O número de candidaturas de pessoas negras aumentou nas eleições 2020 em relação ao último pleito municipal, em 2016, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ainda assim, de 21.009 postulantes registrados em Pernambuco, apenas 2.244 (10,68%) se declaram pretos. No último pleito foram 1.631.
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A maioria dos postulantes no Estado em 2020 segue sendo a que se declara parda. Esses candidatos somam 52,18% do total, com 10.967 postulantes. Já os candidatos declarados brancos representam 35,63% com 7.487 registros. Segundo especialistas ouvidos pelo JC, por mais que haja certo crescimento no número de candidaturas, ainda faltam condições para que esses postulantes consigam chegar ao poder e representar a luta política de toda uma população.
"Na eleição municipal são muitos candidatos a vereador e pessoas negras, principalmente, de comunidades não têm a mesma visibilidade de pessoas brancas, que, historicamente estão concorrendo, pai concorreu, mãe concorreu, avô concorreu, fazem da política alicerce da família. Assim, essas pessoas possuem estrutura financeira para ir à rua, estar nas bandeiras, nos adesivos, o grupo negro que se candidata em seu bairro não tem essa visibilidade, é um trabalho de formiguinha, então é difícil competir com a estrutura", explicou a socióloga e mestra em Educação, Culturas e Identidades, Waneska Viana.
Mesmo em número menor que as de pardos em 2016, as candidaturas de pessoas brancas foram as que conseguiram ocupar mais espaços na Câmara de Vereadores do Recife. De 39 vereadores eleitos naquele ano, 25 se declararam brancos, 10 como pardos, 2 como amarelos e 2 como pretos.
Já na eleição majoritária, em 2016 foram 8 candidatos a prefeito do Recife, sendo 6 brancos e dois declarados como pretos, Edilson Silva e João Paulo. Agora, em 2020, mesmo com o aumento no número de candidaturas para 11, a capital tem apenas um candidato declarado como preto disputando o pleito, Thiago Nunes (UP), um pardo, Mendonça Filho (DEM), e outros nove declarados como brancos.
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"As pessoas precisam se afirmar enquanto pauta política, não é só se declarar, é preciso dialogar com as políticas públicas que, se não tem, deveriam ter recorte racial. O que o candidato está fazendo pela pauta? Qual seu envolvimento? É preciso candidatos que assumam a pauta e coloquem no espaço de fala e de reivindicação. Existem problemas que afetam primeiro a população pobre e negra e isso precisa estar na fala política dos candidatos", afirmou Waneska.
Na defesa da representatividade negra na política local, o candidato Thiago Santos (UP) lembra que o Estatuto da Igualdade Racial, que completou 10 anos neste ano, define a população negra por pessoas que se autodeclaram pretas e pardas e, com isso, o índice acaba se tornando mais expressivo. "Somos uma população muito grande, mas o nosso sistema de democracia não expressa a mesma representatividade nos órgãos de decisão política. No legislativo, o maior número de candidaturas pode ajudar que essa população se reconheça no poder e aumenta o grau de representatividade no espaço político”, afirmou.
Para o candidato, a desigualdade étnico-racial política é resposta de um modelo econômico "baseado na exploração" e precisa ser corrigido. "Essa injustiça evidente não vai se resolver só com eleição. Não temos essa ilusão. Só chegamos a esse ponto porque temos um modelo econômico da escravização, da mão de obra de pessoas negras. Esses reflexos da política também são produtos de uma sociedade desigual, que se baseia na economia, que concentra a representatividade nas pessoas com maior poder econômico, e pessoas pretas estão na favela, são maiores vítimas de covid-19, a maior população carcerária", ele explica.
Dentro desse processo de autodeclaração racial, não são apenas os indicativos crescente entre um pleito e outro que podem ser validados nesta discussão. Vale destacar que há dificuldades de identificar, fenotipicamente, se aquelas pessoas autodeclaradas negras realmente são consideradas negras. “A gente acompanha e isso é um dado histórico, desde a implementação das políticas de cotas, a desonestidade quanto a essa autodeclaração em relação a sua raça”, pontua Alyne Nunes, doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
“Muitas pessoas oportunizam-se desse momento, dessa visibilidade, dessa pauta, dessa luta para se auto declarar e ocupar postos que, de fato, não lhes cabe. A gente vê um avanço nesse número quantitativo de representatividade, mas em relação a qualidade do material, do produto, das pautas, das agendas que defendem, ela foge completamente desses critérios raciais, porque não basta apenas ser negra ou negro, temos que estar aliados a luta antirracista”, declara Alyne.
A ampliação nos espaços de poder parte de uma discussão pertinente junto a sociedade civil e aos partidos políticos. E quando o recorte trata de gênero, é ainda mais desigual o tratamento dado a mulheres negras. Em Pernambuco, apenas três mulheres que declararam ser negras estão candidatas a prefeita - Judite Botafogo em Lagoa do Carro, Kátia Cunha em Goiana, Professora Joseane, em Itaquitinga.
“A gente precisa que os próprios partidos se comprometam com a candidatura, até mesmo as brancas, de homem, que tenham compromisso com a luta feminista e antirracista. Infelizmente, o alcance da voz da postura desse tipo de padrão privilegiado, porque é o padrão do opressor, ele acaba tendo muito mais eco na sociedade até quando nós falamos para as minorias políticas. As candidaturas consideradas privilegiadas tem que se comprometer com as pautas antirracistas, feministas, para conseguir equilibrar até mesmo o discurso”, avalia a doutora em Sociologia.
De acordo com o historiador e cientista político Alex Ribeiro, o estímulo a favor da representatividade negra nas eleições, tem que vir dos partidos e de instituições como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Duas questões podem ser levadas em conta nesse caso: a arrecadação de candidatos negros para investimentos em campanha é considerada baixa em relação a postulantes brancos; Não existe um política de equidade social nas eleições do país”, afirma. o docente.
“É preciso usar estratégias de divulgação mostrando a quantidade de pessoas consideradas negras no país e o número de representantes na arena política não só no quadro atual, como também em toda a história democrática do país. A reflexão do eleitorado deve ocorrer diante da disparidade de pessoas brancas que ocupam esses espaços em detrimento aos negros”, completa Ribeiro.
Enegrecer a política
A ausência de representatividade é algo que contrasta com a realidade da população, e isso em termos de números. A população negra residente no Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que corresponde a 50,7¨% da população total. Dentro desse número, 53% são composto por mulheres negras.
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“Por outro lado, os dados dialogam com a realidade brasileira: no trabalho, negros são maioria da mão-de-obra, mas só ocupam 10% dos cargos de chefia; e pessoas negras recebem até 31% menos que pessoas brancas; no desemprego, a taxa é de 5,5% para brancos, mas sobe a 7,1% entre pessoas negras; todos dados do IBGE”, apresenta o dossiê Enegrecer a Política, que fez um compilado dados referente às eleições de 2016 e tem como objetivo discutir a baixa representatividade negra nas esferas políticas do país.
“Esses movimentos que surgiram como o Vote em negra, Vote em negro, são práticas e articulações extremamente importantes porque já trazem uma atenção às demandas que a gente precisa estar atento. A gente precisa levar esse movimento a nível de internet, das redes sociais, para a legislação. A gente só consegue alterar o nosso quadro político a partir das instituições, e faltam as políticas de incentivo a essas candidaturas negras e sem esse incentivo institucional a gente não pode avançar”, ressalta a doutora em Sociologia, Alyne Nunes.
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