Desafios do Recife: Universalização do saneamento é realidade distante para comunidades de baixa renda da RMR
Apesar dos avanços e da entrada do setor privado, especialistas acreditam que o prazo de universalização do saneamentona RMR ainda é apertado

A Região Metropolitana do Recife (RMR) tem um passivo sanitário histórico. A oferta de saneamento básico, em especial de esgotamento sanitário, não acompanhou o crescimento da demanda. Ao longo dos anos, o Recife experimentou uma metropolização, com as necessidades das populações de outras cidades sobrecarregando a Capital pernambucana.
Em 2020, o Marco Regulatório do Saneamento permitiu a entrada da iniciativa privada na concessão dos serviços, como forma de agilizar os investimentos, e estabeleceu o ano de 2033 como data-limite para a universalização do saneamento. Apesar dos avanços na última década e da entrada do setor privado, especialistas acreditam que o prazo de universalização ainda é apertado para resolver o problema da RMR. Outra preocupação é com as comunidades precárias, que vivem em regiões que sequer são saneáveis.
Pernambuco saiu na vanguarda no país, com a criação de uma Parceria Púlico-Privada (PPP) na área de saneamento. Batizada de Cidade Saneada, a PPP entre a Compesa e a BRK tem o objetivo de ampliar o acesso à coleta e ao tratamento de esgoto em 15 municípios, sendo 14 da Região Metropolitana do Recife e um da Zona da Mata Norte (Goiana). A previsão é investir R$ 7 bilhões (85% da BRK e 15% da Compesa) para universalizar os serviços de esgotamento sanitário até 2037, atendendo a 6 milhões de pessoas.
PPP NÃO CHAEGA NOS VULNERÁVEIS
Apesar do avanço que a PPP vai promover na cobertura, a coleta e tratamento de esgoto não vai chegar as comunidades que mais precisam. Isso porque a PPP só vai atuar em área urbanizadas, saneáveis. "A urbanização dos assentamentos precários, condição para a implantação das infraestruturas de esgoto nessas áreas, exige a implementação de políticas mais amplas (um programa nacional voltado à urbanização das áreas de baixa renda/favelas), o que demanda grande protagonismo dos municípios e forte articulação interfederativa", pontua Árnaldo de Souza, Bacharel em Gestão de Políticas Públicas, doutor em Desenvolvimento Urbano pela UFPE e pesquisador do Observatório das Metrópoles – Núcleo Recife.
UNIVERSALIZAÇÃO DISTANTE
Em setembro de 2023, o Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE) divulgou para as prefeituras municipais, o Painel de Saneamento, trazendo um panorama preocupante do acesso à água, coleta e tratamento de esgoto no Estado.
O estudo mostra que apenas 30,8% da população pernambucana dispõem de serviços de coleta de esgoto, enquanto 83,56% têm acesso à água. Os índices estão abaixo das médias nacionais, que são de 84% (água) e 55,81% (esgoto). A Capital tem uma situação um pouco melhor, disponibilizando água para 96,43% e esgoto para 44,99% das famílias.
O Painel foi elaborado com base no diagnóstico do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério das Cidades, com dados de 2021. Nele, foram analisadas 172 cidades e o distrito de Fernando de Noronha. Informações do SNIS aponta que entre 2010 e 2021 o acesso a coleta de esgoto em Pernambuco passou de 16,1% para 30,8% da população. No caso da água, o avanço foi de 67,2% para 83,56%.
Apesar do avanço, o cenário continua bastante precário e é difícil imaginar que Pernambuco vai atingir a meta de universalização de 90% dos serviços até 2033, como determina o Novo Marco Legal do Saneamento, assinado em 2020. Se no intervalo de uma década, o tratamento e coleta de esgoto andou cerca de 15 pontos percentuais, como imaginar que em mais 10 anos vai passar de 30% para 70%, ainda que exista uma PPP em curso e previsão de mais investimentos com a participação da iniciativa privada no setor?
SEM LIXÃO, MAS COM POUCOS ATERROS
Pernambuco conseguiu zerar o número de lixões a céu aberto nos 184 municípios do Estado. Foi uma conquista histórica, porque aconteceu antes do prazo estabelecido pelo Marco Regulatório do Saneamento, que prevê a eliminação do descarte incorreto até este ano. A antecipação do prazo em Pernambuco é resultado de um trabalho iniciado em 2014 pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), em parceria com o Ministério Público de Pernambuco (MPE) e a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH). A conquista foi anunciada em março do ano passado.
Diante da realidade do lixão-zero, o desafio agora é aumentar a quantidade e a capacidade dos aterros sanitários existentes no Estado. E aí surge outra demanda metropolitana. Como não existem aterros em todos os municípios, os gestores depositam os residos em cidades vizinhas.
Dependendo da distância do equipamento mais próximo, o descarte pode ficar caro. Isso tem feito com que os prefeitos acabem não depositando todo o lixo nos aterros, em dos custos e levantando o questionamento sobre o que tem sido feito com o que não sai do município.
Levantamento do Ministério Público de Pernambuco (MPE) calculou que são necessários 54 aterros sanitários para atender a necessidade de descarte de resíduos sólidos do Estado. Na época do anúncio de TCE eram 23 em operação e outros 12 em fase de licenciamento pela CPRH.