Desafios do Recife: Falta de decisão política trava desenvolvimento metropolitano, que não sai do papel

Governo de Pernambuco elaborou o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI), mas trabalho não deixou de ser um documento guardado em uma gaveta

Publicado em 14/08/2024 às 19:35 | Atualizado em 30/08/2024 às 8:29

No papel, o planejamento metropolitano do Recife ganhou centenas de páginas. Na prática, é um documento amarelando nas gavetas dos gestores públicos. Com eleições municipais às portas, o desafio de pensar as cidades da Região Metropolitana como um território urbano único volta à pauta. A Metrópole do Recife tem 14 municípios, com problemas comuns e outros específicos, mas com governos municipais diferentes. Não é fácil construir um arranjo metropolitano diante de tantas demandas, mas também não é impossível. O que falta para a proposta deixar de ser apenas um documento bem escrito e se transformar em ações é decisão política

A greve dos motoristas da ônibus da Região Metropolitana do Recife (RMR), na segunda (12) e terça-feira (13), escancarou nossa condição de cidadãos metropolitanos. Com exceção de quem tem o privilégio de morar próximo ao trabalho, usar o transporte público, atravessando os limites dos municípios, é uma realidade de muitos usuários.

Nesse contexto, o sistema de transportes é apenas um dos serviços públicos que precisa ser planejado e executado sob perspectiva da metropolização. A demanda também se estende a outras áreas como saneamento básico, lixo, mudanças climáticas, habitação, saúde, educação, desenvolvimento econômico, segurança pública, cultura e outros.  

Para tentar resolver a questão municipal foi promulgada, em 2015, a lei federal 13.089, criando o Estatuto da Metrópole (modificada em 2018).  A legislação afirma que a realidade metropolitana deve ser observada em seu conjunto e as soluções devem ser definidas a partir de políticas públicas ou ação conjunta entre os municípios. Como a implementação não se viabiliza a partir de um único município, é necessária uma governança interfederativa, integrada pelos governos municipal, estadual e federal para se tornar realidade.

Antes do Estatuto da Metrópole, que completa 10 anos em 2025, já estava implementado o Estatuto da Cidade, desde 2001. O Estatuto da Cidade regula o espaço urbano dentro do município e tem como principal instrumento o Plano Diretor Municipal (PDM). Já no Estatuto da Metrópole prevê como ferramenta-chave o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) e a governança interfederativa.

Arte/JC
RMR tem 15 municípios e população superior a 4 milhões de habitantes - Arte/JC

POLÍTICA TRAVA AVANÇO DA RMR

Prefeito do Recife por duas gestões, o deputado estadual João Paulo (PT) diz que as discussões sobre o compartilhamento da gestão metropolitana é anterior ao Estatuto da Matrópole. "A RMR já mantinha uma estrutura própria de governança por meio do Conselho de Desenvolvimento Metropolitano (Conderm), constituído pelo Governo do Estado, Assembleia Legislativa, prefeituras da RMR, Universidades e Sociedade Civil", lembra, dizendo que participou ativamente das reuniões enquanto era prefeito, junto com outros estores como Elias Gomes, do Cabo; Luciana Santos, de Olinda; Paulo Santana, de Camaragibe, e outros.

"Um exemplo de ação metropolitana pelo Conderm foi a aprovação do Programa Viva o Morro, com o levantamento de todos os pontos de risco nas cidades da região e definimos as prioridades de investimentos a partir do grau de periculosidade para os moradores e as comunidades. Era o início da lógica do planejamento inclusivo", comemora. O PDUI traz o diagnóstico dos problemas metropolitanos e o Conselho faz a governança, por meio da articulação política e da viabilização dos investimento. 

PLANO NA GAVETA

Em 2018, a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) aprovou a lei que instituiu as bases legais do PDUI - Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado. O governo Paulo Câmara chegou a contratar uma Consultoria Especializada para elaborar o Plano. O Diagnóstico está pronto e tem 264 páginas, trazendo a situação urbanística e socioeconômica da RMR. A minuta da lei também ficou pronta e foi entregue desde 2022, mas de lá para cá não saiu do papel. 

"É natural que a nova gestão estadual (de Raquel Lyra) queira revisar o Plano, mas será que em um ano e meio de governo não foi possível retomar? No caso da Prefeitura do Recife também já deu tempo de fazer essa discussão, porque são quase 12 anos de continuidade do PSB. Porém, no momento, a prioridade é fazer duas campanhas ao mesmo tempo: para a Prefeitura do Recife e o Governo do Estado. A política está travando o desenvolvimento da RMR", alerta João Paulo. 

O deputado afirma que os governos estaduais e municipais continuam inadimplentes com o povo e com a RMR. Ele adianta que quando passar a Eleição 2024 vai fazer um apelo para que a Alepe convoque o Secretário de Planejamento do Estado, o presidente da Agência Condepe/Fidem, a Assessoria Especial da governadora Raquel Lyra, além das universidades, sociedade civil, empresários e os especialistas em Planejamento e Desenvolvimento Urbano, para darem celeridade ao PDUI, ferramenta importante e obrigatória de Planejamento, que vai permitir um futuro melhor para a Metrópole do Recife. 

SILÊNCIO DO GOVERNO, MAIS UMA VEZ

Depois de não se pronunciar sobre a greve dos rodoviários no início desta semana, o governo de Pernambuco volta a se calar sobre o andamento do PDUI e de uma possível revisão e efetivação do Plano. A reportagem do JC procurou o secretário do Planejamento e o presidência da Agência Condepe/Fidem, responsáveis pelo tema, mas não atenderam ao pedido de entrevista nem se pronunciaram por meio de nota. Fica a impressão de que as demandas urbanas de quase 4 milhões de habitantes do Recife Metropolitano não são prioridades. 

 

 

 

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