O papel do Partido dos Trabalhadores (PT) diante da crise política enfrentada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e com a iminência de uma possível abertura do processo de impeachment contra o chefe do Executivo, será o ponto central da reunião do Diretório Nacional, realizada nesta quarta-feira (29). Ao contrário do que se esperava, a legenda petista tem optado por adotar uma postura mais cautelosa, a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao defender a saída de Bolsonaro do Poder.
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Na Câmara dos Deputados, há cerca de 30 pedidos de impeachment - três deles foram apresentados após as declarações do ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, envolvendo crimes de responsabilidade fiscal. Entre os autores destes pedidos estão o PSB, Rede, PSOL, PDT. "O PT já está fazendo claramente uma denúncia de que com Bolsonaro não dá mais, nós já assumimos a palavra de ordem do 'fora Bolsonaro'. Agora, o impeachment é algo que se vier a acontecer depende de uma série de fatores, inclusive de mobilização social, de uma perda maior de sustentação do próprio Bolsonaro", explica o senador Humberto Costa.
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Apesar de não encabeçar diretamente os pedidos de impeachment do presidente da República, o PT tem centrado forças no Congresso Nacional para que sejam debatidas as propostas de emenda constitucional que determinem a realização de eleições diretas. Existem três PECs - apresentadas pelos parlamentares Henrique Fontana (PT-RS), Paulo Teixeira (PT-SP) e Miro Teixeira, ex-deputado pela Rede (RJ) -, que caminham neste sentido e propõem eleições diretas em 90 dias em caso de afastamento definitivo tanto de Bolsonaro, como de governadores e prefeitos.
"A crise é grande demais para que uma solução para o caos institucional em que vivemos seja resolvida longe do povo e sem a participação democrática", defende a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR).
A deputada federal Marília Arraes, que participou na semana passada de uma reunião de bancada com o ex-presidente Lula, endossa que é preciso ter embasamento ao pedir a saída do presidente da República e descarta qualquer tipo de revanchismo pelo episódio que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016. "Nós precisamos defender a saída de Bolsonaro com um embasamento preciso, esclarecendo o porquê que estamos pedindo isso, até porque tem subsídios mais do que suficientes para a saída de Bolsonaro", explica.
Marília afirma que essa questão se torna mais complexa por causa das mudanças na realização das sessões do Congresso Nacional. Com a pandemia do novo coronavírus, o Poder Legislativo tem funcionado através de sessões remotas. "É muito difícil articular um processo de impeachment remotamente, acredito que recebendo esse processo o Congresso teria que voltar aos trabalhos. Mesmo com as medidas sanitárias necessárias, ele teria que voltar ao trabalho presencial", diz a deputada federal.
Sobre as expectativas de uma postura mais aguerrida, até mesmo nas redes sociais, por líderes e parlamentares do PT, Marília Arraes explica que neste momento, "o partido está certo em não tomar atitudes mais açodadas, mas de firmar posição de que Bolsonaro não tem condições de continuar presidindo o País, principalmente sobre a saída do ex-ministro Sergio Moro, que foi cheia de confissões e de denúncias contra ele próprio, quando pede pensão vitalícia para família dele para deixar o cargo de juiz"."Então, é coerente pedirmos a saída do presidente, mas também é prudente manter a cautela de como se daria essa saída”, ressalta a parlamentar.
Estratégia política
Na visão dos especialistas ouvidos pelo JC, nesta terça-feira (28), a ausência de um movimento mais enérgico sobre o impeachment de Bolsonaro por parte do PT - o que seria natural dado ao espaço de oposição que os petistas possuem no Congresso NacionaL -, pode ser encarado com uma estratégia a longo prazo.
De acordo com o cientista político Vanuccio Pimentel os desdobramentos da crise entre o presidente da República e o ex-ministro e ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro, podem ser muito mais interessante para o PT, do que encarar de frente a proposta de impeachment neste momento.
Não pode haver inversão da história. O Bolsonaro é filho do Moro, e não o Moro cria do Bolsonaro. Nessa disputa toda, os dois são bandidos, mas é o Bolsonaro que é a cria e não o contrário. E os dois são filhos das mentiras inventadas pela Globo.
— Lula (@LulaOficial) April 25, 2020
"Essa crise é fundamental para o partido que entende Moro como inimigo a longo prazo. O PT deveria liderar no plano legislativo, como principal força interna, por possuir a maior bancada de oposição individual de partido, e também porque o PT foi para o segundo turno com o Bolsonaro. Mas ele se vê na possibilidade de também ajudar a atacar Sergio Moro”, afirma Pimentel.
Moro sai ainda menor do que entrou. O falso herói contra a corrupção protegeu os corruptos da família Bolsonaro e jamais defendeu democracia ameaçada pelo chefe. Sai humilhado depois de fazer o serviço sujo. Uma pergunta o perseguirá: Cadê o Queiroz, Sergio Moro?
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) April 24, 2020
Para a cientista política e professora da Facho, Priscila Lapa, esse lado "moderado" dos petistas é uma estratégia de não invalidar o argumento utilizado durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. "O partido colocou que o impeachment só é cabível quando houver motivos juridicamente claros, e que qualquer movimento sem essa base se colocaria como golpe", relembra a especialista. A cautela, neste momento, seria para preservar esse argumento e utilizar esse instrumento político no momento certo.
Ainda segundo Priscila, a abertura de um impeachment também depende da força congressual e do apoio de lideranças políticas que sejam capazes de mobilizar a opinião pública. "Esses elementos estão presentes de forma preliminar, não existe consistência", pontua.
O cientista político Ernani Carvalho explica que neste momento é mais fácil enxergar que as forças de ataque do PT estão mais voltadas para o ex-juiz da Lava Jato. "A motivação por trás disso é uma leitura de que Sergio Moro seria um potencial candidato a presidente em 2022, muito mais forte do que o presidente Jair Bolsonaro. O que pode ser tratado por alguns como vingança política”, declara Carvalho.
“Fora, Bolsonaro”
A adesão do PT ao "fora, Bolsonaro" foi oficializada no dia 22 de abril pelo Diretório Nacional do partido. Em nota, os dirigentes afirmaram que, "o Brasil e as instituições estão diante de uma escolha entre Bolsonaro ou a democracia. Entre Bolsonaro ou a retomada do crescimento econômico e da inclusão social. Entre Bolsonaro ou a defesa da vida."
Em entrevista à Rádio Povo do Ceará, o ex-presidente Lula afirmou que era preciso começar o "fora, Bolsonaro”, por não ser mais possível permitir que o presidente "destrua a democracia". "As instituições já deveriam ter reagido. A única coisa que o Bolsonaro não faz é dizer onde está o Queiroz e quem mandou matar a Marielle. Ele não responde", criticou o líder petista.
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