ELEIÇÕES

O que explica o presidente Jair Bolsonaro estar há um ano e meio sem partido?

Bolsonaro tem sido rejeitado até pelo nanico PRTB em busca de uma legenda para 2022

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Paulo Veras

Publicado em 23/05/2021 às 8:17
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O PRTB é um partido pequeno que, em 2018, não elegeu nenhum deputado federal ou senador. Do dia para a noite, a sigla poderia ter adentrado no principal gabinete do Palácio do Planalto, mas se recusou a receber o presidente Jair Bolsonaro. Desde que se desfiliou do PSL, há um ano e meio atrás, Bolsonaro busca um partido pelo qual possa concorrer a reeleição. A medida que o pleito de 2022 se aproxima e oposicionistas, como o ex-presidente Lula (PT), colocam o bloco na rua, os bolsonaristas passaram a correr contra o tempo para tentar encontrar uma legenda.

Não tem sido uma tarefa fácil. Inicialmente, o plano do presidente era criar sua própria legenda, o Aliança Pelo Brasil. A Justiça Eleitoral, porém, exige meio milhão de assinaturas para que se dê entrada no pedido de registro. O time de Bolsonaro se mobilizou em diversos Estados mas, após mais de um ano, conseguiu apenas 192 mil fichas assinadas; menos de 40% do número necessário para dar início ao processo de registro.

Desde o início do ano, portanto, o plano passou a ser ingressar em uma legenda já existente, como ocorreu em 2018 com o PSL. Nos últimos meses, Bolsonaro já tentou retornar ao PSL, flertou com o PTB e, dias depois de levar um fora do PRTB, passou a fazer acenos para o PP, sigla do Centrão.

"Um partido é como uma empresa que gera muitos recursos. E é dinheiro público. Quando a legislação acabou com o financiamento privado de campanha, o fundo partidário se tornou a principal fonte de receita dos partidos. (Como o fundo partidário é definido pelas bancadas na Câmara Federal), eles não estão preocupados em fazer governador, senador, nada. O que os partidos querem é fazer deputado federal. Porque dá tempo de TV e o dinheiro do fundo partidário", explica o coronel Luiz Meira, presidente do PTB em Pernambuco, que tem participado das conversas nacionais sobre o futuro partidário de Bolsonaro.

A princípio, receber Bolsonaro parece um grande negócio. O PSL elegeu apenas um congressista em 2014. Com a "onda" bolsonarista de 2018, saltou para 52 deputados ferais eleitos, se tornando a segunda maior bancada do Congresso. Como o número de parlamentares determina a cota do fundo partidário, o PSL "enriqueceu". Em 2017, antes da filiação de Bolsonaro, a sigla recebeu R$ 6,1 milhões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em 2019, um ano depois a vitória nas urnas, o montante aumentou para R$ 98,3 milhões.

THIAGO LUCAS/ ARTES JC
Pré- requisitos Bolsonaro - THIAGO LUCAS/ ARTES JC

As dificuldades

Por que, então, é tão difícil para o presidente encontrar uma legenda para se filiar?

"Claro que, em princípio, seria vantagem para um partido minúsculo abrigar o presidente. Por outro lado, teria que abrir mão do seu modus operandi atual para abrir o espaço necessário em que caiba o presidente. Assim, não é uma conta que fecha fácil", afirma a cientista política Priscila Lapa, professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho).

"Extremamente personalista, Bolsonaro acredita que, por ser ocupar o maior cargo do país, o partido deve servir-lhe integralmente. Imagino que a dificuldade que ele tem para se abrigar em um partido passa pela lista de requisitos exigidos. E certamente os partidos levam em conta a eleição proporcional, não apenas ter o presidente como cabo eleitoral", projeta Lapa.

O que Bolsonaro exige nas negociações?

Bolsonaro, de fato, tem feito uma série de exigências às siglas com as quais tem conversado. Segundo Meira, a primeira delas é que a agremiação mude de nome para Aliança Pelo Brasil, partido que o presidente prometeu criar. "Essa é a principal cláusula da negociação. Foi uma das que o PRTB não quis aceitar porque o nome atual foi escolhido por (Levy) Fidelix", explica Meira. Fundador do PRTB, pelo qual concorreu duas vezes à Presidência, em 2010 e 2014, Fidelix morreu em abril, em decorrência da covid-19.

Outras exigências feitas por Bolsonaro incluem um comando colegiado da área financeira da sigla, com dois tesoureiros, um indicado pelo grupo do presidente e outro pela atual direção do partido. A legenda também precisaria aprovar regras de compliance. A ideia é evitar que, depois da eleição, o Planalto seja atingido por denúncias de mal uso de dinheiro partidário, como o caso das candidaturas "laranjas" do PSL em 2018.

O presidente também quer controlar 51% da direção nacional da legenda, o que lhe permitiria dar as cartas no partido. E ter o comando dos diretórios do Rio de Janeiro e de São Paulo; Estados nos quais os seus filhos disputam eleições proporcionais.

Brigas com o PSL não ajudam

Para o cientista político Adriano Oliveira, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), é legítimo que Bolsonaro tente obter o controle do partido para o qual deseja ir. Ele lembra, contudo, que entre os políticos o presidente não é visto como uma figura confiável. O chefe do Executivo saiu brigado do PSL e, ao longo do mandato, rompeu com uma série de aliados, inclusive nomes de primeira hora, como o ex-ministro Gustavo Bebianno, que ele indicou para presidir o PSL em 2018.

Além disso, Adriano lembra que a busca por uma nova legenda coincidiu com o período em que diversas pesquisas de opinião mostraram uma queda na popularidade de Bolsonaro, o que atrapalha o processo. "Se o presidente estivesse muito forte, o que ele não está, ele poderia dizer: eu vou nas minhas condições. Mas isso não ocorre. Portanto, com o passar do tempo, se essa impopularidade aumentar, as exigências dos partidos para com ele vão aumentar ainda mais. Ele terá dificuldade não só de encontrar um partido, mas também de ter o controle completo desse partido", alerta.

Um trunfo, segundo Meira, é que Bolsonaro teria condições de levar com ele 17 deputados federais do seu núcleo mais próximo para a nova legenda. Há diálogo também com outros aliados que poderiam elevar esse número para até 60 deputados. Mas a nova sigla só receberia o fundo partidário por esses nomes após a eleição, caso eles sejam reeleitos. O que pode ser um entrave até para os parlamentares, que precisarão de recursos para tocar suas campanhas.

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