chegar”, alertou.
PROPRIETÁRIOS HOMENAGEADOS
Nessa quarta-feira (31), os proprietários que tiveram acesso às isenções foram homenageados pelo Recentro — por terem, segundo a Prefeitura, recuperado e conservado mais de 25 mil m² em edificações no centro, preservando o patrimônio histórico.
O programa entregou placas numa cerimônia durante um café da manhã nesta quarta-feira (31), às 8h, no auditório do Moinho, que serão afixadas nas respectivas edificações com os seguintes dizeres: “Edifício contemplado com a Lei do Recentro”.
"A Prefeitura deu a isenção de todos os impostos municipais nessa área, zerando completamente ou reduzindo, para incentivar aqueles que desejam investir no Centro do Recife — um lugar que todos temos muito carinho e responsabilidade de cuidar. A nossa lógica é de ver os patrimônios sendo recuperados e empregos sendo gerados. Apenas em um dos empreendimentos, por exemplo, foram geradas 500 vagas. Todo o Recife sai ganhando e, assim, também garantimos uma cidade mais limpa e organizada", discursou o prefeito João Campos (PSB).
Segundo a chefe do Gabinete do Centro do Recife, Ana Paula Vilaça, a iniciativa é para marcar e demonstrar o alcance que o Programa Recentro, da Prefeitura do Recife, está tendo.
“As placas representam a parceria entre o município do Recife e os proprietários de imóveis na recuperação e manutenção das áreas históricas do centro. Elas serão uma forma de mostrar a todos os passantes o resultado dessa colaboração na preservação do patrimônio da cidade”, afirmou Ana Paula.