A Aena Brasil havia assumido a administração do Aeroporto Internacional do Recife há oito dias quando a pandemia da covid-19 foi decretada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 11 de março. Eram grandes as expectativas de que a gestão privada trouxesse ganhos de qualidade e eficiência ao terminal, que em 2019 já era o oitavo do Brasil em tráfego de passageiros totais e sexto no de internacionais. Não houve tempo, entretanto, de executar nenhuma das ações previstas no contrato de concessão do aeroporto, que a empresa de origem espanhola arrematou em 2019 por R$ 1,9 bilhão em outorga, dentro do bloco Nordeste. Com a retomada da economia e enquanto uma vacina contra o coronavírus não chega, o desafio é reconquistar a confiança do viajante e recuperar a malha aérea, para que o fluxo de passageiros volte a crescer.
Paralelamente, o terminal passará pelas primeiras reformas a partir de janeiro, que incluem a requalificação dos banheiros e esteiras, além da instalação de sinalização e de recursos de acessibilidade.
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INFRAESTRUTURA É ESSENCIAL
Em um território de dimensões continentais como o Brasil, ter uma boa infraestrutura aeroportuária e voos para diferentes partes do País e do mundo é condição básica para o desenvolvimento do turismo. Até porque o transporte aéreo costuma ser a atividade com maior participação nas receitas do setor. Representa uma fatia de 31% no Brasil, segundo estudo da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), a partir de dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Frequência aérea sozinha, no entanto, não faz milagre. Trata-se de uma via de mão dupla, que precisa ser retroalimentada. É o que diz Marcelo Bento Ribeiro, diretor de Relações Institucionais e Novas Alianças da Azul Linhas Aéreas. A empresa mantém desde março de 2016 um hub no Recife. Para que as rotas sejam instaladas e se consolidem, é essencial ter demanda. "Recife é a única cidade conectada a todos os outros municípios importantes do Norte-Nordeste, além de todas as capitais do Sudeste e quase todas do Centro-Oeste e Sul. O mais difícil, que são as conexões aéreas, está aí", diz Bento.
ALÉM DE PORTO DE GALINHAS E NORONHA
O executivo lembra que a empresa já recuperou no Aeroporto do Recife mais da metade da malha pré-pandemia. Até janeiro, se não houver recuos relacionados à covid-19, deve chegar a 100%. "Mas se quiser manter esse ritmo, sobretudo para o futuro, o Estado não pode viver de Porto de Galinhas e Noronha. É preciso estruturar experiências únicas, com o que já se tem, de forma planejada em circuitos. Não se trata de construir um aquário de milhões de dólares, mas vale pensar em soluções para tribos, que envolvam a doçaria, a gastronomia, a religião de matriz africana, por exemplo", sugere, reforçando a necessidade de diversificação dos produtos turísticos do Estado.
NEGÓCIOS E EVENTOS
De mãos dadas com o turismo de lazer, será crucial reestruturar o segmento de negócios, diante das mudanças trazidas pela pandemia, quando as empresas perceberam a viabilidade do home office e do trabalho a distância. "Precisamos nos reinventar e buscar novos mercados, como o de Saúde. Recife é conhecida como segundo polo médico do País. Vamos promover isso em forma de pacotes, que incluam tratamentos, bilhetes aéreos, hospedagem e tudo do que as pessoas necessitam", diz o presidente do Recife Convention & Visitors Bureau, Simão Teixeira, revelando um dos projetos da entidade para a retomada.
De acordo com o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) da RMR, os serviços jurídicos e de tecnologias da informação e comunicação também estão entre as vocações do Recife que podem ser mais bem aproveitadas do ponto de vista do turismo de negócios.
Outra urgência, destacada reiteradas vezes pelo trade, é a de revitalização do Centro de Convenções de Pernambuco, que já vinha perdendo espaço para equipamentos modernos de cidades vizinhas do Nordeste mesmo antes do coronavírus. Com 41 anos de construído, o espaço aguarda a conclusão de um estudo de viabilidade técnica para concessão à iniciativa privada.
"Os empresários precisam pensar em como tornar a cidade a maior estrutura para feiras e convenções. Com a localização estratégica, Recife não pode se dar ao luxo de não ser referência no segmento", sentencia Marcelo Bento, acreditando que os grandes eventos serão retomados, tão logo a pandemia esteja controlada.
PLANEJAR É PRECISO
O planejamento conjunto para a reestruturação do setor foi iniciado em outubro, com a realização de um evento inédito que reuniu empresários e gestores públicos.
Do encontro, saíram diretrizes que vão subsidiar políticas públicas e ações de governança privada para estruturar e promover a atividade turística nos próximos dois anos. O relatório final deve ser publicado ainda este mês.
Entre as prioridades, a diversificação de atrativos é ponto pacífico, assim como a necessidade de fazer um inventário dos empreendimentos turísticos âncoras do Estado. Investimento em marketing digital, B2B e aproximação com operadores de luxo também estão na lista, além de estímulo à captação de eventos e apoio à divulgação.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis em Pernambuco (ABIH-PE), Eduardo Cavalcanti, defende, ainda, a integração com outras capitais do Nordeste, em um grande roteiro intrarregional.
As necessidades do turismo também foram sintetizadas em um documento entregue por representantes das principais entidades do setor a cada candidato à Prefeitura do Recife e outras cidades da RMR. "Não podemos mais trabalhar isoladamente. Se teve algo de bom na pandemia para o turismo local, foi essa união", diz o vice-presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav), Marcos Teixeira. Os destaques entre as reivindicações incluem a reformulação do Conselho de Turismo, de forma a se tornar consultivo e deliberativo na tomada de decisões sobre investimentos públicos na área, e a criação de um Fundo de Promoção Turística.
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