Praias urbanas: De Paulista a Jaboatão, desafios de melhorar infraestrutura, segurança e qualidade da água
Algumas das praias urbanas na RMR repetem desafios de mobilidade, poluição e falta de infraestrutura básica para banhistas, comerciantes e pescadores

Com mais de 40 quilômetros de extensão, as praias urbanas da Região Metropolitana do Recife encantam turistas e são ponto de comércio, lazer e esportes em Pernambuco. As belezas naturais são mais do que paisagens: são um convite ao descanso e pontos de encontro para todas as pessoas.
Mas, de Paulista a Jaboatão dos Guararapes, passando por Olinda e pelo Recife, a orla do Grande Recife acumula problemas históricos, que passam a ser discutidos, a partir desta quarta-feira (29), nesta série de reportagens especiais do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação. São demandas que se arrastam por décadas e prejudicam a população, que tem nas praias não apenas uma opção de lazer gratuita, como também um meio de subsistência e uma fonte de renda.
Algumas das praias urbanas mais famosas do Estado repetem os desafios de mobilidade, poluição e falta de infraestrutura básica para banhistas, comerciantes e pescadores.
A falta de requalificação e integração na orla de Paulista, por exemplo, dificulta o deslocamento de ciclistas que escolhem o trecho da praia para se movimentar ou passear.
Na extensão da orla do Grande Recife, a situação de banheiros públicos também é precária para os usuários. Em vários trechos, eles são inexistentes e a população precisa improvisar - como em Paulista, com um buraco na areia.

A poluição nesses espaços também incomoda a população. Casos de despejo de esgoto no mar e sujeira na areia e no calçadão são comuns e expõem os visitantes a riscos de saúde. Os trechos poluídos ainda são um agravante para os pescadores, que se expõem aos dejetos e capturam animais com menor qualidade - e possivelmente contaminados.
O abandono nas praias urbanas de Pernambuco também gera a sensação de insegurança. Seja na orla de Olinda ou de Jaboatão, por exemplo, os relatos de frequentadores que se sentem em risco e suscetíveis a furtos e assaltos são constantes.
Na praia de Boa Viagem, comerciantes relatam que os arrombamentos em quiosques são frequentes e, para evitar furtos e prejuízo, dormem nos espaços.
O Coronel Mário Canel, diretor adjunto de planejamento operacional da Polícia Militar de Pernambuco, destaca que um plano de ação voltado para a orla do bairro foi desenvolvido no Juntos pela Segurança e que o direcionamento do policiamento ocorre de acordo com as ocorrências.
Já o delegado seccional de Boa Viagem Alfredo Jorge explica que a Polícia Civil tem muita demanda de roubo a transeuntes e está desenvolvendo investigações a respeito dos crimes.
Gestão metropolitana

A vulnerabilidade das praias urbanas em Pernambuco e as demandas em comum entre elas podem ser acentuadas pela falta de um planejamento metropolitano integrado entre os municípios.
Neste ano, o Estatuto da Metrópole completa dez anos, estabelecendo diretrizes para o planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas.
Em entrevista à Rádio Jornal, em setembro de 2024, o arquiteto, urbanista e consultor em planejamento em gestão de cidades Geraldo Marinho já alertava que o documento ajuda os municípios a agirem em conjunto para atender a população. “O Estatuto da Metrópole tem como expressão-chave a função pública de interesse comum. Ela trata de equilibrar e balancear as medidas dos municípios”, pontuou.
O objetivo é que regiões como a RMR trabalhem em conjunto para solucionar demandas comuns nas cidades, como a mobilidade e a infraestrutura nas praias urbanas, por exemplo.
Dinâmica urbana e orla

O Grande Recife cresceu a partir da relação da cidade com o mar. Nas orlas das cidades, as pessoas criavam uma nova forma de ocupação e dinâmica urbana.
A historiadora da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), Rita de Cássia, explica que o mar foi fundamental para a construção do sistema colonial que estava em voga no mundo, criando uma ligação com as trocas atlânticas entre as Américas, a Europa e a África, quando inicia o circuito do escravagismo.
De acordo com a pesquisadora, só por volta de 1850, as praias começaram a ser espaços de lazer. “Na segunda metade do século XIX, começa a se instalar no Brasil, em cidades litorâneas, os banhos de mar. A partir daí, se tem uma grande transformação do uso e significado das praias: elas deixam de ser um lugar só de trabalho, comunicação e segurança e começam a entrar no modo de vida da população urbana”, conta.
A partir de então, as orlas passaram a ter novos usos e ocupações, alterando a dinâmica urbana das cidades litorâneas, como é o caso da Região Metropolitana do Recife.
A geóloga da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Núbia Chaves conta que, na época, o mar era mais longe do continente, então a faixa de areia era maior. Com isso, as construções foram avançando, sem levar em conta os períodos em que a maré estivesse mais cheia.
“É o ciclo natural do oceano. Vai depender muito do vento, dos deságues de água, das formações de cadeias de montanha e da destruição de ilhas”, explica Núbia. Ela pontua que as pessoas que construíram “não sabiam que um dia a praia tinha chegado perto do muro das casas dos avós e também não informaram isso para ninguém”.

Com construções cada vez mais próximas à faixa de areia e problemas de infraestrutura básica e segurança que se acumulam por anos, os investimentos em requalificação nas orlas são ineficientes. Em João Pessoa, por exemplo, considerado novo marco do turismo urbano no Nordeste, se explora o potencial turístico da cidade oferecendo infraestrutura e segurança para moradores e turistas.
Mas, apesar de serem um dos maiores cartões-postais pernambucanos, as praias que se estendem ao longo das áreas urbanizadas ainda carecem de atenção do poder público para que visitantes, comerciantes e pescadores desfrutem das belezas naturais num cenário que reúna o melhor da natureza e o desenvolvimento das cidades.